10 - Não, não e não

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Corte Primaveril

Escutei Feyre vomitar no quarto ao lado do meu. Os nossos banheiros eram pegados. Eu queria ajudá-la mas eu não conseguia nem me colocar de pé. Era quase de madrugada. Infelizmente todas as noites sou acordada por pesadelos e lembranças indesejáveis. As coisas tinham mudado, medos que eu já tinha superado ou que estavam controlados voltaram. Medo do escuro, repúdio total do toque, lugares fechados e principalmente do fogo. Cada vez que eu olho para uma tocha iluminando um corredor nesta mansão eu escuto os gritos do meu filho.

Eu só queria esquecer os últimos três anos.

Esperei os meus tremores passarem depois de vomitar as minhas tripas, literalmente. Já se tinha passado mais de três meses desde que nos tornámos grã-feéricas.

Sem conseguir me levantar, gatinhei até à minha cama. Quando senti a sua maciez senti vontade de chorar.

Eu não merecia isso. Eu não mereço este conforto.

Caminhei para a long-chaise a um canto quarto e deitei nela sem cobertor. O cobertor me fazia sentir sufocada, como na prisão mental. Fechei os meus olhos e tentei voltar a dormir sem sucesso.

Real....Eu estou livre. - repeti dentro da minha cabeça. Na maioria do tempo eu sentia-me tão sufocada. Tudo neste corpo é ampliado. A visão perfeita, o cheiro que faz o meu nariz coçar, o paladar, a audição e principalmente o toque. A sensação de passar os dedos nas minhas mechas é quase insuportável. Os sentimentos, emoções são terríveis. Nestes últimos três meses perdi a conta de quantas vezes fiquei deitada no chão segurando o meu peito. A dor das lembranças por vezes faziam o meu coração apertar tanto a ponto de ficar sem ar. Era demais, tudo era demais.

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- Tamlin, por favor. -pedi vendo Feyre começar a perder a esperança.- A aldeia é aqui perto e a gente não quer ficar em casa.

- Não.- respondeu curto.

- Tamlin deixe a gente ajudar. Não aguentamos mais ficar ali dentro de braços cruzados, como duas inúteis.- o meu tom aumentou um pouco. Lucien me olhava como se pedisse silenciosamente para não provocar o seu grão-senhor. Feyre deu um passo na minha frente.

- Nos deixe ir Tam, por favor.

- Não. É perigoso, ainda estamos caçando as bestas da Amaranta, vocês podem se machucar e não tenho sentinelas sobrando.

- Que se dane. Caso tenha esquecido eu venci um rito de sangue. Então que se dane você e a sua opinião.- respondi sentindo o meu corpo aquecer. Sempre que sentia raiva, o que acontecia diariamente, eu sentia o meu corpo aquecer. Como se implorasse para libertar seja lá o que for para o mundo.

- Mia.- Feyre repreendeu. - Tam, os trabalhos de recuperação estão muito lentos e todos estão trabalhando o máximo que podem. Eu e Mia podemos caçar para eles. Pelo menos podemos tirar mais essa preocupação dos seus ombros.

- Não é seguro.

- Seria mais rápido se nós ajudássemos. A cerimónia de Ianthe falou sobre a população ter de pagar tributo para você é em poucos meses. Muitos deles não vão poder oferecer nada. - eu disse.- Todo mundo quer que as coisas voltem a ser como eram antes dela, elas querem....

- Essas mesma pessoas vêm vocês duas, as irmãs quebradoras da maldição como uma benção, um sinal de que está tudo bem. Se acontecer qualquer coisa a alguma das duas o povo se revoltaria. Tudo o que estamos fazendo é criar estabilidade, caso contrário isso se tornaria um pandemónio. Uma confusão que pode ser evitada colocando vocês em segurança.- respondeu Tamlin ganhando um aceno de Lucien.

Corte de terror e sacrifícioOnde histórias criam vida. Descubra agora