VI - Correntes

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MANSÃO MALFOY, 1979

Lá fora, o clarão de um relâmpago transformou noite em dia por segundos e Kreacher se encolheu embaixo da saia de Narcissa. Ela acariciava o próprio antebraço, a marca era recente demais, ainda ardia e não estava lá por sua total vontade, talvez por isso estivesse fazendo careta no fim das contas.

Uma mão com unhas longas, pretas e afiadas repousou sobre a sua, carinhosamente.

─── Não trate como um incômodo, é uma honra! ── Bellatrix sorriu para a irmã, havia um deslumbre no rosto dela que ultrapassava os limites de uma simples admiração – ou paixão – por tudo aquilo, já soava como insanidade.

Bem, estava sendo injusta em seu julgamento... insanidade era um conceito muito aberto a interpretações na sua família. Narcissa sorriu de volta para a irmã apenas para mostrar um pingo de agrado, nem era preciso mais do que uma leve curvatura para alegrá-la, para Bellatrix era mais do que óbvio que alguém entenderia o tamanho da honra de conseguir a Marca Negra - e ainda por cima estar recebendo o Lorde das Trevas em sua própria casa! Que bela honra!

Queria que aquilo começasse logo, para que assim acabasse de uma vez. Queria ficar sozinha em sua própria casa, tendo como única presença inconveniente Lucius possesso porque Rabastan secou o estoque de bebidas de novo; não odiava seu marido, havia uma boa cumplicidade entre os dois.

O último membro enfim chegou, atrasado e ensopado. Os olhos de Regulus estavam tomados por uma tempestade que o assolava por dentro, o deixava melancólico e revoltado, mas ninguém parecia saber o porquê, apenas que há dias não se mostrava contente com algo. Bellatrix olhou para o primo com um leve tom de censura, aquele atraso era desrespeitoso.

─── O Lorde das Trevas está impaciente. ── ela ralhou.

Regulus passou pelas duas ainda encharcado, reprimindo os espasmos causados pela chuva gélida apenas para manter seu queixo erguido e a postura imponente. Ele tirou as luvas de couro e as jogou em uma escultura que menosprezou por ser "extremamente medíocre, feita com o propósito de chacoalhar uma pilha mal gasta de galeões em forma de mármore" desde o dia em que Narcissa casara com Lucius.

─── Que ele aprenda a ter mais paciência, ou então, na próxima vez, que marque essas malditas reuniões em um horário decente. ── o garoto retrucou com a voz áspera. Algo estava acontecendo, mas Narcissa não queria se meter mais do que o necessário nisso tudo.

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Narcissa girava um pequeno broche por baixo da mesa, feito de uma bijuteria barata que imitava ouro – Draco recordou já ter visto esse pequeno acessório entre as joias de sua mãe, mas agora estava tão descascado que ficou surpreso em saber que algum dia aquilo teve cor e brilho –, ela parecia repetir o movimento em busca de algum tipo de conforto.

"... e julgo ser interessante que investiguem a nova auror. Emmeline Vance."

A atenção da jovem Cissa foi para a reunião de volta, ela apertava a bijuteria enquanto reforçava os escudos de oclumência, sua cabeça erguia devagar para mascarar a urgência que tomara seu peito.

─── Milorde, se me permite... ── Lucius inclinou a cabeça para frente, sereno, exalando arrogância ── creio que as vitórias recentes dela tenham sido mera sorte de principiante. Está com energia e disposta a mostrar um desempenho excepcional aos colegas, logo esse gás irá acabar.

O líder parecia ponderar o que ouvia, não muito satisfeito com o argumento. Os dedos de Narcissa já tremiam com a força que usava para apertar aquela bijuteria, um silêncio pesava na mesa, porque não parecia ser algo fácil de contornar, Lucius parecia estar esperando uma brecha para que pudesse se oferecer para vigiar Vance sem que sua iniciativa semeasse alguma paranoia em seu mestre, mas todos pareciam ter o mesmo receio ali, ninguém se manifestava.

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