O grande ato

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Antes de entrar nos aposentos da Rainha, Seokjin estava trêmulo. Aguardando pela autorização para a encontrar, sentia o coração palpitar com pressa, quase saindo do peito. Quando, enfim, teve a permissão para vê-la, respirou fundo e sua vista escureceu. Já tivera suas intempéries com a Rainha, brigaram e fizeram as pazes inúmeras vezes, mas Seokjin sentia que nunca tinha sentido de verdade o poder de sua ira. Sabia que podia convencê-la com facilidade a perdoar suas criancices e pequenas insubordinações. Se existia alguma vantagem em ser o único filho, era a de ter um poder extraordinário sobre quem lhe havia gerado. Tal poder, porém, estava longe de seu na situação, porque se via com um receio inédito. O que estava prestes a fazer nada tinha de mera malcriação; estava a ponto de, talvez, se tornar uma persona non grata em seu próprio seio familiar.

Estava com medo, mas jamais deixaria que isso o impedisse de fazer o que acreditava ser necessário. Engoliria seus receios e inseguranças e daria o passo que tanto tinha planejado, custasse o que tivesse que custar.

Respirou fundo e se forçou a se recompor. Soltou o ar bem devagar, empinou o nariz e estufou o peito, como se tais ações fossem expulsar o pânico que gritava em casa célula de seu corpo. Pensou nos sonhos que alimentava para quando se tornasse Rei, e isto foi suficiente para lhe aplacar os ânimos agitados. Quando se viu diante de sua mãe já não havia nenhum temor visível. Ao menos, era o que julgava.

— O que tenho a tratar contigo não é um assunto dos mais leves, Alteza. — Iniciou, dando tempo a si mesmo antes de adentrar de fato no tema da conversa.

— Poderia concordar ou discordar de ti se tivesse a mínima ideia do que desejas. — Tal qual Seokjin, mantinha uma pose segura. — Temos intimidade o bastante para que te poupes de floreios. Estás em meu quarto, tomando de mim um tempo precioso. Dize-me o que pretendes e me resguarda de introduções desnecessárias.

— Como queiras, Alteza. — Deu um longo suspiro, fraquejando um tanto na máscara de autoconfiança que tinha forjado. — Vim aqui para tratar contigo qual será o destino de nossa Casa diante de Gwacheon.

— Que queres dizer com isto? — As feições, impassíveis, não denotavam nenhum sentimento. — Que há para ser debatido quanto ao futuro desta Casa? A mim e a qualquer um, é um destino cristalino.

— Sabes que não é assim, não sabes? Custa-me acreditar que tu, como és, não tenhas ideia do que tem acontecido bem debaixo de teu nariz.

— Ora, Príncipe... — Deu um meio sorriso, se aproximando dois passos do rapaz. — O que escapa a uma Rainha sobre o Reino que comanda?

— Suponho que nada, Alteza, por isto, creio que entendes bem que nossa Casa não está nas melhores condições.

Minseo não disse nada em seguida. Sem dar sinal de concordância ou discordância, caminhou devagar até o divã próximo à janela e se sentou com elegância e imponência, como se estivesse ocupando o trono numa ocasião oficial. Para Seokjin parecia que estava apenas demarcando território, mas era um tanto mais que isso. Ela sabia muito bem a que Seokjin se referia, e odiava a instabilidade a que seu poderio vinha sendo acometido.

Quando jovem, Minseo precisou fazer acordos e atropelar linhagens para ocupar o trono que legalmente tinha lhe sido dado. Suas ambições de juventude eram grandes, e não se furtou de ajudar a própria sorte para ocupar um lugar que naturalmente não teria vindo parar em suas mãos. A Corte tinha legitimado sua coroação, e os poderosos asseguraram que assim fosse, porque lhes era mais vantajoso estar com ela que com o sucessor natural do Rei anterior. Isto, porém, não impediu que muitos ainda se mostrassem fiéis ao herdeiro usurpado, e em todos aqueles anos, não perderam nenhuma chance de enfraquecer seu poderio. Ser muito jovem quando ascendeu ao trono, ter contraído matrimônio com uma ômega não muito bem vista pelos mais conservadores, a demora para gerar herdeiros, o fato de ter tido apenas um, a própria personalidade mais calma de Seokjin, todos eram motivos para que os alicerces de sua Casa, tão duramente estruturada, fossem atacados. Mais recentemente, o boato maldoso de que Seokjin sequer possuía seu sangue vinha tomando proporções que lhe perturbavam.

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