Em um mergulho audacioso no mundo do prazer e do medo, "Mordidas" apresenta uma antologia inovadora de contos eróticos de terror. O livro transporta os leitores a um território desconhecido, onde o prazer é vivenciado em toda a sua intensidade e for...
Amor doentio, até esse não deixa de ter sua beleza!
Ana Paula Balestre
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Ele sempre aparece depois das três horas da manhã, Tereza. Não lembro exatamente quando ele apareceu pela primeira vez, mas sei que eu estava triste e me sentindo sozinho.
Ele vinha em sonho e no começo apenas sorria, e eu o via de longe, no canto do olho, atrás de mim no espelho. Ele deixava pequenos sinais para mim, e ah, como eu adorava.
Com o tempo ele começou a aparecer com mais frequência, e com mais clareza. Tentei contar para a Luiza e ela riu de mim e me chamou de biruta. Até tentei mostrar pra ela uma vez, mas é claro que ela não ia ver ele né? Ele me ama, ele me escolheu. Eu e ele partilhamos alguma coisa.
Mas como eu disse, ele começou a aparecer mais vezes para mim, e com o tempo começaram os toques. Ah como eu ficava atiçado com isso. Um roçar de mão na minha nuca quando eu estava distraído, um carinho nas minhas costas quando eu estava deitado. Então tudo foi ficando mais intenso.
Quando eu sonhava com ele, ele sempre estava de costas. Ah Tereza, mas nos sonhos ele conversava comigo, me elogiava, dizia que eu era bonito e que era só dele. Uma vez ele até pediu pra eu fechar os olhos e me abraçou por trás.
Eu não gostei do cheiro dele da primeira vez. Era ruim, pesado, nauseante. Bobagem a minha, eu adoro o cheiro dele agora, acho que era só impressão. O toque dele era gelado, mas não um gelado ruim sabe?
Depois dos sonhos eu comecei a sentir que ele estava mais atrevido, e adorei. Agora ele me apalpava e deixava a mão descansar na minha bunda, ou então me agarrava por trás enquanto eu lavava a louça e metia a mão por dentro da minha calça. Luiza dizia que eu estava mais aéreo esses dias, que iria me levar pra sair quando tivesse tempo. Minha irmã me amava, mas ela que não entendia tudo e ele sabia.
Eu tentei tantas vezes, insisti, implorei de joelhos, mas a Luiza queria me afastar dele. Ela começou a colocar remédios na minha comida, acredita Tereza? Ele me contou tudo, ele só queria me proteger, como ela não entendia isso?
Então eu tive que fazer isso, foi tão inesperado que eu estava preparando meu sanduíche de manhã quando ela apareceu na cozinha dizendo que me levaria em um lugar. Ele sabia que ela queria afastá-lo de mim, então eu não podia deixar isso acontecer, custasse o que custasse.
Ela me chamou, uma, duas, três vezes, mas eu não respondia. Não consegui Tereza, eu juro, era como se eu estivesse flutuando dentro da minha cabeça e ele tivesse dominado meu corpo. Eu ouvia tudo, a voz doce dele me dizendo que tudo ia ficar bem mas ouvia a voz da Luiza me chamar também, cada vez mais alta.
Quando ela chegou perto de mim, dele, eu vi minhas duas mãos abrirem e fecharem a sanduicheira na cara dela. Ele disse que sabia o que estava fazendo, e eu tive que deixar. Era pro meu bem, e pro dele. Você acredita em mim não é Tereza?
Luiza gritou, gritou muito e por dentro eu chorava, mas não podia ajudar ela, ela queria me afastar dele e ele só queria meu bem. Luiza caiu no chão com a cara em carne viva, o sangue e a gordura do rosto estavam escorrendo pelo pescoço dela quando minhas mãos e as dele começaram a esganar minha irmã. Mas minha querida Luiza era tão insistente, não queria deixar a gente em paz, ela segurou meu braço, ela começou a rezar e então ele teve que usar a faca.
Foi horrível, o sangue dela jorrou pra todo lado. Sabia que um corte na jugular pode matar em menos de dez minutos Tereza? Eu vi no jornal. "O Brutal Assassinato Da Penha", é assim que eles estão chamando. Mas ele não fez nada brutal, ele fez por amor a mim, eu sei que foi.
Chamaram a polícia quando ouviram os gritos da minha irmã, eu escapei por pouco.
Eu não sei se ele vai gostar de saber que eu te contei isso tudo Tereza, mas eu tinha que desabafar com alguém. Estou seguro, num lugar afastado, mas mesmo assim ele tem medo de que me tirem de perto dele.
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