CAPÍTULO 10
No qual o amor triunfa... mas não para nosso herói e nossa heroína.
Lucy seguiu Lady Bridgerton e Gregory pelo corredor, tentando conter a ansiedade que crescia
dentro dela. Sentia algo estranho no estômago e sua respiração não parecia normal.
Além disso, sua mente não clareava. Ela precisava se concentrar no assunto em questão.
Sabia que tinha de dedicar todos os esforços na busca, mas parecia que parte de seu cérebro
continuava zonza, em pânico, incapaz de evitar uma terrível sensação de mau presságio.
Que ela não entendia. Lucy não queria que Hermione se casasse com seu irmão? Não
dissera ao Sr. Bridgerton que ver os dois juntos, ainda que fosse improvável, seria maravilhoso?
Hermione seria sua irmã no papel, não apenas de coração, e Lucy não podia imaginar nada mais
perfeito. Mas ainda assim, ela se sentia... Apreensiva.
E um pouco irritada também.
Além de culpada, é claro. Afinal, que direito tinha de se sentir irritada?
– É melhor nos separarmos para procurar – instruiu o Sr. Bridgerton, após dobrarem várias
esquinas e os sons do baile de máscaras parecerem distantes.
Ele arrancou a máscara, as duas damas fizeram o mesmo e eles deixaram todas elas em uma
mesinha em um recanto do corredor.
Lady Bridgerton balançou a cabeça.
– Não podemos. Você com certeza não pode encontrá-los sozinho – disse a ele. – Não quero
nem pensar nas consequências de a Srta. Watson estar a sós com dois cavalheiros solteiros.
Sem mencionar a reação dele, pensou Lucy. O Sr. Bridgerton lhe parecia um homem calmo,
portanto ela não sabia se ele seria capaz de encontrar os dois sozinho e não se sentir na obrigação
de fazer um discurso sobre a honra e a defesa da virtude, o que sempre levava ao desastre.
Sempre. No entanto, dada a intensidade dos sentimentos dele por Hermione, sua reação poderia
ser um pouco menos honrada e virtuosa e um pouco mais furiosa e ciumenta.
Pior ainda: embora o Sr. Bridgerton não soubesse mirar direito, Lucy não tinha dúvida de
que ele seria capaz de deixar um olho roxo com velocidade letal.
– E ela não pode ficar sozinha – continuou Lady Bridgerton, apontando na direção de Lucy.
– Está escuro. E deserto. E os cavalheiros estão usando máscaras, pelo amor de Deus. Isso relaxa
a consciência.
– Eu também não saberia onde procurar – acrescentou Lucy.
Era uma casa grande. Estava ali havia cerca de uma semana, mas duvidava que tivesse visto
metade do lugar.
– Vamos permanecer juntos – disse Lady Bridgerton com firmeza.
Pareceu que Gregory queria argumentar, mas se controlou e, em vez disso, falou:
– Ótimo. Então não vamos perder tempo.
Em seguida saiu andando, as pernas compridas dando passos largos que as duas teriam que
correr para acompanhar.
Ele escancarava portas e as largava abertas, empenhado demais em chegar ao próximocômodo para deixar as coisas como encontrara. Lucy vinha atrás dele, procurando do outro lado
do corredor. Lady Bridgerton estava um pouco mais à frente, fazendo o mesmo.
– Ah! – exclamou Lucy em certo momento, dando um pulinho para trás e batendo uma
porta.
– Achou os dois? – perguntou Gregory, correndo até ela ao mesmo tempo que Kate.
– Não – respondeu Lucy, ficando ruborizada. Engoliu em seco. – Outras pessoas.
Lady Bridgerton gemeu.
– Meu Deus. Por favor, diga que não era uma dama solteira.
Lucy abriu a boca, mas vários segundos se passaram antes que dissesse:
– Não sei. Por causa das máscaras...
– Eles estavam usando máscaras? – disse Lady Bridgerton. – São casados, então. E não um
com o outro.
Lucy queria muito perguntar como ela havia chegado a essa conclusão, mas não teve
coragem, e, além disso, o Sr. Bridgerton interrompeu seus pensamentos, passando na frente dela
e abrindo a porta com força. Um grito feminino cortou o ar, seguido de uma voz masculina
irritada, proferindo palavras que Lucy não se atrevia a repetir.
