Capítulo 7 - Azul, vermelho e roxo-magia

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"No amor, somos todos meninos. " — Miguel E. Cardozo


Guardo tudo e qualquer necessidade que eu tenha ao ser desperta dos meus pensamentos pela pequena criatura loirinha ao meu lado, sua mãe levantou para buscar bebidas e ele agora me olha com curiosidade, mas que travo meu olhar com ele me dá um pequeno sorriso de lado e estende uma minúscula mão novamente dizendo — Eu sou Noah Ross Bishop — Sério? agora ele vem se apresentar depois de me fazer pagar por seus lanches? — E obrigada pelos doces — Levanto uma sobrancelha em espanto, quem é essa miniatura de gente? Que Diabos, Maya!

Pego sua mão dizendo — É um prazer te conhecer Noah Bishop, eu sou Carina DeLuca. Ele franze a testa antes de dizer — Ross Bishop. Noah Ross Bishop assim como meu pai e minha mãe. Ele me explica como se não fosse nada, apesar dos meus ouvidos estarem extremamente atentos à expectativa dele falar mais sobre os pais, sobre o pai que obviamente  não é o Jack, porque ele é Gibson e não Ross.

Mordo os lábios com tanta força que abro um rasgo na pele. Na tentativa de não usar essa criança para obter mais informação sobre minha ex agora desmemoriada e sobre sua vida em minha ausência, estou quase cedendo e fazendo perguntas a ele, mas antes toco a ferida, sentindo o gosto de ferrugem, nem havia percebido que Maya estava parada segurando nossa bebida e um risada alegre que sai assim que ela coloca os copos na mesa ele corrigi o pequeno — Apenas Bishop, você sabe. Seu pai é o último Ross. O garotinho faz uma carranca se preparando para lutar  e rir novamente —  Não adianta reclamar, foi o que combinamos e o que seu pai decidiu. Ele ainda faz beicinho, mas deixa pra lá e ela volta seu olhar para mim como se sentisse o cheiro de sangue, vê meu dedo manchado e, como todo bom predador, se aproxima. Ergue a mão até minha boca, e inclino a cabeça para trás.

— Deixe-me ver, Carina. Faço que não, e sua mão recua. — Desculpe, só queria ver se você se machucou.

— Não foi nada. Digo e pego minha bebida levando a boca

A verdade é que um calor ruim tomou meu corpo. Quero ir embora já daqui, vê - la falar sobre o pai do menino com tanta tranquilidade me deixou mal do estômago, ela o ama e é por isso que é tão fácil deixar as decisões com ele? Meu relacionamento com ela foi marcado por lutas e diversos "nãos" e opiniões imutáveis, mas agora ela permite que um homem decida por ela?

Quem é essa garota?

Eu estava bem, juro que estava. Tinha seguido minha vida, não tinha nada que estar aqui agora com ela e seu filho que não é meu. Porque sei que sua presença me faz mal, e como uma presa que sou só me resta fugir. Não me importa que esteja agindo como uma covarde, é uma questão de sobrevivência: viva se sair daqui, morra se ficar.

Olho meu rosto refletido da tela do meu celular desligado sob a mesa, olho o rosto pálido que me fita de volta. O que vejo no espelho me desagrada, pois sou novamente a menina  que não sabe o que dizer, só o que sentir. Sempre fui, perto dela, aquela menina ingênua.

— Está tudo bem? ouço - a me perguntar, seus olhos estão mansos nos meus, tentando entender que bicho me mordeu.

— Tudo — minto e para sustentar melhor minha mentira com minha inquietação acabo derramando todo meu milk shake sobre minha roupa e ouço suspiros exasperados de ambos 

Foi tanto uni quanto duni quanto tê. Que coisa mais ridícula Carina DeLuca!

Ela continua em silêncio, olhos nos meus. Por favor lembre-se de mim, droga! Segundos se passam, e sua cara se franze em um riso mal contido e ela diz levantando da cadeira, pegando a criança nos braços — Vamos! — não me mexo do lugar ainda alternando entre olhar a bagunça e olhar para ela, enquanto a garçonete tentar seu melhor para limpar tudo

— Vamos... E pegue minhas sacolas — E com é última sentença ela apenas se vira carregando o filho e vai embora, me apresso em pedir desculpa pela bagunça e em seguir - lá. Em nenhum momento me perguntei porque a segui sem nem ao menos pensar sobre isso, reconheço o caminho e sei que ela está me levando para casa.

Não para minha casa, mais como a casa dela. Procuro não dá importância a essa falha de sinapse que me fez fazer essa associação, principalmente quando fico do outro lado dela, olhando para ela; seu cabelos tão brilhante quanto o sol que queima, seu nariz salpicado de minúsculas sardas charmosas, seus olhos malvadamente azuis.  Ela já não é mais tão forte quanto a do passado, mas igualmente bela.  A forma humana ideal, saída diretamente de um mito.

Caminhamos em silêncio, Noah está muito bem aconchegado a sua mãe, mas assim que passamos pela porta ele se vira pra mim e diz  — Temos uma lareira. 

Meus ombros tombam. Minhas desculpas não valeram de nada porque estou aqui, quero está aqui e não sei o que fazer com isso.

— Não é tão boa quanto a do tio Harvey, mas também é legal — ele  e sua mãe me olham de maneira sonhadora, com uma expectativa infantil que nem me preocupo em pensar em seria esse tio Harvey. — É uma lareira realmente legal.  Me vejo dizendo e lindos sorrisos idênticos se abrirem como uma manhã de sol que muito pouco aparece em Seattle..

De que porra você é feita, Maya? De material refratário?

Depois que ela me leva ao banheiro e me emprestou algumas roupas enquanto sumiu com as minhas, dou uma boa olhada ao redor, vejo as fotos de pessoas que reconheço, outras que não. Algumas em particular me chamam muito atenção, mas me afasto rapidamente delas assim que ouço seus passos volta

— Sua casa é muito bonita — me pego dizendo novamente a frase errada.

Ela sorri. Mas é Noah que parecia alheio a tudo que diz  — Eu sei, não é mesmo? Ambas acabamos rindo, enquanto a vejo caminhar até ele e deixar um beijo em seus cabelos, me olhando ela diz — Você é um charme — abaixo os olhos dos dela e por um segundo me perco em pensamentos como gente se perde em labirintos. Conheço tão bem o resultado da equação eu + ela e ainda assim, olhe para mim aqui agora.

Olho para o dia que cai. Penso em como algumas pessoas são fortes sozinhas. Inteiras em sua estrutura sem tons de dúvidas aparentes — nada de cinza, de marrons. Cores opostas em um espectro, branco ou preto que encerram ou excluem todos os outros tons. E quando se unem, não potencializam, amansam. Acalmam como o café que se mistura ao leite.

Eu sempre fui um tom de azul. Não o cobalto forte dos inícios do dia, ou o intenso do mar. Um azul fraco como o do céu de fim de tarde. Ela sempre foi vermelho. Um magenta feroz e sem nuances; a cor da vida. Sempre me incomodou que juntos ganhamos outra tonalidade. Ela deixou de ter a cor do sangue e eu a palidez de estrelas distantes. Viramos um tipo de roxo estável.

Roxo-magia.

Eventualmente, roxo-tristeza.

Não faça isso, minha parte sensata implora pela última vez, mas já não consigo mais ouvi-la de onde estou.

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