Conto 02: Less Than Zero

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Escrito por: Luna Romero, @lunaromeroautora no instagram

Revisado por: Vivis Ribeiro, @vivisescreve no instagram

Aviso de Gatilho: Menção ao suicídio; idealização suicida

Classificação Indicativa: +16

Frank Manson estava se confessando com o forno de sua cozinha, quando a campainha tocou.

Por alguns segundos, ele permaneceu sentado onde estava, encarando frustrado o vidro engordurado bem diante de seu rosto. Sua longa lista de pecados e arrependimentos era dolorosa e aquela interrupção havia lhe roubado um momento precioso de desabafo. O fogão estava se mostrando o melhor ouvinte que ele conheceu em seus 61 anos de vida: ele não o havia julgado ou dito frases motivacionais vazias. Havia apenas silêncio.

Quando Frank criava coragem o suficiente para preencher aquele silêncio com dor e arrependimento, o ar se tornava denso, pesado. Em algum momento, Frank sabia que o peso no ar se tornaria potente o suficiente para sufocá-lo. E achava que sabia como seria a sensação. Tinha pesquisado o suficiente sobre, em seu computador.

A campainha soou novamente, irritando-o. Se encolhendo onde estava, Frank esperou que sua visita indesejada fosse embora. Por um momento, tentou encontrar dentro de si algum sinal de medo ou pesar pelo que estava prestes a fazer, mas não conseguiu.

Aquela ideia vivia dentro de sua cabeça há mais tempo do que ele era capaz de determinar. Começou leve, como a sensação de uma agulhada, que vinha e logo se dispersava: um pensamento inofensivo, que não valia tanto alarde. Um dia, sem que percebesse, os pensamentos recorrentes se transformaram em uma ideia. Uma ideia tão vívida que tomou conta dele aos poucos, consumindo-o, até se tornar um plano.

E ali estava ele, prestes a transformar seu plano em realidade.

- Sr. Manson? – uma voz feminina gritou do lado de fora, sobressaltando-o – Você está em casa? Somos nós, Amber e Fred.

O nome de seu filho o fez começar a se levantar, antes mesmo que se desse conta do que estava fazendo. Os resquícios do whisky que havia bebido durante todo o dia ainda estavam em seu sangue e sua caminhada até a porta foi vacilante e desengonçada. Ao chegar até a maçaneta, porém, Frank congelou, começando a entrar em pânico. Ele não queria Frederick ali. Seu filho deveria estar do outro lado da cidade, onde o advogado que Frank havia contratado poderia encontrá-lo na manhã seguinte, para lhe entregar sua carta de despedida. Por que fazer aquela visita repentina, justamente naquela noite? Será que Frank poderia simplesmente continuar fingindo que não estava em casa, até que ele fosse embora...?

- Nós vimos sua silhueta pela cortina, Frank. – Fred suspirou, aborrecido – Pode abrir ao menos uma fresta da porta? Não vou demorar.

As mãos trêmulas de Frank brigaram com a maçaneta até que ele conseguiu virá-la e abrir a porta, ficando frente a frente com o jovem casal. Sua nora, Amber, tinha um sorriso tenso no rosto e segurava um pequeno pacote de cobertores enrolados contra o peito. Frank ainda sustentou o contato visual com ela por mais alguns segundos, antes de se virar para o filho.

A dor de olhar para Frederick era uma agonia que nunca havia se acostumado a sentir. Quando ele era mais jovem, era um afago para seu orgulho perceber o quanto os dois eram parecidos: o mesmo cabelo escuro e crespo, a mesma pele retinta, as mesmas sobrancelhas arqueadas. Porém, com o passar dos anos, tudo o que Frank conseguia ver no filho eram os olhos amendoados, iguais aos de Wendy.

Ele tinha ido para a cama com mais mulheres do que era capaz de contar e até mesmo se casou com algumas, depois de seu primeiro divórcio. Mas nunca havia sentido por nenhuma o amor que tivera por Wendy Park.

Entre Palavras e AcordesOnde histórias criam vida. Descubra agora