– Desculpe – resmungou o Sr. Bridgerton. – Continuem. – Enquanto fechava a porta,
anunciou: – Morley e a esposa de Winstead.
– Ah – falou Lady Bridgerton, surpresa. – Eu não tinha ideia.
– Devemos fazer alguma coisa? – quis saber Lucy.
Deus do céu, havia pessoas cometendo adultério a menos de 3 metros dela.
– Isso é problema de Winstead – respondeu o Sr. Bridgerton severamente. – Temos nossos
próprios assuntos para tratar.
Os pés de Lucy continuaram grudados no lugar quando ele se afastou depressa de novo,
pisando firme pelo corredor. Lady Bridgerton olhou para a porta, parecendo querer abrir e dar
uma espiada lá dentro, mas por fim suspirou e seguiu o cunhado.
Lucy ficou parada, tentando descobrir exatamente o que perturbava sua mente. O casal em
cima da mesa – da mesa – tinha sido um choque, mas outra coisa a incomodava. Havia algo
errado com relação à cena. Alguma coisa fora do lugar. Fora de contexto.
Ou talvez algo que estivesse despertando uma lembrança.
O que era?
– A senhorita não vem? – perguntou Lady Bridgerton.
– Sim – respondeu Lucy. Então ela se aproveitou de sua inocência e juventude e
acrescentou: – Foi um choque, entende? Só preciso de um instante.
Lady Bridgerton lançou-lhe um olhar compreensivo e acenou com a cabeça, mas continuou
em frente, inspecionando os cômodos do lado esquerdo do corredor.
O que ela vira? Havia o homem e a mulher, é claro, e a já mencionada mesa. Duas cadeiras
cor-de-rosa. Um sofá listrado. Uma mesa lateral, com um vaso de flores...
Flores. Era isso.
Ela sabia onde estavam.
Se Lucy estivesse errada e todos os outros, certos, e seu irmão realmente estivesse
apaixonado por Hermione, só havia um lugar para onde ele a levaria para tentar convencê-la a
retribuir seus sentimentos.
O jardim de inverno. Ficava do outro lado da casa, longe do salão de baile. Era repleto de
laranjeiras, flores e lindas plantas tropicais que lorde Bridgerton devia ter gastado uma fortuna
para importar. Orquídeas refinadas, rosas raras e até mesmo humildes flores silvestres, levadas lápara dentro e replantadas com cuidado e devoção.
Não havia lugar mais romântico à luz do luar, e nenhum outro local em que seu irmão se
sentiria mais à vontade. Ele adorava flores. Sempre gostara, e tinha uma memória impressionante
para guardar seus nomes, tanto os científicos quanto os comuns. Estava sempre falando sobre
alguma planta, citando algum tipo de curiosidade – “Esta só se abre ao luar”, “Aquela se
assemelha a tal planta trazida da Ásia”. Lucy sempre achara isso um tanto tedioso, mas via como
podia parecer romântico quando quem falava não era seu irmão.
Ela olhou para o corredor. Os Bridgertons tinham parado para falar algo entre si e Lucy
podia ver, pela postura deles, que a conversa estava sendo bem intensa.
Não seria melhor se fosse ela, Lucy, que os encontrasse? Sem nenhum dos Bridgertons?
Se conseguisse fazer isso sozinha, poderia alertá-los e evitar o desastre. Se Hermione
quisesse se casar com seu irmão... bem, seria por escolha própria, não por obrigação, depois de
ter sido flagrada em uma situação comprometedora.
Lucy sabia o caminho do jardim de inverno. Poderia chegar lá em minutos.
Deu um passo cauteloso para trás em direção ao salão de baile. Nem Gregory nem Lady
Bridgerton pareceram notá-la.
Ela se decidiu.
Deu seis passos silenciosos, recuando até a esquina. Então, após dar uma última olhada
rápida no corredor, sumiu de vista e saiu em disparada.
