Missão Arriscada

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— Espere aqui — ele me diz.

— Eu vou também! — insisto ao sair de trás do arbusto.

— Não! Não importa o que o que veja, ou ouça, não faça nada, ouviu bem? Apenas espere por mim aqui, não pretendo demorar.

— Mas Tobe... — vejo-o partir sem me dar a chance de completar a frase. Não estou com frio, mas um arrepio sinistro percorre meu corpo quando vejo Tobe ir na direção daquele depósito sinistro.

Estou em um beco atrás de um arbusto enorme em um vaso de planta. Não passava uma alma viva na rua. Depois da história de toque de recolher as pessoas passaram a ter medo de andar a noite pelo visto.

Assim que Tobe se aproxima dois homens surgem das sombras para abordá-lo. Após uma breve e inaudível conversa, ele entra seguido dos ninjas Mogwai. É minha chance.

Saio de trás da planta e me aproximo próximo ao muro. Caso houvesse mais ninjas olhando de cima eu poderia passar despercebida pelas sombras. Aproveito a porta que deixaram entreaberta e entro sem fazer barulho. Estava escuro e empoeirado lá dentro. Tenho que tapar o nariz para não espirrar. Fico de joelhos e me arrasto pelo chão para me esconder atrás de uma pilha de caixas desorganizadas.

— Espere aqui — um dos ninjas informa Tobe, e os dois saem.

— Pst... — faço baixinho, e é o suficiente para que Tobe me visse.

— O que está fazendo? — ele move os lábios sem emitir som.

— Achou que eu ia deixar você sozinho? Estamos juntos nessa! — respondo do mesmo modo.

Tenho tempo de vê-lo revirar os olhos e voltar a se virar para frente bem no momento em que os ninjas retornam. Não eram apenas dois, havia pelo menos dez vestidos de preto e portando armas. O líder deles entra logo em seguida.

— Tobe! — Muji abre os braços mas não ousa se aproximar — Há quanto tempo não o via por aqui, faz tempo que não vem até a vila. O que aconteceu? Finalmente decidiu usar seus talentos para se juntar a nós?

— Eu tenho mais o que fazer — o ninja rebate.

— Certo, alguém tem que ir buscar o nosso peixe — ele ri e os homens o acompanham — Mas diga, o que o trás aqui? Veio fazer uma visita?

— Quero que deixe o restaurante de fora da lista de devedores.

Muji da outra risada, e os homens o seguem novamente, porém não com tanto entusiasmo. O líder enxuga uma lágrima fictícia de tão bom humor, mas ao notar a seriedade de Tobe, seu sorriso desaparece. O homem avança alguns passos enquanto alisa o bigode espesso.

— E por que eu faria isso? Será porque sente falta da comida? Será que os velhotes do Go-Rong te pediram? Hm... — ele finge pensar no assunto — Ah, Tobe, não me diga que é por causa daquela garotinha que voltou recentemente, qual era mesmo o nome dela...?

— Eu estou pedindo com gentileza, não me obrigue a tomar outras medidas.

— Ou, ou... Você vem até o meu depósito e acha que pode me ameaçar na frente dos meus ninjas?

— Não ameacei — Tobe rebate — Ainda.

— Haha, amarrem ele — Muji da a ordem e se vira para ir embora.

Os ninjas se mobilizam, mas Muji estava perto demais. Antes que pudessem sequer sacar as armas, a espada de Tobe já estava desembainhada e apontada para o pescoço do líder dos Mogwai. Os ninjas observam atônitos e impotentes, enquanto Muji estava imobilizado pelo braço firme de Tobe. O homem que parece ser o segundo no comando saca a espada também e os outros fazem o mesmo.

— Ah é assim que quer jogar, não é? — Muji reclama.

— Quero que atenda esse pequeno pedido, certamente não vai fazer grande diferença no lucro mensal — ele devolve.

— Bom ver que está de volta, Tobe. Podia ensinar uma coisa ou outra a esses inúteis aí. Você é mesmo um assassino, sempre foi, eu ainda me lembro. Tão novo e tão corrompido pelo ódio. Fico triste só de lembrar de todo aquele potencial desperdiçado. Embora me decepcione agora, eu vejo muito de mim em você. Você é como um filho que eu nunca tive.

A respiração de Tobe havia ficado pesada. A atmosfera era tão tensa que não consigo me mover.

— Diz para abaixarem as armas — o ninja diz finalmente.

Muji balança a cabeça, concordando. Os Mogwai guardam as espadas e aguardam novas ordens. Não quero esperar pelo pior, estou prestes a me levantar e impedir um homicídio quando Tobe também abaixa a espada, de maneira tão rápida quanto a pegou. Ele não perde tempo ao empurrar Muji e puxá-lo novamente pela camisa, para que o homem o encarasse.

— Espero que minha demanda seja atendida por bem, caso contrário, eu vou me certificar de que seja por mal.

Muji ri como se fosse a piada mais engraçada que já ouviu, mas a situação estava longe de ser cômica. Tobe solta o líder e se recompõe, afastando-se, certificando que dessa vez estava numa distância segura.

— Vou pensar na proposta, mas se lembre dessa gentileza — Muji ainda ostentava um sorriso — Tenho aliados tão bons e até melhores do que você.

— Você sai primeiro — Tobe rebate — Em sinal de boa fé.

— É claro — Muji alisa o bigode novamente, mas seu sorriso sinistro me faz duvidar da gentileza — Ninjas!

Com uma única palavra, os homens saem do depósito pela porta dos fundos. Muji mantém a pose por mais alguns segundos antes de se virar e ir embora.

— Antes que eu me esqueça... — o líder mercenário diz — Qual era mesmo o nome daquele seu antigo clã?

Tobe não diz nada, mas Muji também não espera pela resposta. O homem apenas vai embora atrás de seus ninjas.

Preciso de alguns segundos para assimilar tudo o que aconteceu. Eu definitivamente não esperava uma reação tão extrema de Tobe, e também não sabia se surtiria efeito. Os ninjas pareciam temerosos mas Muji sorria como se soubesse coisas demais.

Alguns longos segundos se passam, e quando sei que é seguro sair de trás das caixas eu me levanto. Assim que minha respiração normaliza e meu coração se acalma, eu me aproximo do ninja. Tobe matinha os punhos e o maxilar cerrados, encarando a porta do depósito, como se cogitasse ir atrás do Muji.

— Tobe — eu o chamo, tocando seu ombro e ficando na frente dele — Tudo bem?

Seu olhar assassino abaixa da porta até encontrar o meu. Sua expressão séria suaviza e ele apenas assente.

— Vem — seguro em seu braço, mas ele não se move — Vamos sair daqui.

Demora um pouco, mas ele começa a andar. Saímos do depósito abafado para o ar fresco e revigorante da noite, onde a brisa era sutil e calmante, ao menos para mim. Continuo me segurando a ele conforme voltamos pelo beco até chegar a rua deserta. Ali Tobe parece aflito e até desconcertado. Subitamente ele começa a se afastar.

— Pucca, eu...

Não me contenho e o abraço com força. O ninja recua um passo, tenso. Posso sentir sua hesitação e surpresa, mas não o solto. Aos poucos, ele relaxa, e finalmente sinto seus braços ao meu redor. Não consigo pensar em palavras para sequer agradecer por todo o risco que ele correu por minha causa. Aquela era apenas uma forma de tentar demonstrar tudo o que sinto agora, e mesmo assim, abraçada a ele, não acho que é o suficiente. 

Corações Não MentemOnde histórias criam vida. Descubra agora