11. VERÓNICA

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A minha irmã era dois anos mais velha que eu e morreu, inesperadamente, dois meses antes de a minha vida se cruzar com a vida do Miguel. A nossa relação era peculiar. Enquanto irmã mais nova eu só queria a atenção dela, só queria fazer as mesmas coisas que ela... resumindo, só queria fazer coisas típicas de irmã mais nova e ela muitas vezes não estava com disposição para me aturar. Mas eu sabia que, lá no fundo eu era a coisa mais importante da sua vida.
A minha irmã tinha o cabelo cheio de madeixas louras, cortado acima dos ombros e ondulado naturalmente. Os seus olhos eram castanhos escuros, quase pretos. Desde que me lembro que ela era completamente apaixonada por animais, mas teve azar porque os nossos pais nunca nos deixaram ter nenhum animal de estimação. De facto, também foi por causa de um animal que ela perdeu a vida tão cedo. Ambicionava ser veterinária e, embora não tivesse acabado o secundário, esforçou-se bastante para ter boas notas, para não desiludir os nossos pais, para conseguir ser melhor do que eu em tudo. Os meus pais adoravam a sua filha mais velha e eu adorava isso, adorava que eles canalizassem a sua atenção para a minha irmã e se esquecessem de exigir tanto de mim. Mas havia uma coisa que eles não aprovavam e que evitavam lembrar-se acerca da Verónica. Ela gostava, assumidamente de raparigas e eu gostava assumidamente de rapazes. Os mais pais tiveram um desgosto porque descobriram o único defeito da sua filha mais velha, mas mesmo assim nunca deixaram de a amar.
A morte da minha irmã deixou um vazio na nossa família porque a era luz, ela era a princesa, a protagonista, a engraçada. Sem ela a nossa casa e a nossa vida ficaram vazias. Eu não me importava de ser a segunda opção, eu não ficava mal quando as conquistas da minha irmã eram mais celebradas do que as minhas, porque eu sabia que eu não era esquecida. A Verónica andava na equitação, tinha uma paixão absurda por cavalos, em particular, e teve o azar de morrer durante uma prova. Foi catapultada de um cavalo em movimento, o seu cavalo favorito. Foi uma questão de segundos, de instantes. Não houve hipótese de reanimação porque ela morreu de ataque cardíaco, tal era a descarga de adrenalina. Não houve tempo para lhe dizer o quanto a amava, o quanto eu estava orgulhosa dela, o quanto ela era importante para mim... Não houve tempo para nada. Mas houve tempo e oportunidade para eu me aproximar da sua namorada, para eu me tornar amiga da minha cunhada, porque os mais pais apagaram completamente a existência da Nicole das memórias da Verónica. Acho que fui uma peça crucial que ajudou a Nicole a fazer o luto da minha irmã, ou pelo menos parte dele, porque assim que conheci o Miguel, afastei-me da Nicole e nunca mais tive oportunidade de me justificar e de lhe pedir desculpas. Espero que ainda vá a tempo.

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