Levantou as saias e correu como o vento – ou ao menos tão rápido quanto pôde, com seu
pesado vestido de baile de veludo. Não tinha ideia de quanto tempo levaria para que os
Bridgertons notassem sua ausência, e, embora eles não soubessem para onde estava indo, não
tinha dúvidas de que a achariam. Tudo o que Lucy tinha a fazer era encontrar Hermione e
Richard primeiro. Se conseguisse fazer isso, poderia empurrar Hermione para fora do jardim e
dizer que tinha encontrado Richard sozinho lá dentro.
Ela não teria muito tempo, mas tinha certeza de que daria certo.
Lucy chegou ao corredor principal, diminuindo o ritmo ao máximo que a situação permitia
ao passar por ele. Havia criados por ali, talvez alguns convidados atrasados também, e ela não
podia levantar suspeitas correndo.
Saiu depressa para o corredor oeste, derrapando em uma curva quando começou a correr
novamente. Seus pulmões começaram a arder e sua pele estava úmida de suor por baixo do
vestido, mas ela não reduziu o passo. Não faltava muito agora. Ela ia conseguir. Sabia que era
capaz.
Tinha de ser.
Então Lucy enfim estava de frente para as pesadas portas duplas do jardim de inverno.
Levou a mão decididamente a uma das maçanetas e já ia girá-la, mas, em vez disso, curvou-se,
tentando recuperar o fôlego.
Seus olhos ardiam e ela tentou se reerguer, porém foi atingida por uma imensa onda de
pânico. Era física, palpável e a dominou tão depressa que ela teve de se agarrar à parede em
busca de apoio.
Por Deus, não queria abrir aquela porta. Não queria vê-los ou saber o que tinham andado
fazendo, nem como, nem por quê. Queria que tudo voltasse ao que era apenas três dias antes.
Será que não era possível voltar no tempo? Eram apenas três dias. Três dias e Hermione
ainda estaria apaixonada pelo Sr. Edmonds, o que não chegava a ser um problema verdadeiro, já
que não daria em nada mesmo, e Lucy ainda seria...
Ainda seria ela mesma, feliz e confiante. Praticamente noiva.Por que tudo tinha de mudar? A vida de Lucy estava mais do que aceitável do jeito que era.
Todos tinham seu lugar, as coisas encontravam-se na mais perfeita ordem e ela não precisava
pensar tanto a respeito de tudo. Não se importava com o que o amor significava ou como era, seu
irmão não era secretamente apaixonado por sua melhor amiga e seu casamento era um plano
distante. Lucy era feliz.
E queria tudo de volta.
Agarrou a maçaneta com mais força e tentou girá-la, mas sua mão não se movia. O pânico
ainda estava lá, paralisando seus músculos, pressionando seu peito. Ela não conseguia se
concentrar. Não conseguia pensar.
E suas pernas começaram a tremer.
Ah, meu Deus, ela ia cair. Bem ali, a centímetros de seu objetivo, ela ia desabar no chão. E
então...
– Lucy!
Era o Sr. Bridgerton, que vinha correndo até ela, e então Lucy percebeu que falhara.
Tinha conseguido chegar à estufa a tempo, mas ficara ali parada junto à porta como uma
idiota, com os dedos na maldita maçaneta e...
– Meu Deus, Lucy, no que você estava pensando?
Ele a agarrou pelos ombros e Lucy se apoiou em sua força. Ela queria desabar em cima dele
e esquecer.
– Me desculpe – sussurrou. – Me desculpe.
Não sabia pelo que estava se desculpando, mas falou isso assim mesmo.
– Aqui não é lugar para uma mulher sozinha – disse Gregory, e sua voz soou diferente.
Rouca. – Os homens andaram bebendo, e usam as máscaras para se permitirem... – Ele se calou
por um tempo e depois completou: – As pessoas não estão em seu estado normal.
Ela assentiu e enfim ergueu os olhos do chão até o rosto dele. Então viu aqueles traços que
tinham se tornado tão familiares. As ondas suaves de seu cabelo, a pequena cicatriz perto de sua
orelha esquerda...
Lucy engoliu em seco e tentou respirar fundo. Não conseguiu fazer isso normalmente, mas
chegou perto.
– Me desculpe – repetiu, porque não sabia mais o que dizer.
– Meu Deus – disse Gregory, examinando o rosto dela com urgência –, o que aconteceu?
