37. Um convite inesperado

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Eu precisava admitir que era estranho não ter Sulpicia em casa. Apesar de estar na faculdade a maior parte do tempo, eu me acostumara a, sempre que possível, perguntar a meus pais ou a Tanya como estavam as coisa por lá. Já faziam alguns meses desde que ela retornara para a Itália e eu não era a única a esquecer-se deste fato vez ou outra.
Estava assistindo a uma aula particularmente chata de bioquímica naquela manhã. Já havia mandado mensagem para Seth, mas meu namorado estava no laboratório de engenharia, então não poderíamos conversar. Uma vez ali dentro, Seth esquecia que o mundo existia. Quanto a Megan, ela estava com uma intoxicação alimentar brava e não fora às aulas nos últimos três dias. Neste momento, eu aguardava a resposta dela. Meu celular vibrou:

"Tô bem, criatura! / Não vomitei mais desde que acordei. / Qualquer mudança, eu te falo"
"Que bom!" – respondi aliviada – "Deixei uma água de côco pra você encima da mesa"
"Já acabei com ela! / Obrigada!"
"De nada!" – digitei – "Daqui a pouco chego com seu almoço"
"Pelo amor de Deus, eu não aguento mais tomar sopa" – precisei segurar o riso, pois conseguia ver a expressão de desespero no rosto de Megan– "Já emagreci 5 kg. / Se continuar assim, vou sair voando com o primeiro ventinho que soprar"
"Eu vou levar espaguete"
"É por isso que eu te amo"
"Kkkkkkkkkkk / Eu sei. / Agora vai descansar"
"Fui!"

– ... Renesmee? – me encolhi ao ouvir a voz de meu professor
– Desculpe, – falei envergonhada – como?
– Se estivesse prestando atenção, – alfinetou – saberia qual é o exame capaz de atestar se uma pessoa está com litíase renal
– O teste para detectar litíase renal é o sinal de Giordano, professor. – respondi. Bem, se ele queria que eu passasse vergonha perante minha turma, deveria ter escolhido uma pergunta mais difícil – Basta dar um soco abaixo do rebordo costal posterior, à direita e à esquerda, do paciente. Caso ele tenha litíase, além de se encolher e gritar de dor, ele também não irá permitir que o segundo soco seja dado
– E qual é o procedimento a ser feito por um paramédico que encontrar uma vítima de overdose não responsiva! – fiquei tentada a fingir que pensava na resposta, mas a expressão de prepotência no rosto de meu professor atiçou meu mau gênio. Ele, propositalmente, perguntou uma questão que vimos no pré curso, pois queria que eu errasse. Principalmente, porque se tratava de uma questão que não era pertinente à área da enfermagem, ainda que deveríamos ter ciência do fato
– 4 mg de naloxone via nasal e, caso não resolva, mais 2 mg intravenosos. Depois, se o paciente tiver despertado, encaminha-lo diretamente ao hospital mais próximo. – admito que precisei conter a expressão de vitória – Caso não desperte, é necessário iniciar, imediatamente, uma massagem cardíaca e preparar o desfibrilador
– Está correta. – falou contrariado – Creio que não estava não alheia à aula quando achei
– Não estava, professor. – respondi – Mas peço desculpas por ter olhado para o celular, minha amiga está passando mal e estava checando como ela estava

    Ele não respondeu, apenas virou-se contrariado para o quadro. Percebi vários de meus colegas de sala segurando o sorriso. O senhor Edelweis era conhecido por gostar de fazer os alunos passarem-se por idiotas quando detectava que um deles não estava prestando atenção em sua aula. Acho que fui a primeira a não ser sua vítima. Uma onda enorme de satisfação me inundou diante desta constatação.
     Ao final da aula, por ser o horário do almoço, fui para o refeitório da faculdade. O local estava se enchendo e a mesa que eu e meus amigos tomamos como nossa, localizada perto da janela com vista para o campo de futebol americano, já tinha três ocupantes: Megan, Blair e Kyle. Percebi a presença de Seth assim que ele entrou e reduzi o passo para que ele me alcançasse, o que aconteceu com poucas passadas de suas pernas compridas.

– Oi! – ele abraçou minha cintura e me deu um beijo na têmpora
– Olá! – acariciei-lhe o braço, fiquei na ponta dos pés e beijei-lhe a bochecha – Oi, todo mundo
– Oi! – disseram os demais
– Então resolveu vir comer seu espaguete com todos nós?! – provoquei Megan
– Estava me sentindo muito melhor. – respondeu animada – Além disso, não aguentava mais ficar no quarto e senti falta da cara feia de todos vocês
– Engraçadinha. – enruguei o nariz para ela – Mas fico muito feliz que esteja bem o bastante para sair do quarto
– Somos duas – ela riu
– Eu estou faminta! – disse Liv sentando-se ao lado de Megan
– Acho que meu estômago foi parar nas minhas costas, só pode. – resmungou Pete e, como se para confirmar o que fora dito por ele, seu estômago roncou alto
– Comeu um cachorro e não falou para nós? – provocou Kyle
– Credo, garoto, – riu Blair – vai almoçar
– Era o que estava pretendendo. – ele olhou para a fila que começava a se formar – Fui
– Acho melhor irmos todos. – sugeri – A comida está quente
– E ninguém remexeu – completou Megan. O brilho em seus olhos para o almoço do dia disse o suficiente sobre o quanto ela realmente não aguentava mais tomar sopa

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