Capítulo 6

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A primeira coisa sentida ao entrarem dentro do balcão foi o cheiro: um forte odor de podre, antigo e guardado.

Era um ambiente muito aberto, com apenas alguns pilares enferrujados e um pequeno mezanino, estava cheio de pó, teias de aranhas e baratas, mas não haviam janelas, móveis, caixas, ou o que quer que se guarde em balcões.

Celeste franziu o cenho ao ver as duas celas vazias e sujas de sangue. Eram as únicas coisas colocadas lá dentro, posicionadas bem no meio do espaço, uma ao lado da outra. Eram grandes e resistentes, com o ferro marcado com runas de anti-magia.

No chão, em meio as celas, estavam seus pais. O corpo de Ayane deitado ao lado de Dume, as roupas finas agora muito rasgadas e sujas, os cortes grandes em suas carnes bem abertos e com o sangue que ainda parecia muito vermelho e vivo grudados em suas peles, resultado da magia de preservação que a filha jogou neles antes de fugir com o irmãos.

Ao lado da garota, Aren não conseguiu evitar de se curvar e vomitar o café da tarde. Um pouco atrás Zuri fez o mesmo. Jawari e Bintu estavam paralisados um pouco a frente.

Algum tempo depois a chave de portal os deixou no saguão do castelo. Jiwi apareceu assim que sentiu a presença de seus mestres, mas soltou um grito assim que viu os corpos ensanguentados, desaparecendo logo em seguida.

Bintu mandou Celeste para o quarto assim que seus pés tocaram o chão, e a garota foi sem rebater, passando por um Dori apressado e de roupas amassadas enquanto subia as escadas. Refletiu por um segundo antes de ir ao estoque pegar uma poção de sem sonhos. Definitivamente não estaria dormindo aquela noite sem ela.

O enterro aconteceu naquele mesmo dia durante o pôr-do-sol. Os Carolinos, elfos e fadas cuidadoras (pequenas fadas do tamanho de um mindinho, com peles como casca de árvores coloridas e asas delicadas e cintilantes, que literalmente cuidam das coisas) que vivem nas estufas, se reuniram no bosque da propriedade, onde ficava o cemitério da família.

Celeste se sentia indesejavelmente ciente de tudo. Dos últimos raios de sol esquentando sua pele e a terra macia sob suas botas, da magia lhe tomando o paladar e pinicando a pele, do soluçar de seus tios, o ressonar de Ayo e a choradeira dos elfos, das lagrimas de seu irmão lhe molhando a camisa, e do cantar das fadas enquanto cuidavam do solo recém-mexido.

“Uma vida se vai,
E a que fica deve seguir vivendo.
A Mãe cuida,
Mas do pó viemos, ao pó iremos.”

Ela se sentia vazia encarando aquelas lapides que mostravam que agora seus pais dormiriam para sempre um ao lado do outro. Não conseguia chorar ou ao menos sentir tristeza, pelo contrario, ela sentia ódio. Muito ódio.

Na manhã seguinte logo após o café da manhã, Badok, o duende responsável pela gerência de contas dos Carolinos no banco dos seres mágicos (um pequeno ser cujo o topo da cabeça batia na altura do quadril de Celeste, de orelhas e nariz grandes e pontudos, cabeça um tanto achatada, careca e de sobrancelhas escuras, e olhos pequenos que davam a impressão de serem inteiramente negros), apareceu vestido em um terno vermelho profundo e segurando uma pequena maleta de couro. Celeste foi quem o recebeu no hall.

A garota pôs a mão em punho em cima do peito e fez uma pequena referência.
ㅡ Que seu ouro cresça, Badok. ㅡ cumprimentou.

ㅡ E que seus inimigos pareçam diante do seu nome, Srta. Carolino. ㅡ o duende repetiu seu movimento, a voz soando grossa e baixa.

ㅡ Mimi. ㅡ chamou. Com um estalo a elfa estava em sua frente, ainda com os olhos chorosos. ㅡ Avise a meus tios que Badok chegou e que estaremos no escritório, por favor.

Celeste - Resgatada da MorteOnde histórias criam vida. Descubra agora