3. FALAR DELE

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Chegou o dia da segunda sessão e eu fui literalmente arrastada pelos meus pais para dentro do consultório. Não queria ir. Não podia ir. Eu sabia que ela me ia obrigar a falar sobre ele e eu simplesmente não estava pronta. Eu simplesmente não aguentava lembrar-me dele, daquilo que ele me fez passar. Da iludida que fui. Do seu suposto amor.
Depois de me sentar, respirei fundo e olhei para ela da forma mais suplicante que pude.
- Olá Eva.
- Olá Doutora.
- Estás pronta?
- Não.
- Mas sabes o que vai acontecer hoje, não sabes?
- Sei.
- Então, por onde queres começar? - encolhi os ombros - Talvez me possas dizer como é que ele entrou na tua vida?
- Ele entrou da mesma forma que saiu. - digo - Com um simples olhar.
- O que é que esse primeiro olhar provocou em ti?
- Esperança. - Fico surpreendida com a rapidez da minha resposta e com o facto de não estar, de todo, tão perturbada como esperava.
- Esperança em quê?
- Numa oportunidade. No amor.
- Amava-lo? - esta pergunta fez-me pensar
- Sim. Mas não da forma que ele me amava.
- Como assim?
- O nosso amor simplesmente não era compatível. A fome dele era insaciável. Ele queria tudo à bruta, tudo para ontem, tudo intenso... E eu... - estava a ficar sem ar - Eu não sabia o que era amar alguém... Eu queria ir com calma... Eu não queria tanto, não queria tão de repente... - um ardor no peito, as lágrimas que caíam ferozmente, as memórias que nunca estiveram tão vivas
- Quando é que percebeste que isso não era saudável? - olhei para ela nos olhos, durante uns momentos, antes de responder
- Quando me esqueci de mim.
- Mas ele fazia-te feliz?
- Fez-me feliz durante metade do tempo que estivemos juntos.
- As pessoas sabiam que vocês estava, juntos? - ela está a perguntar-me isto, mas na verdade já sabe a resposta
- Não.
- Tu querias que as pessoas soubessem?
- Queria.
- As coisas teriam sido diferentes se as pessoas soubessem desde o princípio?
- Sim. Teriam sido piores. - okay... Isto vai doer... Eu sei o que vem a seguir e é exatamente por isso que eu não queria falar sobre ELE
- Porquê? - a sua expressão sobre mim, diz-me que ela precisa de ouvir a verdade sair da minha boca, mas eu não quero dizer a verdade, por isso fecho os olhos, dobro-me sobre os joelhos e choro - Eva... sabes que tem de ser... Tens de ouvir a verdade sair da tua própria boca, não podes agir como se nada fosse. - Desculpa!!??
- AGIR COMO SE NADA FOSSE? DESCULPE!? A SENHORA ACHA QUE EU CONSIGO AGIR COMO SE NADA FOSSE DEPOIS DE SABER QUE TIVE UMA RELAÇÃO ABUSIVA COM UM RAPAZ QUE ERA O MEU PRÓPRIO IRMÃO!? - gritei, com todas as minhas forças. Ela ouviu com a atitude mais calma do mundo, como se já estivesse treinada para não reagir perante situações assim. E eu saí porta fora. Não conseguia mais estar ali.

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