• 04 •

23 5 0
                                    


Seus dedos corriam pelas teclas, mas dessa vez não era sua imaginação.

Mesmo durante a pausa de meia hora dado por sua professora, ele continuava ali sentado. Não queria ver o escurecer da tarde, nem sentir o vento do lado de fora. Tocava distraidamente as teclas que emitiam o som mais agudo, usando uma das mãos. A melodia triste surgia, uma música que havia escutado em algum lugar e treinado outras vezes em outras aulas. Infelizmente, só havia aprendido poucos segundos dela.

Após diversas repetições e outras tentativas de acompanhar as partituras, Changmin se interrompe quando ouve a porta abrir. A professora retorna com um sorriso. Ele nem se deu conta do tempo passando.

ㅡ Vamos retomar? ㅡ pergunta ela, apoiando a mão em seu ombro.

Changmin não expressa reação, mas vira a cabeça lentamente para a olhar.

ㅡ Será que poderíamos... terminar isso mais cedo?

A mulher prende uma mecha do cabelo curto atrás da orelha, levemente surpresa com o pedido. No entanto, suaviza o rosto logo em seguida.

ㅡ Mas é claro. Vamos lá.

Changmin sorri timidamente e recebe tapinhas no ombro. O sorriso logo se desfaz quando ele fita os próprios dedos sobre as teclas, pensando no que havia acabado de dizer. Respirando fundo, ele afasta os pensamentos. Precisava focar, agir mais e pensar menos, mesmo que não fosse algo que fizesse com frequência. Na verdade, ele nem se lembrava da última vez que havia feito algo assim. Mas a leve adrenalina o fazia se sentir bem.


୨୧


Ele usa um esforço contínuo para manter o foco durante todo o caminho, mas estava cada vez mais difícil quanto mais ele chegava perto da própria casa. Changmin aperta a alça larga da bolsa que atravessava seu peito, mordendo o lábio enquanto tentava recuperar confiança.

Ele avista a entrada de casa, mas passa direto.

A frente da casa de Kevin não é muito diferente da sua, exceto que o local onde ele olhava agora não possuía flores por perto. Sua mãe adorava jardinagem, portanto a frente da casa dela tinha de ter plantas e similares para a dar conforto.

Changmin limpa a garganta e encara o botão da campainha. Não, entrar pela frente seria sem graça. Batendo os dedos na alça da bolsa, segue na direção da lateral da casa, a qual é separada da sua própria apenas por uma cerca de madeira. Changmin passa pela primeira janela, e então pela segunda, por onde já havia visto Kevin de longe uma vez. Assim que para na frente dela, vê Kevin de costas, sentado em frente ao piano. Suas mãos estão paradas sobre as teclas e seus olhos estão fechados. Seu peito sobe e desce lentamente, então, cautelosamente, seus dedos delicados tocam uma música suave, comovente ao ponto de fazer o estômago de Changmin receber uma pontada e sua pele arrepiar.

Kevin para de repente.

ㅡ Percebeu que estou aqui? ㅡ Changmin cutuca o vidro. Kevin se vira, surpreso.

ㅡ Parei por instinto.

Changmin aperta os lábios um contra o outro e se vira para se afastar. No entanto, Kevin se levanta e o pede para esperar, correndo até a janela. Changmin para de andar.

ㅡ O que é?

Kevin levanta o vidro e apoia as mãos na base da janela.

ㅡ Achei que iria entrar.

ㅡ Não somos amigos, Kevin Moon.

ㅡ Mas você veio até aqui, não veio?

Changmin aperta a alça na frente do peito e a mão livre se fecha em um punho. Ele fita o rosto calmo de Kevin.

ㅡ Tem razão. Mas não sei por que vim.

Changmin segue pela lateral da casa, dessa vez determinado a voltar para a sua própria e se trancar em seu quarto outra vez. Ao menos lá teria paz, teria seu silêncio de novo. Não precisaria sentir emoções confusas que oscilavam a todo instante. Assim que chega na calçada outra vez, ouve a porta abrir atrás de si, então ouve passos que o seguem. Seu braço é puxado e seu corpo se vira. Em sua frente, Kevin parece sem fôlego.

ㅡ Espera, não vai ainda.

ㅡ O que você quer de mim, afinal? Por que é sempre tão bonzinho assim? O que diabos você quer provar?

ㅡ Eu não quero provar nada. Não estou tentando convencer você de qualquer coisa.

ㅡ Você é insistente ㅡ Changmin diz com a voz séria. ㅡ Prefiro que me deixe em paz de uma vez. Não confio em gente como você.

ㅡ Nem todo mundo têm más intenções, Changmin ㅡ Kevin diz de forma defensiva, quase doce. Seu tom não aumenta em momento algum. ㅡ Eu espero que você perceba isso em mim. Não estou tentando lhe forçar a qualquer coisa, sinto muito se...

ㅡ Ora, pare de se desculpar o tempo todo! ㅡ Changmin explode repentinamente, fazendo Kevin se interromper. ㅡ Já conheci pessoas como você ㅡ diz de forma dura, chegando mais perto. ㅡ Essas histórias bonitinhas nunca acabam bem. Ninguém é gentil apenas por ser.

Kevin endurece o rosto, fitando os olhos alheios que ganhavam um tom avermelhado.

ㅡ Você não conhece todas as pessoas ㅡ declara em um tom baixo.

Changmin mantém a mesma face furiosa, se recusando a desfazê-la mesmo quando Kevin se vira, seguindo seu caminho de volta pra casa. Ele não bate a porta como Changmin espera que ele faça, muito menos retorna para o ferir com algumas últimas palavras. Apenas vai embora, calmo, composto. E sua reação silenciosa é mais incômoda do que se ele tivesse gritado com Changmin. Changmin preferia que ele tivesse gritado.

Sentando em sua cama, sente como se o peso do mundo estivesse sobre suas costas. Changmin leva as mãos ao rosto, esfregando as bochechas para a esquentar. Ou as esfriar.

Se lembrava da sua decisão no passado. Lembra-se da confiança amarga em seu peito quando decidiu perder a fé nas pessoas. Amigos que o ajudaram em seus piores momentos já não estavam mais ali ao seu lado. Ninguém ficou. Changmin estava decidido a não dar mais espaço a ninguém. No entanto, sentindo o rosto queimando contra as palmas, ele já não sabia o que lhe parecia certo.

De repente, tudo parecia errado.

summer heat • kevkyu᠉Onde histórias criam vida. Descubra agora