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Oiii,

Acho que me esqueci de mencionar na introdução, mas tenho um tipo de política pessoal em relação a menção de pessoas "agregadas" aos personagens da história.
  Em sinal de respeito aos familiares dos meninos, os nomes reais destes não serão usados. Então, espero que entendam que os parentes terão outros nomes, o que definitivamente não impede vocês de imaginarem as pessoas reais ou qualquer outra figura que a sua imaginação queira.

Harry notara a presença que se esgueirou para o seu interior assim que chegou em casa. Sua mãe e Aggie estavam descansando no andar de cima; ele estava curvado no sofá, os cotovelos apoiados nos joelhos, as mãos cobrindo o rosto. 

Zilhões de coisas passavam por sua cabeça ao mesmo tempo —  exceto uma, pois era difícil demais pensar nela — mas no meio de tanta confusão, sentia só aquilo. Aquele silêncio ao seu redor, o quanto era alto, o quanto era esmagador. Sentia seu peito se contraindo, sentia algo espalhando-se feito água quente dentro do seu corpo, imergindo e afogando tudo o que tocava. 

O que espreitava dentro de si não era novo, ele notou. Não apareceu ali do dia para noite. Sempre esteve ali, desde o momento em que saiu do consultório de sua psiquiatra após receber alta, desde o momento em que começou a viver. Mas mal fazia diferença àquela altura; tinha começado a viver de novo e tinha aprendido como lidar com as coisas aos poucos. Haviam sentimentos ao seu redor e dentro de si, mais que o suficiente para espantar aquela coisa

Mas houve um momento, em Nova Iorque, anos depois de sua recuperação, que ele encontrou aquilo de novo, sentado ali no canto, despretensioso, como se assistisse ansiosamente, esperando pela hora de entrar em cena. Desde então, estava sempre ali, presente, constante, às vezes mais nítido que nunca, às vezes fraco a ponto de ser um borrão distante no horizonte — e sempre ali. 

Em algumas noites, quando Harry estava estressado demais ou sozinho demais para conseguir dormir, ele deixava que aquilo o distraísse por algum tempo — às vezes por horas — E pensava, pensava, pensava, pensava demais. Era assustador e ao mesmo tempo reconfortante pensar que se entregar àquilo era algo opcional, do qual Harry possuía total controle. Ele sabia que, se quisesse, podia apenas aceitar e se entregar ao seu tortuoso fim, assim como podia, apenas, escolher ficar. 

Até que Harry passou a pensar demais. Até que Harry deixou que aquilo ganhasse um dos papéis principais da peça. Até que começou a dedicar muito tempo olhando para o teto de seu quarto, para a cidade através da janela, para uma taça de vinho, pensando naquilo. Até que os fantasmas de uma possessão passada voltaram a lhe assombrar. Até que ele começou a se contentar com "o mínimo para viver" em alguns momentos da vida (tais quais, ele tentava se convencer, não eram duradouros o suficiente para lhe colocar no fundo do poço de novo). 

Mas ali, depois de voltar do hospital, com sua mãe e sua sobrinha no andar de cima, ambas devastadas; ali, com aquele silêncio ensurdecedor lhe esmagando, ele viu. Viu que não passava de uma bomba, viu que era apenas questão de tempo, para que os fantasmas lhe arrastassem de volta para o lugar que lutou tanto para escapar. 

Era questão de tempo para que Harry voltasse à estaca zero. Questão de tempo para que Harry voltasse àquele limbo entre morte e vida, onde ele apenas existia. 

E agora estava de volta àquilo. Louis trazia lembranças de vida à ele, pois fora ele quem devolveu vida vida vida vida à Harry. Aggie o lembrava de tudo de bom e precioso no mundo, pois ela era vida, sorrisos na mesa de café da manhã e palhaçadas na hora de dormir. Mas ainda assim… Ainda assim existiam todas as outras coisas. Como o seu emprego, largado do outro lado do oceano, como todos os projetos da revista que gerenciava, todos estes adiados como se o antigo Harry realmente acreditasse que um dia os daria continuidade. 

Ever Since New York {l.s}Onde histórias criam vida. Descubra agora