Você está bem? Por acaso alguém...
Ele afrouxou um pouco as mãos enquanto olhava com desespero em volta.
– Quem fez isso? – perguntou. – Quem fez você...
– Não – respondeu Lucy, balançando a cabeça. – Não foi ninguém. Fui só eu. Eu... queria
encontrá-los. Achei que se eu... Bem, não queria que vocês... E então eu... E depois cheguei aqui,
e...
Os olhos de Gregory correram rapidamente para as portas da estufa.
– Eles estão aí dentro?
– Não sei. Acho que sim. Não consegui...
O pânico enfim estava diminuindo – tinha quase sumido, na verdade – e tudo parecia tão
estúpido agora. Sentia-se tão tola. Tinha ficado ali junto à porta e não fizera nada. Nada.
– Eu não consegui abrir a porta – sussurrou ela, finalmente.
Precisava lhe dizer isso. Não sabia explicar o que tinha acontecido, mas tinha de dizer a ele.
Porque ele a encontrara. E isso fizera a diferença.
– Gregory! – Lady Bridgerton chegou de repente e quase se chocou contra eles, claramentesem fôlego por ter tentado acompanhá-lo. – Lady Lucinda! Por que a senhorita... A senhorita está
bem?
Ela parecia tão preocupada que Lucy se perguntou como devia estar. Sentia-se pálida.
Sentia-se pequena, na verdade, mas como devia estar seu rosto para fazer com que Lady
Bridgerton olhasse para ela com uma aflição tão óbvia?
– Eu estou bem – disse Lucy, aliviada por Lady Bridgerton não tê-la visto como Gregory a
encontrara. – Só um pouco agitada. Acho que corri rápido demais. Que tolice a minha. Sinto
muito.
– Quando nos viramos a senhorita havia sumido... – falou Lady Bridgerton.
Parecia tentar ser severa, mas a preocupação franzia sua testa e seus olhos brilhavam de
delicadeza.
Lucy queria chorar. Ninguém nunca tinha olhado para ela assim. Hermione a amava e Lucy
sentia-se muito reconfortada com isso, mas aquilo era diferente. Lady Bridgerton não devia ser
muito mais velha do que ela – dez, talvez quinze anos –, mas a maneira como a fitava... Era
quase maternal.
Durou apenas um instante – só alguns segundos, na verdade –, mas ela podia fingir. E talvez
desejar, só um pouco.
Lady Bridgerton se aproximou depressa e passou um braço pelos ombros de Lucy,
puxando-a para longe de Gregory, que ficou parado no mesmo lugar.
– Tem certeza de que está bem? – perguntou.
Lucy anuiu.
– Estou. Agora estou.
Lady Bridgerton olhou para Gregory. Ele assentiu. Uma vez.
Lucy não sabia o que aquilo significava.
– Achei que eles poderiam estar dentro do jardim – disse ela, sem saber direito o que ouvia
em sua voz... resignação ou arrependimento.
– Muito bem – retrucou Lady Bridgerton, aprumando os ombros quando foi até a porta. –
Não temos muitas opções, não é?
Lucy balançou a cabeça. Gregory não fez nada.
Lady Bridgerton respirou fundo e abriu a porta. Lucy e Gregory na mesma hora se
aproximaram para espiar lá dentro, mas o jardim de inverno estava escuro, e a única luz era a do
luar, que brilhava através das amplas janelas.
– Droga.
Lucy se retraiu de surpresa. Ela nunca tinha ouvido uma mulher praguejar antes.
Por um momento o trio ficou parado, e depois Lady Bridgerton adiantou-se e gritou:
– Lorde Fennsworth! Lorde Fennsworth, por favor responda. O senhor está aqui?
Lucy começou a chamar Hermione, mas Gregory tapou sua boca.
– Não – sussurrou ele em seu ouvido. – Se há mais alguém aqui, não queremos que saiba
que estamos procurando os dois.
Lucy assentiu, sentindo-se aflitivamente ingênua. Ela pensara que sabia alguma coisa sobre
o mundo, mas nos últimos dias parecia entender cada vez menos. O Sr. Bridgerton se afastou,
avançando para dentro do jardim. Parou, então, com as mãos nos quadris, a expressão bem
atenta, enquanto examinava o lugar.
