Capítulo 10

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      Nos primeiros dias depois da queda de Casita, os Madrigal ficaram nas casas das pessoas da vila. Eles se encontravam de vez em quando para planejar a planta e a reconstrução de sua própria casa. A magia havia se esvaído, portanto, nenhum deles possuía mais seus dons, o que significava que eles teriam de reconstituir seu lar sem nenhum tipo de vantagem como super-força. Ao menos todas as outras pessoas da vila se ofereceram para ajudar como pudessem.
      Mirabel não tinha falado nem sequer uma palavra para Alma nesses dias e havia tomado para si a responsabilidade de cuidar de Bruno que havia entrado em um coma depois da confusão. Julieta usou esses dias para ensinar a filha tudo o que precisaria fazer para tomar os cuidados necessários. Além disso, a mulher tentava convencer Abuela de que ela deveria se desculpar com a neta, até o momento ela não teve sucesso.
      A reconstrução da casa se iniciou aproximadamente uma semana depois do incidente, o planejamento estava pronto e a família, juntamente com o resto da vila começou a trabalhar praticamente os dias inteiros. O clima entre os membros da família era estranho, Alma não falava muito com ninguém e parecia evitar Mirabel a todo custo, Julieta e Augustin tentavam criar uma melhor convivência entre as duas, mas acabavam não melhorando muito a situação. Pepa, juntamente com os primos e irmãs de Mirabel, não se intrometiam no conflito entre a matriarca e a menina. Félix tentava animar um pouco a sobrinha e tentava engajar em conversas com Alma, a senhora sempre tinha gostado dele e atualmente só sorria um pouco com as piadas do genro. Por fim, tinha a ausência de Bruno, isso era um fato que tinha abalado todos os Madrigal, mesmo aqueles aos quais o homem não era muito próximo. Querendo ou não, o jeito atrapalhando e carinhoso dele animava as pessoas que se davam o trabalho de conhecê-lo.
      Hoje havia sido um dia cansativo na construção, Mirabel tinha ajudado no transparente de tijolos enquanto algumas pessoas fixavam novas vigas em seus devidos lugares. Agora ela seguia para a casa do casal onde estava hospedada, pretendia tomar um banho e iniciar a rotina de cuidados do tio. A menina massageou os músculos doloridos debaixo da água quente antes de se lavar e se enrolar na toalha rapidamente, vestiu um pijama confortável e seguiu para o quarto de hóspedes pouco depois. Lá, ela encontrou Bruno deitado na mesma posição em que o havia deixado, um sorriso triste aparecesse em seu rosto.
      - Oi titio... Como você está? - ela tinha adquirido o hábito de conversar com Bruno, mesmo que ele não pudesse responder.
      Ela se aproximou da cama dele e retirou cuidadosamente o lençol que o cobria.
      - Eu vou começar seus exercícios... Espero que eu não te incomode.
      A menina pegou um dos braços dele e o movimentou lenta e continuamente, sua mãe havia explicado que era importante manter os membros de Bruno exercitados para que os músculos não atrofiassem muito.
      - A reconstrução da casita está indo bem... - Mirabel começou a contar sobre o dia enquanto continuava com sua tarefa principal - Hoje a maioria das vigas foi posta no lugar, se não chover durante a noite poderemos começar a subir as paredes do primeiro andar. Quem sabe estaremos em casa em uns dois meses...
       Depois de finalizar os exercícios, ela procurou por um pano e a bacia de água morna que tinha trazido consigo. Era a forma mais próxima de um banho que Bruno tinha atualmente, a menina o despiu e passou a higienizar as partes do corpo dele que ficavam mais abafadas, isso incluía principalmente as axilas, os pés e a região da virilha. Essa era a parte que a deixava mais desconfortável, mas não tinha muito como escapar. Mirabel concluiu a limpeza o mais rápido que pode, tomando cuidado para não deixar nada úmido e vestiu o tio mais uma vez. Logo em seguida, ela abriu as bandagens para ver como o corte na têmpora estava cicatrizando, por sorte tudo estava bem e o ferimento parecia livre de infecções. Ela refez o curativo com cuidado e agora só faltava comida...
      - Nós sentimos sua falta, tio Bruno... - ela comentou enquanto começava a introduzir uma pequena quantidade de sopa na boca do homem, massageando sua garganta e sempre tomando muito cuidado para que ele não engasgasse - Há quem diga que a pior parte é ficar sem a casa, mas para mim, o que mais cais falta é você acordado... Seu jeitinho tímido e alegre de fazer as coisas, as conversas sobre tudo e mais um pouco que a gente tinha quando estávamos entediados...
      Uma pequenas lágrimas ameaçavam cair dos olhos da menina, ela apenas continuou a alimentar o tio lentamente.
      - Eu não sei se você pode me ouvir titio, mas... - agora algumas lágrimas desciam livremente pelas bochechas dela - Se puder... tenta voltar pra gente, eu estou com saudade.
      Ela apoiou a tigela vazia no criado mudo, afagou os cabelos de Bruno e deu um beijinho na testa dele antes de deitar em seu próprio colchão e deixar que o choro viesse até que ela dormisse. As únicas coisas que Mirabel não viu foram os movimentos dos olhos de Bruno e a pequena lágrima que saiu de um deles, era como se ele quisesse abrir os olhos para falar com a sobrinha, mas não conseguisse.

