Um dia ele virou para mim e me fez essa simples pergunta:— Você sabe a diferença entre o cientista e o artista?
Eu, tolo, disse-lhe não, afinal era um cientista, e cientistas não são nada sem seus fatos.
Ele apenas sorriu, afinal era um artista, e artistas… Artistas simplesmente sabem, e quando não sabem, inventam.
Ali, encarando o sol poer-se ao longe e abaixo ondas tranquilas, pacientemente, ele respondeu a si mesmo:— O cientista é aquele que vive para um dia amar. "Ora, por que vivo?" pergunta o cientista "Certamente – e a eles os apetece a certeza – porque preciso achar." Eles sempre procuram algo; respostas, mais perguntas… Mas na verdade é o amor por alguma coisa. Eles o desprezam, sem saber que é justamente ele o objeto de sua busca desesperada.
Ele me hipnotizava com suas palavras, sempre conseguia. Cativava toda minha atenção sem sequer tentar.
Finalmente, vendo que ele pretendia se calar, perguntei-lhe sobre o artista, no que, olhando-me nos olhos e com um sorriso tranquilo, respondeu-me:
— O artista, bem… O artista vive porque ama. Ele não busca o amor, ele já o tem. Para o cientista ele soa como um louco, tal qual o cientista para ele. "Tolo! Como pode já ter algo que tanto procurei em todos os lugares?!" revolta-se o cientista. "Busque um espelho quando desejar chamar alguém de tolo!" Revida o artista "Como pode você procurar algo que está bem diante dos seus olhos?" E dura por milhares de anos essa discussão. Acredita-se ser impossível o cientista e o artista um dia chegarem a um acordo, mas levo-me cada dia mais a discordar. Você parece me entender.
Ele sorriu, em paz, e voltou a encarar as ondas.
Então sorri também e desviei o olhar, ficando cabisbaixo.
E um pensamento invadiu minha mente, recusando-se a partir.
Era algo bem pequeno, que sempre ia e vinha e que eu gostava de manter para mim.
"Acho que me tornei um artista por você".
O problema, meu grande amor, é que a arte e a ciência duram para sempre, mas o artista e o cientista não duraram nem até o fim da discussão.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Carta aberta para toda história que talvez eu nunca escreva
PoesíaPalavras são peças de um dos jogos mais elegantes e excitantes que há. Quantas frases posso formar? Quantas subversões sou capaz de criar? Palavras são um vício, e vício leva à perdição, e perdição leva à catástrofe, e catástrofe só pode acabar em t...