Capítulo 1: Verdade (introdução)

65 6 6
                                    

Todos sabemos que uma das piores fases da vida é a "entrada da pré-adolecência", pelo menos eu acho que deva ser a pior, até porque eu só vivi ela. Quem sou eu? Na verdade nem eu sei, acho que vou descobrir junto com vocês. Mas vou contar o que eu sei sobre mim até agora, meu nome é Lucas, na verdade, Kleber Lucas. Nome forte né? Pois é, também acho, nada haver comigo em todos os sentidos. Me apresento como Lucas porque acho mais a minha cara, tem o significado de "iluminado", eu concordo. Realmente sou uma luz bem visível. Lucas tem uma vibe mais leve, divertida, gosto mais desse nome, pois é super minha cara.

O motivo de eu não gostar de "Kleber"? Acho um nome muito sério, e outros motivos também, porém, o universo me fez o favor de colocar na cabeça de todos os professores de lerem apenas o primeiro nome na hora chamada, e a partir daí, todo mundo me chamar de "Kleber" na escola nova. Mas estamos bem adiantados, pra entender todo o contexto, temos que voltar um pouquinho.

Minha família era composta por minha vó e minha mãe. Pelo fato da gente morar um pouco distante da cidade, minha mãe teve que morar em um outro bairro por conta do trabalho, um bairro onde ela teria melhores oportunidades, mas sempre visitava a gente. Meus pais se separaram assim que fiz 4 anos, tenho algumas lembranças do que acontecia, lembranças que eu não gostaria de lembrar. Sabe aquela velha história de que "foi comprar cigarro e nunca mais voltou"? Pois é. Já separados, justo no dia que a minha mãe veio visitar a gente, meu pai foi até onde eu morava me buscar pra eu passar um final de semana com ele. Enquanto minha mãe arrumava minhas coisas, ele esperava em um barzinho que ficava na esquina, já que minha mãe não queria nem que ele ficasse lá em casa esperando.
Ele sempre teve problemas com bebidas... Ele simplesmente não voltou pra me buscar, não sei se alguém da minha família disse alguma coisa fazendo com que ele fosse, não sei se ele simplesmente me esqueceu...
Além de existir vários outros motivos que me fez não gostar do meu pai. Aquelas malditas lembranças. A partir daí não quis mais falar com a minha família sobre esse assunto, não me sentia bem, ao longo do tempo, soube que ele casou outras vezes, teve filhos. Esse é um dos principais motivos do porquê eu odiar o meu nome. Não sei da onde vem a ideia dos pais colocarem seus nomes nos filhos, que falta de criatividade. Não é que eu odeie meu nome, eu gosto dele, só não gosto que me chamem por apenas "Kleber".

Meu avô tinha o mesmo problema da minha mãe, mas não nos visitava com tanta frequência como ela, pelo menos na minha memória. Dá pra ver daí o motivo de cobrar de mais dos meninos que me dão o mínimo de atenção, já que nunca tive uma figura masculina presente na minha vida. Tô falando demais de novo, ainda não tá na hora de falar disso.

Sempre tive poucos amigos desde o primário, sempre andava com as meninas. Nunca me senti a vontade de ficar perto dos meninos. Uma parte era porque eu tinha medo de que eles me abandonassem igual a todos os homens que tiveram alguma "presença" na minha vida, por outro lado, acho que eles não me enxergavam como um deles, e realmente eu não era, ou era. Tô querendo dizer que sou homem igual eles, a diferença é que eles falavam sobre qual das meninas é a mais bonita, e eu sobre suas roupas, seus penteados icônicos e mochilas coloridas.

Algumas vezes ouvia alguns comentários preconceituosos na rua, na escola, até mesmo nos encontros familiares, porém nunca liguei. Na verdade eu ligava, mas nunca demonstrava, sempre odiei que me vissem chorando, odeio parecer que sou um fracassado.
Sempre soube que eu era diferente. Aos 7 anos, beijei pela primeira vez uma garota. Era apenas selinho, meu primeiro "namorinho" que foi suficiente pra eu saber que sou gay. Não é que ela era desprovida da beleza... é que... ah... eu precisava de algo pra ter certeza, mas não me senti à vontade.

No sexto ano, período em que meu corpo começou a se desenvolver, hormônios florescendo, a escola recebeu vários alunos novos, dois desses alunos eram um casal de primos.
A garota era linda, loira, tinha os olhos verdes, a aparência de um anjo. Viramos amigos logo de cara, depois tive uma leve quedinha por ela. Com o tempo, as pessoas começaram a nos shippar e a gente se afastou. Até onde eu sei, os pais dela eram muito religiosos, por isso tinha a personalidade de "santinha", não queria fazer nada pra deixar eles desapontados. Durante isso, comecei a olhar mais pro primo dela. Caio foi o primeiro menino que eu revelei pras minhas amigas que gostava. Acho que foi o primeiro menino que eu realmente gostei.
(Jade, Camila e Mariana sempre tiveram uma desconfiança, mas nunca perguntaram sobre minha sexualidade. A gente sempre vivia junto desde pequenos, elas foram as únicas que sempre tiveram comigo em toda minha vida desde que entrei na escola. Jade era a líder do nosso grupo, era a lacradora, sempre tinha opiniões e argumentos certos para qualquer ocasião. No off, ofendia 20 minorias diferentes em todos os lugares, mas sempre defendia o que achava certo. Camila era a gótica do grupo, odiava todos e todas da escola, aliás da vida, só amava seu gatos e web namorados que fazia no Club Cooee. Nunca sabia qual era a sua sexualidade, toda semana mudava pois não tinha certeza. Mari era a patyzinha rica. Não era aquelas "metidinhas" que se acham a última bolacha do pacote, pelo contrário, sempre vivia quietinha. Formávamos o grupo perfeito!).
Caio era o "popular da escola", todo mundo queria falar com ele, ser amigo dele, e obviamente ficar com ele. Ele não era tão bonito assim, até hoje eu não sei como eu fui me apaixonar por ele, mas relevem. Todo mundo naquele lugar tinha vontade de ser conhecido na escola, faria de tudo pra ser, até mesmo brigar pra ficar com ele. Eu fui um deles, não briguei pra ser conhecido até porque eu já era conhecido como "o viadinho que gosta do Caio", briguei pra ficar com ele, não física, só discussão, até porque, eu, magro do jeito que sou, iria apanhar com um sopro de qualquer um. Tinha as meninas pra me defender, mas mesmo assim odiava brigar. Acabei sofrendo muito com tudo isso, achando que nunca iria encontrar alguém que gostasse de mim. Cheguei a pensar que era algum tipo de maldição fazer as pessoas se afastarem ou não gostarem de mim... Passei por momentos que não gosto de lembrar, mas que foram essenciais pra me tornar a pessoa que sou hoje.

