Uma vez eu conheci um garoto complicado.
Na realidade, uma vez um garoto complicado me conheceu e, quando ele se aproximou, eu me vi caindo num abismo de sentimentos que eu nunca tinha sentido antes.
O garoto complicado tinha covinhas nas bochechas. Ele era alto, tocava violão e escrevia letras de música. Ele amava cinema e assistia muitos filmes. E eu já escrevi tudo isso antes. Mas ele tinha muitas histórias pra contar, alguns traumas acumulados e sentimentos complexos como qualquer outra pessoa normal.
Ele falava difícil e me deixava maluca tentando entender como funcionava a comunicação falha de alguém que estudava comunicação. Eu o achava muito legal, esforçado, uma pessoa incrível, mas o garoto complicado também era só um moleque jovem tentando entender o mundo. Porque dá pra ser tudo isso ao mesmo tempo, eu via todas essas partes dele e gostava de todas elas.
O garoto complicado tomou várias de minhas palavras e de meus poemas, em muito pouco tempo, pra falar a verdade. Foram só alguns meses que acabaram muito mais rápido do que o esperado. O garoto complicado me remete a cor azul porque é a cor da caneta que escreveu muitas palavras que nunca foram ditas, só escritas.
O garoto complicado que eu deveria ter sido só amiga, porque acho que teria sido muito melhor, mas não sei se eu conseguiria.
O garoto complicado que, quando disse que queria que fosse simples, eu quis dizer pra ele que o único que complicava era ele. Eu quis dizer que eu teria simplificado qualquer coisa que ele pedisse, mas ele não queria de verdade. O garoto que complicou tanto meus pensamentos que já eram completamente bagunçados que eu nem sei mais o que quero ou o que eu queria ou o que eu deveria querer.
O garoto complicado que eu ainda gosto e não sei se vou parar de gostar.
O garoto que, mesmo cheio de complicações, foi um bom amigo quando eu precisei, pelo menos por um tempo. O garoto que tinha conversas longas de madrugada como se não precisasse acordar cedo no dia seguinte e que não julgava a forma profunda demais ou exagerada demais que eu usava pra falar da vida.
O garoto que não foi embora, que eu acreditei que nunca iria e que eu quis muito que não fosse, mas que eu tive que deixar ir. O garoto que eu superei uma vez, fugindo dele pra estar com outra pessoa e então, uma semana depois de eu terminar, ele me beijou de novo e fez tudo voltar. E eu não fico realmente com raiva disso.
Porque o garoto complicado me fez ter certezas e eu voltava para as dúvidas dele sempre que queria sentir essas certezas de novo. Eu tinha essa esperança de que, em um futuro distante, o garoto complicado se descomplicaria e a minha mente parasse de criar intrigas.
O garoto que eu sabia muito bem que ia me machucar e eu permiti que ele fizesse. O garoto que, mesmo me fazendo sofrer, ainda gosto, nem foi tão ruim assim, já me fizeram sentir pior. O garoto que já deve ter lido cada bobeira que eu escrevi, cada humilhação, mas não sinto vergonha, talvez só um pouco de culpa por ser tão complicada quanto ele.
O garoto que me fez entender a diferença de "quero sentir" e "realmente senti". O garoto que foi de "você é um dos meus melhores amigos" para "não quero que você vá embora mesmo sabendo que nunca vai sentir a mesma coisa que eu" de um dia pro outro. E então ele foi embora mesmo assim, na verdade, eu fui, porque eu não conseguia mais manter.
Só que eu sinto falta do garoto complicado, da minha própria forma enigmática. E tá tudo bem, quem sabe ele volta pra perto, algum dia. Ou não. Eu me colocaria de volta em suas dúvidas para ter meros segundos da minha certeza? Provavelmente sim, mas isso não parece muito saudável.
O garoto complicado que provavelmente vai ler isso e, infelizmente, não vai comentar nada sobre. O garoto complicado que escreve roteiros e que me fez ter vontade de assistir seus filmes. O garoto complicado que um dia vai ser alguém no mundo e eu espero que eu seja também. O garoto complicado que gostava de conversar, as vezes sobre assuntos muito complicados e as vezes sobre alguma coisinha boba.
Um garoto muito difícil de esquecer. Um garoto que eu queria de volta. Mas o garoto complicado nunca vai se descomplicar porque ele é uma pessoa normal, assim como eu.
O garoto complicado que apareceu do nada e foi embora do nada e que não me arrependo nem um pouco de ter conhecido. O garoto que conquistou minha admiração, minha curiosidade e meu coração e agora estou tentando expulsar da minha cabeça, e tá tudo bem.
Será que te verei mais uma vez garoto complicado? Será que um dia vou te perguntar mais umas vinte perguntas que ficaram esquecidas? Será que um dia a gente se encontra de novo, sem tanta complicação? Talvez, talvez quando você já conseguir dormir melhor e eu já tiver aprendido a gostar da chuva.