Capítulo 1

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Rio de Janeiro, Brasil
| Por Miranda Diaz.

— MIA, EI.- minha atenção rapidamente se vira para a minha colega de trabalho, a Débora.— Mas em que mundo você está? Estão precisando de você, no quarto 102.

— Perdão, eu estava...— meus olhos abandonam a visão da minha amiga, para o paciente deitado a nossa frente, do outro lado do vidro que separava o corredor do quarto. — Eu acho que ele...não vai suportar.

— Olha, eu sei que é complicado esse momento, todos nós passamos por isso, foi a profissão que escolhemos.— ela toca meu ombro e o acaricia, tentando me confortar.— Ele está sofrendo há dias nesse leito, você e os médicos fizeram o possível para ajudá-lo, mas infelizmente apenas Deus pode decidir se ele viverá ou não.

— Deus.— foi impossível não pronunciar o nome com desdém.— Será que a decisão dele sempre será essa? Levar pessoas inocentes para viver com ele simplesmente porque ele não estava afim de deixá-los viver? Eu vejo essa mesma cena há anos, porém nunca me acostumei, não com o fato de crianças e pessoas indefesas sofrendo, tendo suas vidas interrompidas.

— Por Deus, Miranda, não diga uma coisa dessas.— dei de ombros, retirando minhas mãos dos bolsos do meu scrub.— Me diga qual o motivo de ter escolhido ser enfermeira, então. Pois é isso que já sabíamos que íamos ver, que ter que conviver, saber aceitar e seguir com a consciência limpa de que fizemos o nosso melhor.

— Não sei.— minha visão abandonou o senhor de 87 anos a minha frente mais uma vez, voltando a olhar a minha parceira.— Talvez eu queira tentar consertar ou impedir aquilo que o tal Deus sempre anda fazendo, diferente dele eu tenho vontade em deixar as pessoas viverem.

— Sério, você não sabe o que diz.— ela se vira, me dando as costas. Reparei bem no seu cabelo cacheado ruivo, que tem uma linda definição a ser observada, tão brilhosos que são capazes de serem notados a milhares de distância.

Por uma última vez, olho o seu Rodrigo deitado no leito, quieto, com os batimentos cardíacos fracos. Segundo nossos cálculos, será um milagre se ele passar do dia de hoje. Queria saber se ele sabe que está partindo, se sente algum tipo de luz puxando ele para algum lugar que vamos depois da morte, porém é impossível, seu Rodrigo está dessa forma desde a sua cirurgia. Infelizmente, o câncer de próstata acabou com ele, pouco a pouco, assistimos toda essa trajetória de perto.

Pude sentir meus olhos se marejarem enquanto eu o olhava, então apenas ergui um pouco a cabeça para conter as lágrimas e logo após, caminhei em direção o quarto 102, onde a Débora tinha dito que estavam precisando de mim. Nos corredores, avistei policiais parados conversando um com os outros, não era algo raro de se ver por ali, mas sabia que alguém comprometedor estava por aqui.

Continuei andando até que parei em frente a porta do quarto, avistei pela pequena janela o que havia nela, vendo o leito do paciente cercado de médicos. Suspirei, então toquei a maçaneta e a girei, podendo abrir aquela porta que me dava uma visão melhor de quem estava ocupando aquele quarto.

— Ele tem que ir para o centro cirúrgico agora.— pude escutar o doutor Gabriel exclamar, antes que eu me aproximasse totalmente deles.

— Mas, doutor, ele não terá chance. A bala perfurou o seu pulmão, infelizmente está perdendo muito sangue.— argumentou um dos enfermeiros.

— Não estou perguntando o estado dele, estou mandando que se organizem pois ele irá para a cirurgia. E darei apenas dois minutos para que isso aconteça, o estado dele é grave mas nós tentaremos.— o doutor rebateu, então fiquei ao lado deles e vi deitado ao leito que se tratava de um rapaz, um rapaz baleado.

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