Capítulo 3

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― Está dormindo? ― perguntou meu marido.

Estávamos em seu carro, indo para Venda Nova depois de fecharmos a casa.

― Não ― respondi ainda com a cabeça recostada no apoio do banco, vendo a paisagem que passava pela janela; borrões pretos, porque a noite caiu rápido. ― Estava pensando em mim, na mulher que era quando estive aqui pela primeira vez...

Não menti. Em tudo que recordei sobre como os irmãos Bianchi entraram na minha vida, o que mais chamou minha atenção foi como eu era antes que cada um deles me influenciasse de algum modo.

― Não estava pensando nele de novo, não é? Devo me preocupar?

Ele já estava alarmado, notei em seu tom. Por isso girei a cabeça sem erguê-la do apoio e sorri em sua direção. As luzes do painel iluminavam nossos rostos.

― Juro que não! Estava mesmo pensando em como cuidava mais de mim, em como eu era forte e decidida.

― Ainda é, amor ― ele garantiu, pegando uma de minhas mãos para depositar um beijo. ― Está tudo aí, dentro de você.

― Eu sei que você acredita nisso ― retruquei, ainda sorrindo.

― E logo a senhora também vai acreditar ― replicou, sorrindo para mim sem largar minha mão. ― A prova está nesse sutiã rendado que esconde bem aí.

Com nossos dedos entrelaçados, apontou para meu moletom.

― Estou tentando voltar ― falei, com meu sorriso perdendo força. Porém, não por eu estar triste, apenas insegura. ― Quero ser a esposa que você tanto lutou para ter, só que não sei se eu consigo ou... Ou se mereço.

― Merece! ― falou ele, agora bravo, apertando meus dedos. ― Dos três você é quem mais merece voltar a ser quem era. Se há alguém aqui que não merece essa segunda chance, sou eu!

― Tirando seu deslize, que eu prefiro mesmo esquecer, não me lembro de qualquer outro erro seu.

― Só porque me ama ― garantiu, novamente sorrindo. ― Errei muito, especialmente no que se referia a você. Se eu nunca tivesse...

― Vamos parar por aqui! ― pedi com firmeza que me surpreendeu. ― Já bastam as cenas que pipocaram na minha cabeça só por estar na casa. Não quero entrar em assuntos que mudem o que estou sentindo.

― Está me dizendo... ― Começou com uma nota de esperança na voz. ― Está dizendo que, seja lá o que lembrou, trouxe algo bom?

― Talvez... ― Resolvi fazer charme, sentindo meu espírito divertido como há muito não acontecia. ― Por enquanto, quero guardar essa informação só para mim.

Isso não podia acontecer. Minha Ti tinha de me dizer tudo que estivesse relacionado à casa, a nós, e que fosse relevante para ela. Mas, não poderia ser eu o transparente mostrando minha ansiedade. Em nada a ajudaria, mas eu queria mesmo saber o que tinha acontecido e se tinha mesmo sido algo bom.

― Dona Tatiana Bianchi... ― Ele amiudou os olhos para mim. ― O que está passando por essa cabecinha linda?

Apenas ergui os ombros e sorri. Meu rosto seguiu sendo escrutinado por um tempo que já começava a me preocupar. Tudo bem que a pista estava tranquila, mas ao volante o certo era olhar em frente. Estava quase o repreendendo, quando ele voltou a prestar atenção à direção, dizendo:

― Não vou mentir... Quando a Dra. Clara sugeriu essa nossa imersão no passado, não curti muito no começo. Mas, depois entendi o que queria e a convenci a vir, ainda assim estou com medo do que isso possa fazer com nós dois. Quero minha Tiana de volta, não te perder de vez.

CATILUX - CHAMAS AO VENTO [DEGUSTAÇÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora