4- Stonehenge

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O sol forte brilhava no alto, igualmente a uma imensa bola de fogo amarelada, que parecia estar tão perto. O calor emanando dele era intenso, de forma que meus olhos sofriam para se manterem abertos, enquanto eu caía. O vento batendo contra o meu corpo, embaraçando meus cabelos, parecia querer me esmagar. A queda veloz não me dava outra alternativa a não ser me deixar cair, ultrapassando nuvens densas, que estavam ali enevoando minha visão.
Entre o nevoeiro e o ar úmido, surgiu aquela menina novamente, caindo de ponta cabeça, igualmente como eu estava. Seus olhos negros fitavam os meus através das mexas de cabelo que balançavam rente ao rosto mórbido e pálido dela. Mas dessa vez a garota igual a mim, como uma réplica mal feita, estava diferente. Ela possuía asas quase transparentes se abrindo em suas costas, como se fossem feitas pelo próprio vento que chicoteava.

"O que quer de mim?"– Pensei comigo mesma, mas a menina pareceu ouvir.
–"Eu lhe disse que esse seria um dos lugares onde nos encontraríamos novamente. Seja bem vinda à Terra". – Ela sorriu ainda de lábios fechados, mas sua voz penetrava em minha mente como se a garota tivesse falado normalmente.
"Terra..." – Sibilei em voz alta encarando a menina.
"Sim. – ela respondeu ainda em minha mente enquanto sorria – mas não ficará aqui por muito tempo, por enquanto, apenas leia as inscrições..."– e então a garota se esvaeceu junto ao vento novamente, como se fosse soprada com ele.
Em seguida, senti alguém me envolver com braços fortes virando-me para cima, fazendo com que a velocidade em que eu estava seguindo para baixo diminuísse. Virei meu rosto devagar e vi Aelle. Seus profundos olhos azuis me fitavam curiosos, enquanto o par de asas brancas prateadas dele se moviam vagarosamente em suas costas.
– Pensei que você havia desmaiado novamente. – Disse Aelle em voz alta com um sorriso torto no rosto. –Seus olhos estavam fechados, e você parecia inconsciente.
Eu balancei a cabeça devagar negando, enquanto procurava me apoiar nele enquanto voávamos. Meus olhos não estavam fechados... ou estavam?
Olhei ao redor e não avistei nada além de nuvens e um imenso céu azul.
–Onde está Nerian? – Gritei para Aelle, de forma que o vento forte batendo ao nosso redor não atrapalhasse que ele me ouvisse.
–Lá embaixo! –Aelle respondeu gritando também ao olhar para baixo, enquanto batia suas asas e desacelerava para descermos.
Após um momento avistamos uma ilha, onde aterrissamos entre pedras grandes que se encontravam espalhadas pelo gramado rasteiro. Nerian estava escorado em uma delas, seus braços cruzados sobre o peito enquanto encarava o chão. Suas asas negras estavam estendidas contra o concreto, fazendo-lhe uma sombra sobre a cabeça. O semblante de seu rosto estava obscuro.
"Stonehenge"–A voz daquela menina sussurrou em minha mente, o que fez com que eu estremecesse.Era como se ela estivesse no meu inconsciente, e eu queria me livrar dela.
Nerian então levantou seus olhos violetas e me encarou, seu semblante era de preocupação. Ele franziu a testa como se silenciosamente estivesse me fazendo uma pergunta. Eu sorri meio sem graça, enquanto fingia coçar meu pescoço, então ele desviou o olhar de mim para analisar as pedras do lugar onde estávamos.
–Essas pedras parecem ter sido feitas para serem encaixadas umas nas outras com perfeição. – Comentou Nerian pensativo, ao passar a ponta dos dedos na lateral de uma delas.
–Como um quebra cabeças. –Acrescentou Aelle, passando por mim e indo até Nerian que assentia com a cabeça passando a mão na lateral da pedra em que ele estava escorado.
Ambos continuavam com as asas abertas, nas quais o sol refletia majestosamente. Eles analisaram o formato das pedras, e a posição em que cada uma estava caída no chão, enquanto eu apenas os observava.
–Alguma coisa parece ter atingido esse lugar, desalinhando-as. –Aelle disse ao saltar no topo de uma pedra que estava em pé na vertical. E após uma rápida analise, emendou –Acho que essas pedras formavam uma espécie de círculo, com outro circulo no centro dele.
–Há rastros na grama! – Observou Nerian, ao se agachar no chão apoiando-se em um dos joelhos. –Eles parecem seguir em torno das pedras, contornando-as, semelhante a um círculo também. É como se algo tivesse amassado a grama ao ser colocado no chão.
