06 - Sabrina

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— Acho que vou mudar de profissão.

— O quê?! — Maddy disse, alto demais. Olhei em volta, algumas pessoas no restaurante olharam para nossa mesa, como se fôssemos alienígenas, depois voltaram a prestar atenção na própria vida. — Por quê?

Passei a mão na testa, eu não tinha uma resposta para aquela pergunta. Por que? Eu não sei porquê.
Simplesmente acordei hoje e decidi que enjoei do que eu faço. É perigoso e invasivo demais. E não tem muitas mulheres nesse ramo, o que é bem desconfortável. Quantas vezes já fui assediada por outros paparazzis enquanto estava lá na multidão? Perdi a conta. Acho que vou virar uma fotógrafa freelancer enquanto não decido o que eu de fato quero.
Peguei a taça e bebi um pouco do vinho antes de responder a pergunta.

— Sou nova demais para ficar indo atrás de famosos e tirar foto deles.

Ela me lançou um olhar desconfiado.

— Decidiu isso, assim, do nada?

Tinha sido do nada, né? Não tem nenhum motivo por trás disso.

— É. Do nada.

Ela cortou um pedaço do seu bife enquanto parecia pensar a respeito, ela mastigava devagar ainda com a expressão pensativa no rosto. Fiquei desconfortável com todo esse silêncio e comecei a olhar em volta do restaurante cinco estrelas que resolvemos vir hoje. Não era nenhuma data especial ou havia acontecido algo para que viéssemos para esse restaurante absurdamente caro, só estávamos com vontade de comer em algum lugar que não fosse um fast-food barato ou uma pizzaria de esquina. Não que não gostávamos dessas coisas, pelo contrário, nós amamos pizza e comidas de fast-food, mas queríamos comer algo diferente.
O restaurante era escuro na medida certa, ótimo para encontros. Todas as cadeiras eram da mesma cor de vinho que o carpete e das janelas conseguíamos uma ótima visão da cidade, as luzes e os arranha-céus eram uma vista linda. Voltei a olhar para Maddy quando ela começou a falar.

— Eu acho que tem um motivo, sim. Ou você não quer falar, ou nem você sabe.

Suspirei. Talvez ela estivesse certa, ela sempre está certa. Que saco. Comi o resto da minha massa antes de responder. Quando engoli, limpei a minha boca com o guardanapo e bebi mais um pouco do vinho.

— Acho que é a segunda opção.

Ela também finalizou o seu prato e olhou para mim, com aquele olhar que diz estou sempre certa.

Você não vai largar agora, não antes de ter um emprego fixo. Você pode começar a fazer freelancer, mas também vai continuar sendo paparazzi. Vai entregar currículos em agências, porque eu sei que você gosta de trabalhar com famosos, então essa é uma boa opção. E até que alguma delas te chame para uma entrevista, você não vai parar com o freelancer.

Quando terminou de falar, ela sorriu, contente por ter bolado aquele plano tão rápido.

— É um bom plano.

— É, não é? — balancei a cabeça, concordando. — Vamos pedir sobremesa?

Neguei, a olhando com um sorriso conspiratório.

— Brownie chocolate triplo da May's?! — falamos ao mesmo tempo, animadas.

— Certo, vamos lá, então.

Chamei o garçom e paguei a conta. Em seguida saímos do restaurante e entramos no carro. Maddy dirigiu até a doceira da May, nosso lugar de conforto. Quando entramos, ela estava prestes a fechar, mas corremos até ela e imploramos para ela nos vender dois brownies de chocolate triplo.

— May, por favor — eu pedi, fazendo aquele olhar de gato de botas e as mãos juntas, como se eu estivesse fazendo uma oração. — Você só precisa ir ali e pegar os brownies, não seja má.

Ela me olhava daquele jeito de mãe, ela tinha isso com a gente. Maddy também implorava por brownies. May revirou os olhos e entrou de novo na loja, quando voltou, ela empurrou a embalagem com os brownies para mim e bufou, estendendo a mão.

Sorri, feliz pelo doce, e tirei o dinheiro da carteira e lhe paguei.

— Agora saiam daqui, suas formigas famintas por doce. Tenho que fechar.

— Obrigada. — Disse Maddy.

— Tchau, May.

📷

— Eu acho isso uma grande burrice — Maddy apontou para a televisão.

Estávamos assistindo ao nosso Kdrama favorito, Pretendente Surpresa, e Maddy estava – como em todas as vezes em que assistimos – indginada com a personagem Young-seo por ela ter aceitado o abajur do vizinho, sem nem ao menos conhecê-lo direito.

— Eu sei que seria falta de educação e tal, mas eu não aceitaria esse "presente" nem fodendo — ela fez aspas com as mãos na palavra presente. Eu concordava totalmente com ela, mas vê-la estressada por causa disso é sempre tão engraçado.

Comi o último pedaço do meu brownie e disse:

— Óbvio que não aceitaríamos, mas, sem esse fodido abajur e aquele psicopata pervertido, não teríamos as cenas icônicas que vieram a seguir.

Madelaine se ajustou na cama e se virou para me encarar, seu olhar esperançoso e seu sorriso. Suspirei, já esperando o que estava por vir.

— Se você tivesse que escolher entre o Tae-moo e o Sung-hoon, quem escolheria?

— A Shin Ha-ri.

Ela empurrou meu ombro e revirou os olhos.

— O mundo inteiro sabe disso, mas a pergunta não foi sobre ela.

Tentei pensar na resposta, tentei mesmo escolher um dos dois, mas cheguei a conclusão de que era impossível.

— Não da para escolher. É impossível.

Madelaine voltou a olhar para a televisão e deu de ombros, sorridente.

— Eu escolheria o Sung-hoon.

Talvez eu não quisesse saber o porquê, conhecendo Maddy, deve ser pelo motivo mais depravado possível. Mas o meu espírito é curioso demais, não aguentei.

— E eu quero saber o por quê?

Ela deu aquele sorriso malicioso quando olhou para mim, virou a cabeça de novo para a série e respondeu, sem mais nem menos:

— "Eu vou garantir que você nunca mais esqueça".

Fiquei boquiaberta, mas logo depois comecei a gargalhar.
Era óbvio que esse era o motivo, como eu me esqueci disso? Como eu esqueci que a minha amiga é uma pervertida? Ela é assim desde sempre, eu acho.
Quando éramos mais novas, ela era sempre a primeira a experimentar coisas novas. Ela deu o primeiro beijo; ela foi a primeira a fugir para uma festa; a primeira a tomar um shot de vodka como se fosse água; a primeira a perder a virgindade; a primeira a fumar maconha (isso ela fez com o namorado da época, e depois tentou me convencer a experimentar também, sempre neguei); a primeira a falar sobre bdsm e coisas do tipo. Ela foi sempre a primeira em tudo, e ela fazia com a maior confiança do mundo, enquanto eu, sempre fazia com medo. Sempre com o pensamento de "e se eu me arrepender?", e já ela pensava: "eu não terei outra vida para fazer essas coisas, então para que perder tempo se arrependendo?". E ela vive assim até hoje, romantizando a vida, talvez eu devesse começar a fazer o mesmo.

— Sua puta pervertida! — eu disse, entre risadas. Minha barriga estava doendo e meu olhos lacrimejando. Como eu ri tanto só por causa daquela frase? Sou uma idiota.

Então ela sorriu e voltamos a assistir a série, quando percebi que ela estava dormindo, desliguei a televisão e me abracei a ela, pronta para dormir também.

AURA - SaliviaOnde histórias criam vida. Descubra agora