XVII - Metamorfose

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Após a saída de Kagekao do quarto, um tipo de onda de calor subiu. Janie arrepiou-se por completa, assim também tendo um tipo de ataque de ansiedade iniciado. Dos seus olhos que já foram lindos e brilhantes, só lhe sobrava o olhar de peixe morto e olheiras enormes. Das bochechas que já foram vermelhas desciam lágrimas, lágrimas que começavam de seu olho esquerdo e mancharam o chão de madeira escura. Não conseguia fazer seu corpo se mover, era como um estado de choque. Após alguns momentos das lágrimas que doíam como sangue escorrendo de uma ferida aberta, a jovem só conseguiu-se abaixar lentamente, abaixando sua cabeça e colocando seus dedos dentre o meio de seus fios levemente loiros, que brilhavam junto com a pequena luz do luar que entrava na janela de uma forma ofuscada, assim como a ilusão da alegria momentânea que passara por sua vida por um período tão curto de tempo.

Oh, Splendy, Splendy meu querido. Meu querido amigo que me dava flores, que me fez sorrir e esquecer da maldade do mundo, que me fez sorrir nos momentos em que só tinha vontade de me jogar da janela... Oh, Splendy, o que eu faço? O que eu faço agora?

Eram as dúvidas que giravam em torno da cabeça da garota, que agora sentia uma enorme dor por conta do choro. Era sempre assim, lágrimas ardidas e salgadas descendo de seus olhos... A sensação era como uma faca lentamente abrindo sua pele.

Seus lábios esbranquiçados e secos finalmente liberaram um murmúrio. Após segundos, outro murmúrio, e então, soluços. Soluços breves e secos, que foram só ficando mais e mais altos. As paredes grossas que escondiam vários segredos não puderam liberar suas aclamações de melancolia, dando-lhe a sensação de solidão. Solidão... Não sentia a muito tempo.

A pequena iluminação do quartinho abandonado se foi devido a nuvem a qual impedia que a lua consolace a garota, que lentamente afastou suas mãos magras e geladas de seus olhos. Seus movimentos foram lentos, acompanhados por uma respiração trêmula como sua mão, que soava como... Ódio. A raiva consumiu a garota. Seus antes doces e castanhos olhos estavam trêmulos, avermelhados.

Lentamente, a jovem foi se levantando. Seus joelhos rangeram ao completar o movimento. O estalo de seus ossos raspando um no outro ecoaram pelo quarto escuro. Logo, ela se olhou no espelho do quarto.

- Desprezível. Miserável. - Disse a jovem. - Ódio, rancor, miséria... Miserável. - Repetia ela, raspando seus dentes um no outro, apertando seus punhos. Seus ossos agora eram visíveis, era como se ela fosse só carne e osso. Ódio era a única coisa em seu olhar.

Aquelas lembranças, as lembranças malditas de uma narcisista sofrendo vieram à tona. Aquelas pessoas... Desgraçadas rindo de sua cara, cochichando sobre si baixinho pelos corredores, arruinando sua reputação e fazendo aquelas coisas... Aquelas malditas coisas contra ela. O quarto ficou com um tom pesado, a única coisa que brilhava e era visível para si era o espelho. Não queria olhar. Não queria ver seu reflexo. Seu rosto...

- Quero... Arrancar... Minha pele.

Arrancar sua dor, sua desgraça, seu ódio. A garota começou a esfregar com força suas unhas em seus braços. Offenderman... Ele a fez lembrar de mals bocados no passado. Não poderia lavar sua desgraça e vergonha nem com álcool. Por mais que passasse suas unhas em sua pele, por mais que sangrasse, por mais que pingasse no chão... Não ia embora. Não ia embora. Não ia embora. Aquela sensação, as memórias, o ódio de si mesma, merda! Queria só sumir, mas quanto mais tentava esquecer, mais se lembrava daquelas coisas, mais elas ficavam claras em sua cabeça. As risadas, as brigas, gritaria, Offender.

Então, abruptamente a garota parou. Seu olhar morto lentamente se levantou, assim, encarou-se no espelho. Talvez o que mais doesse fosse saber que a ilusão de felicidade que teve com Splendorman simplesmente iria desaparecer. Nunca mais poderia vê-lo. Nunca.

Não havia outra escolha. Ou perdia sua sanidade, ou era pega por Offenderman. Heh, de qualquer forma iria morrer, não é mesmo? Mas o que seria melhor... - A garota sorriu de canto, se olhando com desgosto no espelho. - Tirar sua própria vida e acabar com a desgraça e a vergonha ou simplesmente ficar mais imunda do que era por uma criatura?

Com seus passos leves como plumas, apoiou-se no baú próximo a janelinha redonda, abrindo-a. A brisa da noite era bela. Tão aconchegante. Seus olhos doloridos confortaram-se sentindo a doce brisa. Parou por um momento. Sua respiração desacelerada, sentindo com um certo cuidado e atenção as carícias leves da brisa fresca. Queria morrer com essa sensação, pois ela fizera a garota esquecer do que aconteceu em sua vida... Por um momento pelo menos.

Prestes a se jogar, foi como se algo a segurasse. Recuou. Foi a pior coisa que havia feito em toda a sua vida. Voltou para dentro. Ficou parada na escuridão do quarto. Dos cortes de seu braço, pequenas gotículas escorreram, manchando mais o chão. Seu olhar cansado fora surpreendido por sua amiga lua, que voltara para lhe consolar.

Janie não era mais a mesma. Andou pelo quarto como que quase flutuando, era como se andasse nas nuvens ou em cima da água devido sua delicadeza para andar. Seu coração? Extremamente apertado. Mas a verdade é que... Não sentia mais nada.

Estava tão cansada e desesperada que seu corpo era guiado, não por ela, mas por algo a mais que estava em si. De alguma forma, conseguira entrar no teto, e então, fora seguindo seja lá o que lhe guiava. Logo, pôde encontrar seu conforto...

Vira ele. Pelo menos de longe, mas o vira. Splendy... Meu querido Splendy... De seu rosto doente lhe veio um pequeno sorriso. Seu coração se encheu, mesmo que ainda estivesse vazio.

Seja lá o que fosse, agora não era mais Janie. Só tinha um desejo. Sentir. Sentir alguma coisa. Assim como Offenderman e Splendorman... Só queria sentir. E a única forma que achara de sentir algo da maneira mais rápido... Era Splendorman. E Janie faria tudo pra ficar com ele, e assim, viver a ilusão de que seu coração vazio estava cheio... Da mesma forma que ambas as criaturas enganava-se diariamente.

Continua...

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