– Lorde Fennsworth! – chamou Lady Bridgerton de novo.
Dessa vez, eles ouviram um farfalhar suave e lento. Como se alguém tentasse se esconder.
Lucy se virou em direção ao som, mas ninguém apareceu. Ela mordeu o lábio. Talvez fosseapenas um animal. Havia vários gatos em Aubrey Hall. Dormiam num cercadinho perto da porta
da cozinha, mas talvez um deles tivesse perdido o caminho e ficado preso no jardim.
Só podia ser um gato. Se fosse Richard, ele teria aparecido quando ouviu seu nome.
Ela olhou para Lady Bridgerton, esperando para ver o que ela faria em seguida. A
viscondessa fitava o cunhado fixamente, murmurando alguma coisa, fazendo um gesto com as
mãos e apontando na direção do barulho.
Gregory assentiu para ela, em seguida caminhou em silêncio, as pernas compridas
atravessando a sala com uma velocidade impressionante, até...
Lucy engasgou. Antes que tivesse tempo de piscar, Gregory havia disparado para a frente,
um som estranho e primitivo escapando-lhe da boca. Em seguida ele saltou no ar e aterrissou
com um baque surdo, grunhindo:
– Peguei você!
– Ah, não.
Lucy cobriu a boca com a mão. O Sr. Bridgerton tinha prendido alguém no chão e suas
mãos pareciam estar muito perto da garganta da pessoa.
Lady Bridgerton disparou em direção a eles, e Lucy, ao vê-la, finalmente se lembrou dos
próprios pés e também correu até lá. Se fosse Richard – Ah, por favor, que não seja Richard –,
precisava alcançá-lo antes que o Sr. Bridgerton o matasse.
– Me... solte!
– Richard! – gritou Lucy, com a voz estridente.
Era a voz dele. Sem dúvida alguma.
A figura no chão se contorcia e então ela pôde ver seu rosto.
– Lucy?
Ele parecia surpreso.
– Ah, Richard... – disse ela, as duas palavras carregadas de decepção.
– Cadê ela? – exigiu Gregory.
– Ela quem?
Lucy sentiu-se mal. Richard fingia não saber de quem ele falava. Ela o conhecia bem
demais. O irmão estava mentindo.
– A Srta. Watson – grunhiu Gregory.
– Eu não sei do que...
Um horrível barulho gorgolejante veio da garganta de Richard.
– Gregory! – exclamou Lady Bridgerton, agarrando o braço do cunhado. – Pare!
Ele relaxou um pouco as mãos em torno do pescoço de Richard.
– Talvez ela não esteja aqui – disse Lucy. Sabia que não era verdade, mas de alguma forma
parecia ser a melhor maneira de salvar a situação. – Richard adora flores. Sempre adorou. E ele
não gosta de festas.
– É verdade – concordou Richard, arfando.
– Gregory, você precisa deixá-lo se levantar – falou Lady Bridgerton.
Lucy virou para ela quando a ouviu, e foi nesse momento que viu. Atrás de Lady
Bridgerton.
A cor rosa. Apenas de relance. Mais como um risco, na verdade, mal visível através das
plantas.
Hermione estava usando um vestido daquele mesmo tom.
Os olhos de Lucy se arregalaram. Talvez fosse apenas uma flor. Havia montes de flores
rosa. Virou de volta para Richard. Bem rápido.Rápido demais. O Sr. Bridgerton viu quando ela virou a cabeça.
– O que você viu? – perguntou ele.
– Nada.
Mas ele não acreditou nela. Soltou Richard e começou a ir na direção em que ela estava
olhando, mas o irmão de Lucy rolou para o lado e agarrou um dos tornozelos dele. Gregory caiu
com um grito e revidou o golpe rapidamente, agarrando a camisa de Richard e puxando com
força suficiente para arrastar a cabeça dele no chão.
– Não! – gritou Lucy, correndo até eles.
Deus do céu, eles iam se matar. Primeiro o Sr. Bridgerton estava por cima, então Richard,
depois o Sr. Bridgerton, em seguida ela não sabia dizer quem estava ganhando, só tinha certeza
de que eles não paravam de se esmurrar.