Nessa época, conheci Kaique. Nunca o dei tanta importância, na real, nem sabia que ele existia. Só tinha olhos para Caio, que não vi a vida passar. Lembro que ele se aproximou do meu grupo de amigos do nada, o que também influenciou na nossa amizade. Aquele era o último ano dele na escola. Ele era um fofo, e muito carinhoso comigo. Até estranhei, acostumei ver as pessoas irem embora, nunca vi alguém ser tão legal comigo, principalmente um garoto. Que eu me lembre, ele se considerava bi, mas nunca conversamos sobre isso, falávamos da vida, e de sentimentos, nunca sobre a gente, até por que a gente não tinha nada.

Começamos a escrever cartas um pro outro. Clichê? Sim. Mas eu amava. Nossas salas eram distantes, na hora do recreio entregavámos as cartas um para um outro, a gente fazia alguns desenhos, era lindo. Ele desenhava muito bem, eu só sabia desenhar os bonequinhos de palitinho, mas eu entregava tá?! Foi em algumas dessas cartinhas que ele se declarou pra mim.

///////////////

FINAL DO ANO LETIVO

Um dia, na saída da escola, eu e as meninas resolvemos chamar algumas pessoas pra jogar verdade ou consequência. Sempre adorava esse jogo porque descobria algumas fofoquinhas dos outros. Boa parte era mentira? Sim. Até eu mentia pra fingir que a minha vida era super descolada, sendo que as meninas sabiam tudo sobre mim. Elas me entregavam? Óbvio que não, elas também mentiam, e depois conversar sobre isso era hilário, era nossa diversão. Em uma das rodadas fui desafiado a fazer uma das coisas que mudaria tudo: fui desafiado à beijar Kaique. Minhas mãos suavam. Eu nunca tinha beijado, ainda mais um menino, e se eu não soubesse beijar bem? Viraria mais uma piada pra escola. E tinha outra coisa... Eu acreditava no amor. Não sabia o que era, ou sequer sentido, cresci assistindo filmes onde as pessoas viviam um conto de fadas, se amavam e viviam felizes pra sempre, que não importava o que acontecia eles sempre se amavam. Eu acreditava.
Acreditava que isso ia acontecer, mas não com Kaique. Não gostava dele como ele disse nas cartas, me afastei dele porque não sabia como reagir, nunca ninguém disse as coisas que ele disse pra mim.

Não sabia o que fazer... Se eu beijasse ele ou não, ambas opções poderia machucar ele. Essa era a última coisa que eu queria, porque eu sabia como era isso, eu vivi exatamente a mesma coisa com Caio.

Beijei.

Senti pela primeira vez o que eu sempre ouvia falar ou lia nos livros, as famosas borboletas. Nunca as tinha sentido. Nunca senti o que eu senti, na verdade não sabia explicar o que era, mas gostava da sensação.

A notícia se espalhou na escola como se fosse bala na mão de criança. Enquanto alguns shipavam a gente, outros jogavam pedra, claro, dois meninos se beijando seria um escândalo suficiente pra ser a notícia do ano.

Vou contar de forma resumida: ele saiu da escola, nos afastamos, não aconteceu mais nada. Não iria acontecer, meus sentimentos por ele era apenas como os de um amigo. Hoje em dia ele namora com outro garoto, parecem estar felizes. Como eu sei? Pelo amor de Deus né, eu sou FBI do insta meu amor. Fico feliz por ele achar alguém que realmente mereça ele, até porque o filha da puta dessa história toda fui a poc aqui que julgava os outros por não dar valor a quem realmente gosta da gente, e fiz a mesma coisa.

Depois de tudo isso, passaram-se dois anos que estudei na mesma escola. Foi in-crí-vel!
Finalmente me assumi gay (pelo menos fora de casa) fiz novos amigos, as meninas sempre comigo, fiquei meio que popular na escola por ser o único "gaysinho assumido", e por conta de toda tour que rolou.

2019... O ano que cursei o oitavo ano. O ano que eu considerava como o melhor da minha vida, se tornou um dos piores. Um dia cheguei em casa e encontrei meu avô. Veio nos visitar como costumava fazer, trazendo novidades como sempre fazia. Pensei que era mais uma das suas surpresas, já que quase não o via. Devia ser um jeito pra se livrar de sua culpa de ser tão distante, pois fazia isso sempre.

IRÍAMOS NOS MUDAR???

Verdade ou Consequência Onde histórias criam vida. Descubra agora