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— Por favor.. — Alisson grunhiu e fez aquela coisa com os olhos que ela sabia que funcionava com o pai toda vez. — Diz que sim.

— Querida, — começou ele limpando as mãos sujas de gracha na calça, o pai era mecânico desde sempre e amava aquela profissão, — Aqui é um problema de junta, — Alisson franziu a testa, o pai sorriu antes de prosseguir, — Junta tudo e joga fora.

Ele bateu no capô do velho fusca branco que ela usava desde aos dezessete anos, ou seja, a dez anos.

— Pai!!— protestou ela fechando a cara imediatamente. Ela o usava não apenas porque era econômico, mas havia um valor emocional.

— Devia pensar em trocar de carro, minha bela jovem. — Ele falou, mas mesmo assim abriu o capô, — Meu Deus, — Grunhiu ele, — Bem pior do que eu pensava.

— Diga que pode salvá-lo.

— Aqui é uma questão de milagre, —Ele falou ainda inspecionando o motor, — E bom, eu não faço milagres.

— Mas chega perto disso, então.. faz por favor, faz isso.. salva ele.

— Vou fazer meu melhor, mas.. — Disse ele levantando os olhos pra filha, — Não prometo nada.

— Amo você. — Ela deu pequenos pulinhos enquanto comemorava, feliz da vida. — Você é o melhor pai do mundo. Obrigada, obrigada, obrigada...

— Me agradeça depois... — Ele disse se voltando pro carro, — Pode fazer uma daquelas lasanhas que eu gosto como forma de agradecimento.

— Pode deixar.

🏒⛸🍰☕

Robert Evans era o melhor. Alisson não cansava de pensar nisso.

 Depois de algum tempo, ele finalmente conseguiu concertar o fusca dela, e ela não podia estar mais feliz.

Depois de mais um dia de trabalho no seu pequeno café e livraria, ela dirigiu até sua casa e fez o que o pai pediu. Uma bela lasanha.

— O cheiro tá incrível.. — Kai, seu irmão falou ao entrar na cozinha, beijou o rosto dela e sorriu indo em direção a geladeira e pegando uma garrafa de água, — Como foi hoje no café?

— Bem.. — desse ela pegando a travessa e colocando no balcão. — Os negócios estão indo bem? — Depois te tentar tanto, finalmente as coisas estavam indo bem. Ela sempre sonhou em ter seu próprio café, e decidiu que seria legal ter uma livraria junto, afinal o que poderia ser melhor do que tomar um delicioso café acompanhado de um bom livros? Depois de tantos anos, ela conseguiu. Se sentia feliz.

— Que bom.. — Kai tomou um gole de água e seu sorriso era enorme, — Não sabe o quanto isso me deixa feliz, irmã..

— Obrigada...

— É como se esse seu sonho também fosse meu e finalmente a gente conseguiu... — Ele disse com os olhos um pouco lacrimejados. Era realmente assim que ele se sentia, ela sabia disso. Os dois lutavam com unhas e dentes um pelo outro. Sempre fora assim.

— Amo você. — Alisson falou indo em direção ao irmão e jogando os braços em seu pescoço, — Amo muito você.

— Eu amo mais. — Ele disse.

— Se você diz.. — Alisson falou após os dois se soltarem.

— Oi, — Angel, esposa de Kai e melhor amiga de Alisson, meteu a cabeça na porta, e sorriu, — A grávida aqui está com fome, sabe??

— Opa.. — Kai falou abrindo um enorme sorriso pra esposa, — Não vamos deixar nosso pequeno menino com fome, certo Alisson?

— Certíssimo.

— Obrigado pela consideração.. — Ela falou olhando de um pro outro, — venham logo, estou a alguns minutos de dar a luz.

Os três riram e ela saiu, Angel estava grávida de quase nove meses, os dois já tinham uma filha, Isabelle, que chamavam carinhosamente de Bel, de quase cinco anos, e agora esperavam mais um pra deixar a família ainda mais feliz.

A casa dos pais era enorme, e por mais que muitas pessoas morram de vontade de sair de casa quando ficam maior de idade, Alisson não era uma dessas, ela amava a companhia da família. Kai e sua família também moravam ali, era uma verdadeira bagunça as vezes, não daquelas ruins, e ela amava isso.

