Prólogo

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ISADORA

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Às vezes a gente faz umas escolhas idiotas e fica se perguntando de onde tirou tamanha burrice. Aparentemente, eu sou especialista nisso. 

Duvida? 

Pois deixa eu te contar.

Um dia eu fui na feira da minha cidade e fiquei apaixonada por um cabrito que estava sendo vendido. Eu tinha acabado de iniciar minha vida de adulta responsável que paga as próprias contas e era doida pra ter um animal de estimação, já que minhas mães nunca deixaram. Aí pensei: por que não um cabrito? 

Depois de passar dois dias catando bolinhas de cocô espalhadas no chão da minha kitnet, levei Rodolfo pra morar no sítio da minha avó. O quarto e sala que eu morava era tão pequeno que mal ME cabia, realmente não tinha espaço para mais um ser vivo ali.

Outro dia, anos antes disso, eu estava em uma viagem de campo com meus amigos do ensino médio e o hotel que a gente ficou era próximo a um shopping bem pequeno, dentro dele tinha um estúdio de tatuagem de procedência duvidosa. Era nosso último ano juntos e tava todo mundo meio bêbado, meio emocionado, então quando sugeri fazermos uma tatuagem combinado, todos acharam uma ideia brilhante. 

Não sei como conseguimos sair do hotel sem que os professores vissem, nem como convencemos o tatuador a fazer uma marca permanente na pele de um grupo de adolescentes claramente bêbados, que certamente se arrependeriam dessa escolha, mas voltamos para o hotel com plástico filme enrolado no tornozelo naquela noite. Agora eu tenho uma tatuagem de infinito com mais sete pessoas que eu não falo mais.

Também tomo decisões ruins no meu dia a dia, como na semana passada, quando decidi pintar meu cabelo de lilás justo no dia em que troquei minha roupa de cama. Eram os lençóis branquinhos que ganhei da minha avó quando me mudei para o apartamento que moro hoje com meu irmão, os meus favoritos. No outro dia de manhã, parecia que eu tinha usado a fronha pra coar suco de uva no meio da noite. 

Mas a pior decisão do ano, sem dúvidas, foi a que tomei hoje. 

Roubei o celular do meu maior desafeto, o antagonista da minha vida, a pessoa que eu mais odeio: Miguel Rodrigues. 

E agora não sei o que fazer.

Ah, mas o problema aqui não é ele ter sido roubado — pouco me importa se ele vai ter que ficar sem celular por um dia ou um mês inteiro. O problema é ele saber que quem roubou fui eu. ISSO ele não pode saber de jeito nenhum. Seria humilhante demais.

Encaro a capinha azul-sem-graça do celular em cima do balcão da minha cozinha enquanto decido o que fazer agora. 

Volto pra escola e deixo onde eu achei? 

Mas e se ele ainda estiver por lá procurando? 

Ou eu posso colocar em um pacote e pedir pro motoboy entregar na casa dele! É isso! 

Levanto prontamente para procurar uma sacola de papel, mas lembro que não sei onde ele mora. Volto a sentar no tamborete de madeira e me debruço sobre o balcão.

Miguel consegue ser um tanto imprevisível, às vezes, então não sei bem o que esperar dele se souber que eu peguei seu celular escondido e trouxe para casa. A única certeza que eu tenho é que toda vez que nossos caminhos se cruzam, tudo começa a dar errado. Minha vida vira uma bagunça.

E a minha vida está perfeita agora, sabe? Amo meu emprego, tenho amigos no trabalho que são incríveis incríveis, um apartamento do jeitinho que eu queria e o namorado perfeito. Não quero mudar absolutamente nada. 

Por isso, no momento em que Miguel voltou pra minha vida, eu decidi que dessa vez seria diferente.

O celular começa a vibrar e eu me desespero, ao perceber que esqueci de desligá-lo. Aparentemente, eu seria um fracasso como ladra. 

Pego o celular para colocar no modo avião, mas fico nervosa e deslizo o dedo pela tela sem querer. Percebo que atendi a ligação. 

Merda.

— Alô?

É ele. 

Eu reconheceria essa voz em qualquer lugar.

Mal-te-queroOnde histórias criam vida. Descubra agora