NINGUÉM DESCONFIOU DE NADA. A menina conseguiu passar o recado que queria e ainda voltou para casa no carro de sr. Potter do mesmo jeito que foi. Isso significava que ela iria ter que contar sobre tal travessura para a senhorita Tames em breve. Não antes, claro, de seus amigos a procurarem. Ela sentia que eles iriam fazer isso. Dali a uma semana, voltaria à cidade no local onde marcara para se encontrar com eles. Esperaria ali até o último segundo com toda a sua esperança.
Em mais um dia, na hora da saída, Belinda foi correndo em direção a Lewis e Jessica, que conversavam encostados na grade da entrada da escola.
― Olha o degrau! ― ouviu uma voz feminina, mas foi tarde demais. Esparramou-se no chão igual uma batatinha. Se ralou toda na calçada. Todo mundo riu. ― Além de feia, boba e mentirosa, é desengonçada.
Mas ela só caiu porque uma garotinha abençoada pôs o pé no meio. Francesca.
― Não tinha degrau! ― Bel levantou-se enraivecida. Logo, foi amparada por seus colegas.
A garota de cabelo mechado deu de ombros, ignorando a existência de Belinda e voltando a conversar com seu grupinho.
― Eu acho que odeio ela. ― Resmungando, a loirinha exprimiu sem nem um pingo de compreensão naquele dia, depois de seguir o caminho para o ponto de ônibus ao lado de seus amigos.
― Você está brava, mas não odeia ela. ― Lewis disse.
― Como você sabe? Não está aqui dentro do meu coração!
― Helena, acho que ele quer dizer que odiar é uma palavra muito forte. ― Mesmo de fone e olhos fechados, ao ritmo da música que soava em seus ouvidos, Jessica complementou a fala de seu primo.
Bel fez careta e andou de braços cruzados, chateada.
― Você queria, por exemplo, que ela não existisse? ― A amiga perguntou. Lewis achou aquele questionamento um absurdo, por isso, lhe lançou um semblante crítico.
― Não responda isso, Helena... ― ele aconselhou.
― Queria. ― Prontamente, respondeu.
Menos de cinco segundos depois, arrependeu-se. Parou de caminhar, e eles pararam também.
― Não, não queria. Não queria mesmo! ― Bel começou a ofegar. E depois, pensando em toda aquela confusão de sentimentos e fitando o joelho ralado, pôs-se a choramingar. Acabou ficando de cócoras, escondendo o rosto entre os joelhos. ― Me perdoem por ter dito isso! Bondoso, me perdoe também!
― Fica tranquila ― Jessica foi lá e abraçou-a, ajudando-a a se reerguer. ― Estou tão cansada da Francesca que nem ligo mais para as chatices dela, sabe? Mas sei que você se importa. Acredita que ela pode ser melhor que aquilo, né?
Bel assentiu. Era exatamente isso.
― Vamos seguir nosso caminho, patrulheiras? ― Lewis ofertou seu sorriso reconfortante de sempre, enlaçando o braço no de Belinda e Belinda no de Jéssica. Assim caminharam até cada um seguir seu rumo.
Mais tarde, a menina de olhos coloridos desafiou-se a fazer o que nunca antes tentou: cozinhar. Tinha tido uma ideia mirabolante e precisava de habilidades culinárias para isso. Não queria perturbar a senhorita Tames que passava horas lendo livros e costurando, nem a dona Meredith que já tinha tanto trabalho com a casa. E o Felipe, obviamente, como cozinheiro era um bom mordomo, logo, era melhor ficar de fora.
― Vou limpar tudinho quando acabar ― piscou para os adultos e saiu saltitante, após pedir permissão para usar a cozinha e receber sinal afirmativo.
Seguindo a instrução de dona Mere, pegou o livro de receitas dela e começou a folheá-lo em busca do biscoito perfeito. Encontrou um que pareceu apetitoso só pela foto. Então, com a supervisão de Felipe, começou a bulir na cozinha. Pegou farinha de trigo, manteiga, leite, açúcar e tudo que estava nos ingredientes. E misturou. E depois botou para assar e quando estavam prontos, colocou numa linda cestinha.
Se prestou, ninguém sabe até hoje.
Então, no dia seguinte, ela levou alguns biscoitos para a escola. Cada um vinha com uma cartinha que ela mesma escreveu, citando um versículo. Na hora do intervalo, ela ia colocar na mochila da menina que mais implicava com ela, mas alguém chegou bem na hora.
― Por que está mexendo nas minhas coisas? ― Francesca aproximou-se com olhar acusatório.
― Não, não. Eu só ia p... ― ia dizer que ia pôr o biscoito, mas era segredo. Colocou as mãos para trás, para esconder o que tinha preparado. Se a garota das mechas soubesse que foi ela quem fez, nunca comeria o biscoito e nem leria as cartas.
― Ia pegar o quê?
― Eu não ia pegar nada, fica tranquila.
― Fica tranquila uma ova! Me mostra o que tá segurando aí atrás ― apontou com a cabeça, sem pestanejar.
― Deixa de ser curiosa, criatura. ― Bel deu um sorrisinho sacana para despistá-la.
― Se você não me mostrar, eu vou ver por minha própria conta!
A menina de olhos coloridos gostou do desafio.
― Duvido.
Francesca não estava brincando. Começou, então, a correria de um canto a outro da sala. Derrubaram as cadeiras, levaram tombos, mas nenhuma das duas se rendeu. O corre-corre rendeu até boas gaitadas.
― Quando você corre, parece uma hiena desmamada! ― sem sucesso na corrida, Francesca tentou ganhar insultando a loirinha.
― E você um cururu com diarreia. ― Bel não ficou pra trás.
Sem que elas percebessem, os biscoitos caíram no chão e estavam servindo de munição para uma guerrilha entre elas. Uma jogando biscoito na outra, sujando a sala toda, mas se divertindo. Espontaneamente, elas não estavam brigando. Estavam brincando.
Até que o sino bateu. Bateu na hora que a Francesca jogou o último biscoito.
Ploft. Bem na testa de alguém.
Era só o professor.
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Maratona 3/5
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Através de seus olhos 2
SpiritualLIVRO 2 da série ATRAVÉS DE SEUS OLHOS Depois de tomar uma difícil decisão, Belinda agora tem uma nova vida para viver. Em um novo lugar, convivendo com diferentes pessoas, a garotinha de quase treze anos completos precisa aderir a uma nova identida...