— Prontinho.. — Disse Kai entregando um prato pra esposa, ela sorriu ao receber e jogou um beijinho no ar pro marido, ele ficou todo bobo, como sempre.

— Vou ficar com diabetes. — Alisson brincou enquanto servia o prato do pai, lhe entregou logo em seguida e ele sorriu, os olhos brilhando.

— Obrigado, querida. — Agradeceu ele.

— É o mínimo que posso fazer depois de ter salvado o fusca..

— Ai meu Deus, — Eleanor, sua mãe, falou, — Já está na hora de trocar de carro, querida... aquele ali não vale mais a pena.

— Mamãe.. — Kai falou lhe olhando torto, — Deixa a Alisson com o carro dela.

— Querido, não é bem um carro.. — A mãe falou enquanto cortou um pedaço da lasanha, — Tá mais pra uma sombra de carro.

— Ele é econômico.. — Disse Alisson enquanto metia uma garfada na boca, ela não gostava que falassem mal de seu carro, não mesmo. — E enquanto ele conseguir me levar, vou continuar com ele.

— Claro. — Disse a mãe.

— Está uma delícia,— Disse o pai tentando mudar de assunto, Alisson amava morar ali, amava de verdade, menos naqueles momentos em que a mãe implicava com suas coisas.

— Sim, verdade. — Disse Angel colocando uma garfada na boca da pequena Bel, talvez não fosse uma alimentação tão saudável naquele momento, mas ela abrira uma exceção. A menina balançou as pequenas pernas na cadeira e mastigou tranquilamente, totalmente alheia ao clima tenso que se instalou ali por conta do comentário da avó.

Eleanor Evans era uma boa mulher, uma boa mãe e uma boa esposa. Alisson sabia daquilo, ela amava a mãe mais que tudo, principalmente depois de quase perdê-la pro câncer a alguns anos atrás, mas a mãe sabia aperta-la exatamente nos locais em que ela não deveria,em lugares que ainda sangravam. Em lugares muito dolorosos.

— Pode ler pra mim, titia? — Perguntou Bel um momento depois, Alisson sorriu antes de responder que sim, a menina agitou as pequenas mãozinhas e abriu a boca pra comer mais um pouco, mastigando devagar. Angel sibilou um obrigado silencioso.

— Como está indo no café? — Perguntou Robert, — Vi alguns comentários na oficina, bons comentários.

— Está indo tudo bem.. — Alisson sorriu lembrando de como amava aquele lugar, ainda era pequeno, mas sentia seu coração esquentar quando pensava nas pessoas lendo enquanto tomavam seus cafés, o local era preenchido pelo pequeno barulho de páginas de livros sendo viradas. — As pessoas estão descobrindo o amor por livros, muitas têm vindo.

— Ficamos muito felizes, meu amor. — Disse a mãe, a feição mais calma, serena. Alisson sorriu, o climão se dissipando. — Você e seu irmão são o motivo das nossas maiores alegrias e são o nosso maior orgulho.

— E eu? — Bel perguntou com o cenho franzido.

— Você também, minha princesa. — Disse a avó, — Você é o nosso presente mais querido, — Mudou o olhar pra Angel, ela acariciava a barriga enorme, — Você, sua mãe e esse lindo menino que virá em poucos dias.

— Oba!!— Disse Bel com um sorriso tão lindo, tão inocente que fez o coração de Alisson derreter feito uma manteiga, ela sorriu ainda mais, — Gosto de ser um presente.

Houve um tempo em que Alisson podia jurar que em dez anos ela também estaria ali com o amor da sua vida, talvez filhos, ela achara que seria feliz,mas isso já fazia muitos anos. Hoje ela só queria saber de seu negócio e de sua família que estava ali, ela não precisava de mais ninguém na sua vida. Sua primeira experiência com o amor não fora boa, pelo contrário, lhe quebrou o coração em pedaços tão pequenos, que ela sabia ser praticamente impossível colar novamente. E bom, ela não precisava de que ninguém a colasse, ela poderia viver sua vida lendo e vivendo vários romances literários. Ela podia ser feliz assim.

Lar, doce lar.Onde histórias criam vida. Descubra agora