Lucy queria desesperadamente separá-los, mas não via como poderia fazer isso sem o risco
de se machucar. Os dois estavam incapacitados de notar algo tão mundano quanto uma pessoa.
Talvez Lady Bridgerton pudesse detê-los. Era sua casa, e os convidados, sua
responsabilidade. Ela teria como cuidar daquela situação com mais autoridade do que Lucy podia
esperar ter.
– Lady Br... – começou a dizer ela, mas parou.
Lady Bridgerton não estava no lugar em que Lucy a vira momentos antes.
Ah, não.
Lucy procurou freneticamente.
– Lady Bridgerton? Lady Bridgerton?
De repente a viu, voltando em sua direção, passando por entre as plantas e segurando
Hermione pelo pulso. O cabelo de Hermione estava desgrenhado, seu vestido, amassado e sujo, e
ela parecia prestes a chorar.
– Hermione? – sussurrou Lucy.
O que tinha acontecido? O que Richard fizera?
Por um instante, Hermione não fez nada. Só ficou ali parada como um cãozinho culpado, o
braço estendido à frente, quase como se tivesse esquecido que Lady Bridgerton ainda a segurava.
– Hermione, o que aconteceu?
Lady Bridgerton a soltou e ela correu até a amiga.
– Ah, Lucy – disse, com a voz trêmula. – Eu sinto muito.
Lucy ficou em estado de choque, abraçando-a, sem jeito. Hermione a agarrava como uma
criança, mas Lucy não sabia como agir. Seus braços pareciam estranhos, não propriamente
ligados ao corpo. Ela olhou para além do ombro de Hermione, para o chão. Os homens enfim
haviam parado de lutar, mas ela não tinha certeza se isso importava.
– Hermione? – Lucy deu um passo para trás, afastando-se o suficiente para ver o rosto da
amiga. – O que aconteceu?
– Ah, Lucy... – disse Hermione. – Eu estremeci.
Uma hora mais tarde, Hermione e Richard estavam noivos e Lady Lucinda tinha sido conduzida
de volta à festa. Não que fosse conseguir se concentrar em qualquer coisa que alguém dissesse,mas Kate insistira.
Gregory estava bêbado. Ou, pelo menos, fazendo de tudo para ficar.
Ele imaginava que a noite tinha lhe feito alguns pequenos favores. Não tinha chegado de
fato a se deparar com lorde Fennsworth e a Srta. Watson em flagrante delito. O que quer que
estivessem fazendo – e Gregory estava gastando uma boa dose de energia para não pensar nisso
–, tinham interrompido quando Kate chamara Fennsworth.
Mesmo agora, tudo parecia um teatro. Hermione se desculpara, então Lucy se desculpara,
depois Kate se desculpara, o que parecera completamente sem sentido até ela terminar a frase
com:
–... mas, a partir de agora, vocês estão noivos.
Fennsworth parecera maravilhado, aquele cretino irritante, e então tivera a ousadia de dar
um risinho triunfante para Gregory.
E Gregory lhe dera uma joelhada nas partes íntimas. Não com muita força. Poderia ter sido
um acidente. Mesmo. Eles ainda estavam no chão, um imobilizando o outro. Era completamente
plausível que seu joelho pudesse ter escorregado. Para cima.
Qualquer que fosse o caso, Fennsworth gemera, saindo definitamente derrotado do embate.
Gregory rolara para o lado assim que o conde afrouxara a mão e se colocara de pé sem nenhuma
dificuldade.
– Sinto muito – dissera para as damas. – Não sei o que houve com ele.
E, pelo jeito, isso foi tudo. A Srta. Watson pedira desculpas a ele – depois de se desculpar
com Lucy, depois com Kate, então com Fennsworth, embora só Deus soubesse por quê, uma vez
que ele tinha sido o grande vencedor da noite.
– Não precisa pedir desculpas – retrucara Gregory com firmeza.
– Não, mas eu... – Ela parecia angustiada, mas Gregory não se importara muito na hora. –
Gostei muito mesmo de tomar café da manhã com o senhor. Só queria que soubesse disso.
Por quê? Por que ela falara isso? Será que achara que o faria se sentir melhor?