~ Quebra de tempo ~ Dois meses depois ~

      O dia em que a família Madrigal poderia voltar para casa finalmente chegou. A construção tinha corrido bem, sem grandes imprevistos, o clima estranho entre os membros da família tinha amenizado um pouco, Alma tinha voltado a interagir com o público e parecia estar mais simpática do que era antes. Mirabel estava num processo de melhora, ela ainda se culpava por tudo que tinha acontecido e principalmente pelo estado do tio, mas ela já conseguia não se sentir melancólica o tempo inteiro.
      Todos estavam felizes com a reinauguração da casita, toda a família estava reunida, a última peça, uma maçaneta dourada, fora colocada na porta de entrada e agora as pessoas se acomodavam em seus quartos de tamanho regular. A organização dos quartos na casa não havia mudado, todos se dirigiram para suas devidas portas, com a exceção de que dessa vez, nenhuma delas possuía os desenhos dourados brilhantes e ao entrar, não se encontrava um espaço imenso do outro lado, apenas um cômodo do tamanho que de fato a casa possuía.
      Bruno foi trazido para seu novo quarto, agora não mais uma torre imensa, mas sim um local aconchegante de dois andares. Em baixo ficavam alguns móveis para uma pequena sala de estar e uma escrivaninha e em cima tinha um quarto simples com uma cama de casal e algumas decorações escolhidas por Mirabel. Por falar nela, a menina estava agora ajeitando as coisas do tio nos novos armários, ela já tinha cumprido com a rotina de cuidados dele e só estava finalizando a arrumação para poder começar a do próprio quarto mais tarde. Ela estava prestes a ir embora quando ouviu passos avançarem pela escada que levava ao primeiro andar, pouco tempo depois uma cabeça recoberta de cabelos brancos se tornou visível através do parapeito, era Alma. A matriarca terminou de subir os degraus sem reparar que a neta estava ali, a menina não pode deixar de notar a expressão triste no rosto da avó quando ela olhou para o próprio filho. A senhora continuou seu caminho até o lado da cama e segurou uma das mãos de Bruno.
      - Brunito... - ela começou, mas sua voz falhou por um instante - Estou com tantas saudades de você... Eu sei que não estávamos em bons termos quando tudo aconteceu, mas eu só queria que soubesse que eu me arrependo de tudo o que eu lhe falei, eu estava com medo de perder meu lar novamente. Não é desculpa para tudo o que eu fiz, mas se arrependimento pudesse te trazer de volta, você provavelmente já estaria pulando por aí... - um pequeno sorriso surgiu no rosto dela com o pensamento de Bruno estando bem. Ela parecia completamente perdida em sua mente enquanto acariciava a mão do filho.
      - Abuela? - Mirabel chamou pela avó e, sem querer, acabou a assustando - Descupe, desculpe, não queria assustar...
      - Mirabel, será que poderíamos conversar? - esse era o tom mais amigável que a matriarca já tinha usado com ela - Já passou mais do que a hora de resolvermos essa briga entre nós, não acha?

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