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Se Robby tivesse uma caneta e um caderno, escreveria um diário para registrar o tempo passado com Miguel no hospital. Ou enfiaria a caneta no próprio olho para se livrar de vez desse tormento. Ele achava que Miguel ia fazer o possível para chateá-lo, insultá-lo, testar sua paciência e tentar fazer ele desistir, mas não esperava que a raiva do garoto fosse durar tanto. Aparentemente, ele podia ser bem paciente quando queria. E irritante, e mesquinho, o tempo todo.

O pior de tudo era ver como ele agia com todas as outras pessoas. A equipe do hospital o adorava, e o modo como ele tratava e falava de Robby foi fazendo com que passassem a tratá-lo de forma distante e desconfiada. Com a exceção de Nancy, que ainda parecia gostar dele, todos os outros o ignoravam ou reprovavam desde que Miguel acordou. Com Carmen e Rosa, Miguel era um docinho, era bem óbvio porque elas o protegiam tanto. Carmen olhava para Robby como se pudesse fulminá-lo com a força do pensamento. Johnny, bem, Miguel era o garoto de ouro dele, seu orgulho. Os dois tinham uma relação descomplicada e conversavam sobre tudo, riam juntos e eram inseparáveis. Johnny mal conseguia olhar nos olhos do filho quando conversavam.

E ainda tinha os amigos. Hawk veio visitar Miguel e partiu para cima de Robby quase que imediatamente. Miguel disse a ele para parar e Robby se surpreendeu, mas não por muito tempo. "Eu sei o que tô fazendo, Hawk. Não suja suas mãos com um lixo desses."

Sam foi ainda mais horrível, de forma diferente. Ela e Miguel tiveram uma conversa bem desconfortável sobre manter a amizade e tudo mais. Mas assim que ela foi embora, Miguel fez questão de mostrar a Robby que estava no controle da situação.

"Você sabe que ela volta pra mim se eu pedir, né? Que ela não gosta de você, que ela te trairia mil vezes. Porque eu sou melhor que você, Keene. Não esqueça disso."

No começo, Robby ficou apenas com raiva. Depois, começou a perceber o quanto era doentio o ódio que estava se propagando ali. Se respondesse com raiva, aquilo nunca acabaria. Mas não sabia como reagir, por mais que tentasse acalmar os ânimos, Miguel só o tratava pior. E nem podia dizer que ele estava assim por amargura, ele tentava o melhor para ser positivo com todos, menos com Robby.

Domingo era um dia bem cheio na cozinha comunitária, mas Robby ficava satisfeito em ter menos tempo para pensar. Já começava a ficar nervoso desde a véspera quando tinha que ir ver Miguel, estava se tornando uma verdadeira tortura. Robby abraçaria o próprio demônio pra se livrar de Miguel, esse era o nível de stress em que estava.

Chegou ao hospital na segunda e agiu como vinha fazendo desde a outra semana. Quieto, evitando muito assunto e tentando passar despercebido. Foi para o quarto torcendo para haver alguém lá, de preferência Rosa. Ver Miguel interagir com ela era o que lhe fazia continuar voltando, saber que ele era uma boa pessoa e que era capaz de ser gentil e amoroso. Que não merecia estar preso a uma cama de hospital, por mais que estivesse se aproveitando para torturar Robby, isso não era quem ele realmente era. Infelizmente, nesse dia Miguel estava sozinho.

"Finalmente. Já estava cansado de esperar." Miguel disse, impaciente.

"E por que estava tão ansioso?" Robby desconfiou.

"Fome." Miguel disse em tom de deboche e apontou para a bandeja ao lado da cama onde seu almoço estava. "Você está aqui pra ajudar e cuidar de mim, não é?" Robby quase revirou os olhos com tamanha infantilidade. Miguel podia muito bem comer sozinho e o fazia todos os dias. "Você quer ajuda pra comer?"

"Não sou inválido, Keene. Não quero ajuda pra comer. Quero que você me sirva." Disse com um meio sorriso.

"Sou seu cuidador, não escravo."

"Se eu chamar a enfermeira aqui pra dizer que tô com fome até agora mas minhas mãos estão tremendo demais pra comer sozinho, e disser que você se negou a me ajudar..."

Reparação e Desejo (Kiaz/Robbyguel)Onde histórias criam vida. Descubra agora