Gregory não falara nem uma palavra. Apenas acenara para ela uma vez com a cabeça e
depois se afastara. Os outros poderiam resolver os detalhes sozinhos. Ele não tinha nenhum
vínculo com o casal de noivos recém-formado, nenhum dever para com eles ou com o decoro. E
não se importava quando ou como as famílias seriam informadas.
Não era preocupação sua. Nada daquilo era.
Então saíra. Precisava encontrar uma garrafa de brandy.
Agora, ali estava ele. No escritório de Anthony, tomando a bebida do irmão e se
perguntando o que diabo aquilo tudo significava. Não tinha mais nenhuma chance com a Srta. Watson, isso estava claro. A menos que estivesse disposto a raptá-la.
O que não era o caso. Ela provavelmente se esgoelaria pelo caminho todo. Isso sem falar
que devia ter se entregado a Fennsworth. Sem falar também que, ao fazer isso, Gregory destruiria
sua boa reputação. Não é possível sequestrar uma jovem bem criada – sobretudo a noiva de um
conde – e querer que seu nome permaneça intacto.
Ele se perguntou que argumento Fennsworth usara para ficar sozinho com ela.
E se perguntou o que Hermione quisera dizer ao falar que estremecera.
E se perguntou se o convidariam para o casamento.
Provavelmente. Lucy insistiria nisso, não é? Ela era uma defensora da etiqueta. Das boas
maneiras em geral.
Então, e agora? Depois de tantos anos sentindo-se meio sem rumo, de esperar que as peças
de sua vida se encaixassem, ele havia pensado que enfim entendera tudo. Ao conhecer a Srta.Watson, sentira-se pronto para tomar as rédeas da própria vida e vencer.
O mundo parecia bonito, bom e cheio de promessas.
Ora, tudo bem, o mundo já era bonito, bom e cheio de promessas antes. Ele não vinha sendo
nem um pouco infeliz. Na verdade, não se importava com a espera. Não tinha nem certeza se
queria encontrar sua noiva tão cedo. Só porque sabia que seu verdadeiro amor existia não
significava que ele o queria imediatamente.
A vida estava sendo bastante agradável antes. Mas que diabo, a maioria dos homens daria
tudo para trocar de lugar com ele.
Não Fennsworth, é claro. O maldito imbecil provavelmente estava planejando todos os
detalhes de sua noite de núpcias naquele exato momento.
Desgraçado...
Gregory tomou a bebida de um só gole e se serviu um pouco mais.
Então o que aquilo significava? O que significava conhecer a mulher que o faz esquecer
como se respira e ela estar prestes a se casar com outro homem? O que ele deveria fazer agora?
Sentar e esperar até que a visão da nuca de outra moça o deixasse extasiado?
Tomou outro gole. Já estava farto de pescoços. Eram valorizados demais.
Ele se recostou, apoiando os pés na mesa do irmão. Anthony iria odiar isso, é claro, mas
estava ali na sala? Não. Tinha acabado de ver a mulher com quem esperava se casar nos braços
de outro homem? Não. E, indo direto ao ponto, o rosto dele tinha servido como saco de pancadas
para um jovem conde surpreendentemente em forma? Definitivamente, não.
Gregory tocou com cuidado a bochecha esquerda. E o olho direito. Não estaria nada
atraente no dia seguinte, isso era certo.
Mas Fennsworth também não, pensou, animado.
Animado? Ele estava animado? Quem poderia imaginar?
Deixou então escapar um longo suspiro, tentando alcançar a sobriedade. Devia ser o brandy.
A alegria e a animação não estavam na agenda para aquela noite.
Embora...
Gregory se levantou. Apenas como um teste. Um pouco de investigação científica. Ele
podia ficar de pé? Podia.
Podia andar? Sim!
Ah, mas podia andar direito?
Quase.
Hum. Não estava tão embriagado quanto tinha pensado.
Poderia muito bem sair. Não havia sentido em desperdiçar um bom humor inesperado.
Caminhou até a porta e colocou a mão na maçaneta. Então parou e inclinou a cabeça para o
lado, pensativo.
Devia ser o brandy. Realmente, não havia outra explicação para isso.