astrologia

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Uma vez eu conheci uma menina que carregava pedras no bolso.

Ela vestia saias longas e usava colares coloridos, cheirava a incenso e, as vezes, gostava de tomar chá nos intervalos da escola. Ela usava pulseiras de graveto e guardava flores na mochila, tinha um andar mágico, gracioso, como uma fada.

A menina que carregava pedras no bolso e falava sobre como a energia a sua volta afetava tudo e todos. Soube que, depois da escola, ela foi cursar psicologia, em uma cidade bem próxima da em que nasceu, mas que não consegui guardar o nome na memória.

Lembro de aprender uma coisa ou outra enquanto a ouvia falar, eu gostava de como ela falava em um tom calmo e doce, mas, ao mesmo tempo, era perceptível o quanto se animava ao falar do que gostava. Ela perguntava para todo mundo, qual seu signo? Se eu me lembro bem, ela era de capricórnio.

Aprendi a fazer meu mapa astral no meio da aula de matemática, a professora estava escrevendo no quadro e a menina que amava astrologia se virou para trás para conversar um pouco. Ela e suas amigas sentadas um pouco a minha frente, riam enquanto preenchiam as informações do site para descobrir o signo de cada planeta. Mais pessoas foram entrando na conversa, até que o nome do site chegou em mim.

Lembro que, naquela época, ninguém pareceu entender meu mapa astral, me senti como se eu fosse a única que não fazia sentido. Só que, na realidade, nenhuma daquelas pessoas me conhecia de verdade. Eu era fechada, contida ou, como a menina da astrologia diria, minhas energias eram muito voltadas para dentro de mim.

Lembro dela explicando um pouco sobre os planetas e astros, ela falava com um sorriso no rosto, seu cabelo vermelho escuro, muito longo, estava preso com um lápis em um coque frouxo. Ela tinha uma pedra ametista nas mãos. A ametista é uma das que eu achava mais bonita, o tom roxo me chamava atenção, por ser uma das minhas cores preferidas.

O cristal ametista traz proteção e espiritualidade. Lembro que ela dizia que ajudava a despertar sua intuição, por isso o deixava por perto quando pegava o Tarot para fazer as tiragens de suas amigas. Eu adorava observá-la fazendo isso, a forma como a pessoa que fazia a pergunta esboçava uma surpresa genuína, como se ela tivesse lido sua mente, soubesse cada detalhe de sua vida.

O Tarot sempre foi algo que me fascinou, embora eu não saiba o suficiente para tentar eu mesma fazer uma tiragem. Eu gosto bastante da carta "O Louco" ou "The Fool", parece estranho, mas é como se eu sentisse uma certa conexão com essa carta, lembro de pesquisar o significado dela várias vezes depois que a vi no baralho, nas mãos da garota.

"O Louco" simboliza busca por liberdade, o início de uma nova aventura, ele representa a espontaneidade do desconhecido e sempre achei isso fascinante. O desenho da carta varia de baralho em baralho, mas eu sempre gostei da versão que mostra uma pessoa olhando para o céu, parada na beira de um penhasco, como se a qualquer momento ela fosse cair, mas nem sequer havia notado isso ainda.

No Tarot, a carta do louco é associada ao número zero, na numerologia, significa infinitas possibilidades. Pode ser interpretado como o início de algo, de uma vida mais livre ou até mesmo arriscada ou corajosa. É como se a pessoa na beira do penhasco se perdesse em pensamentos sobre um futuro melhor, olhando para cima, querendo crescer, mas, mesmo assim, ela vai acabar caindo do penhasco assim que der o próximo passo.

Mas enfim, voltando para a ametista, sua energia tenta purificar o ambiente e aumentar sua energia vital, pelo menos segundo a menina da astrologia. Ela estava segurando justamente esse cristal enquanto me falava sobre o que significava ter o Sol em gêmeos. Também me falou sobre meu ascendente em leão e a lua em escorpião.

São todos signos... Como posso dizer? Intensos. Hoje, que me conheço um pouco melhor... Não, eu não diria que me conheço, diria que me entendo mais, porém, ainda estou longe de me conhecer completamente. De qualquer forma, hoje eu me identifico um pouco mais com partes do que esses signos representam, consigo ver um pouco melhor como cada um deles funciona em minha personalidade. Eu gosto de acreditar nisso, parece que coloca um guia em sua vida, uma das milhões de formas que uma pessoa pode usar para se auto descrever.

A menina da astrologia gostava das estrelas e de como cada planeta regia um signo, ela tinha decorado todas as características possíveis e tenho certeza que se você pedisse para que ela adivinhasse qual era seu ascendente, ela saberia.

A menina da astrologia e dos cabelos vermelhos, que falava comigo só de vez em quando, na saída da escola, quando esperava sua hora de ir embora chegar. Ficávamos sentadas lado a lado em um dos bancos perto do estacionamento. As vezes, em completo silêncio. Em outros momentos, ela me fazia perguntas.

Ela me disse uma vez que era o tipo de pessoa que, de vez em quando, não conseguia ficar quieta, tentava criar qualquer assunto para que falássemos sobre algo. Ela me perguntou meu filme preferido, meu livro preferido, uma música que eu gostava. Ela também me recomendou Midsommar (que eu não assisti até hoje) e disse que se identificava com a personagem de Saoirse Ronan no filme Little Women.

Ela era uma das pessoas com a personalidade mais interessante que eu conhecia dentro da minha sala de aula. Não éramos muito próximas, mas eu a achava gentil, era sempre legal comigo, mesmo que eu fosse quieta, na minha. As vezes me pergunto se teríamos sido mais amigas se eu tivesse permitido que ela se aproximasse, se eu tivesse tentado, se eu tivesse parado de me fechar e acabado com a muralha tão alta que eu havia construído ao meu redor.

O ensino médio foi um período ruim, mas hoje sei que as coisas passam. Tudo pode mudar, melhorar. Enfim, acho que me perdi na linha de pensamento, eu deveria estar falando sobre a menina da astrologia e na forma como ela, mesmo postando frases melancólicas no twitter, mantinha sempre um sorriso calmo no rosto e parecia tão apegada a suas amigas.

Falar sobre a forma como os bolsos da calça larga e colorida que usava em alguns dias estavam cheios de pedras e cristais, mas, mesmo assim, ela andava com tanta leveza. A forma como seu cabelo pintado chegava até ao fim de suas costas, mas parecia tão bem hidratado em todas as partes.

Será que te verei mais uma vez garota da astrologia? Provavelmente, você não parece tão longe, sua energia ainda chama atenção em pequenas fotos que vi pessoas te marcando. Será que um dia vamos conversar de novo e você vai perceber que o mapa astral que você leu pra mim, tanto tempo atrás, na verdade, fazia sentido sim? Talvez. Talvez eu te veja mais uma vez quando as estrelas estiverem alinhadas e a lua quiser conversar.

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