Eu me aproximei deles, me agachando ao lado de Nerian e pousando a ponta de meus dedos no gramado marcado.
" Inscrições, minha garotinha. Não se esqueça delas..."–A imagem da menina surgiu repentinamente à minha frente, sibilando junto ao vento. Me assustei ao vê-la repentinamente, de forma que me desequilibrei e caí sentada no chão ao lado de Nerian. A menina desapareceu novamente.
–Você está bem? –Nerian rapidamente se aproximou pousando suas mãos em do meu rosto.
–Estou. – Murmurei balançando a cabeça. Mas na verdade não estava, eu sentia que conforme o tempo ia passando eu ia ficando mais fraca, e estranhamente mais ausente de mim mesma.
–Venham ver isso! – Aelle gritou, a vários metros de distância de onde estávamos. Eu não havia percebido que Aelle havia se distanciado tanto.
Nerian foi o primeiro a se levantar, me puxando junto com ele, de forma a me dar mais equilíbrio. Andamos em silêncio até onde Aelle estava, suas asas brancas prateadas reluziam enquanto ele andava de um lado para o outro analisando o gramado.
Quando nos aproximamos, ele estendeu o braço esquerdo de forma que sua mão se movimentasse no ar desenhando uma espiral. Os músculos de seus braços se flexionavam contra a camisa com o movimento. Aelle havia se tornado nitidamente mais forte, durante o tempo em que esteve ausente.
–O que será que é isso? –Aelle perguntou em voz alta coçando a sobrancelha com o polegar da outra mão livre.
Nerian se aproximou e se agachou colocando a mão no chão, sobre outros rastros no gramado que Aelle parecia ter encontrado.
–Há vários círculos formando essa espiral. –Nerian comentou lançando seus olhos para o céu. – Como se algo houvesse pousado aqui, pois não há mais rastros indicando que foi arrastado ou se movimentou até este ponto.
–Alguma criatura alada? –Arrisquei alternando meu olhar de Nerian para Aelle.
–Não sei... –Aelle coçou a cabeça bagunçando seus cabelos negros. –Seja lá o que tenha pousado aqui, aparenta ser enorme e pesado.
Nerian se levantou devagar, olhando para as pedras novamente, que estavam do outro lado. Então ele voltou o olhar devagar para a espiral de círculos que Aelle havia encontrado no gramado, e franziu o cenho como alguém que estivesse preocupado.
–Acho que o que quer que tenha estado aqui –Nerian olhou para mim e para Aelle –Também esteve lá naquelas pedras.
–E por quê acha isso? – Perguntei olhando novamente para a espiral de círculos no gramado rasteiro.
–Palpite. – Nerian se limitou a dizer.
O sol começava a se por no horizonte, logo ia anoitecer, e nós nem se quer tínhamos uma ideia exata de onde estávamos, e eu, apesar de ter ouvido algumas coisas da menina em meu inconsciente, me mantive em silêncio. Decidi que iria me manter longe de quaisquer acontecimentos futuros, pois da última vez que embarquei numa aventura misteriosa, acabei com uma barra de metal cravada entre meio minhas costas, e dessa vez eu não gostaria que algo assim se repetisse.
Nerian parecia estar realmente compenetrado em desvendar alguma coisa sobre aquelas pedras, pensativo ele andava de um lado para o outro, medindo a distância e a localização de cada uma delas. Olhei para sua mão esquerda, o vidro da aliança em seu dedo anelar piscava toda vez que Nerian balançava a mão contra os reflexos do por do sol. Parecia tão natural a presença daquele anel no dedo dele, como se já fizesse parte do seu corpo. Espiei minha mão por um breve momento, fitando minha aliança. Ela definitivamente não emitia a mesma naturalidade em meu dedo. E por falar em casamento, me lembrei dos acontecimentos que se sucederam após o nosso enlace. Eu queria ter a oportunidade de conversar com Nerian sobre a morte de Sara, mas tudo aconteceu tão rápido... Eu não tinha certeza se Nerian já sabia que a mãe dele havia morrido, mas ele parecia ter se esquecido do episódio em meu quarto, quando Sara falava de seus motivos de ter feito tudo o que fez. E a maneira como ele estava agindo em conjunto com Aelle, era algo totalmente novo para mim. Eu sabia que por dentro, talvez ele não estivesse tão bem quanto aparentava, mas por enquanto, era melhor deixar as coisas como estavam, se ele quisesse conversar em algum momento, eu estaria esperando.
–A luz do pôr-do-sol, bate contra as pedras, criando uma sombra que corta o círculo exatamente ao meio. –Aelle falou me tirando a concentração, de forma que eu prestasse atenção nele.

Eileen (PARTE II) (Em andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora