Uma vez conheci um garoto que fazia truques de mágica no intervalo da escola.
Ele tinha um kit de mágica bem simples, um baralho de cartas, uma moeda e um sonho. Ele também era bem carismático, eu diria. Não lembro todos os detalhes das mágicas, mas me lembro de estar sentada com algumas amigas em uma das mesas em frente a cantina e, quase todos dias, ele e outros dois amigos saiam da sala de aula para o intervalo e iam naquela direção.
Talvez fosse um pouco planejado, confesso, estar ali logo no caminho, bem perto da sala deles, mas, sinceramente, só queria novos amigos. Eu queria conhecer novas pessoas, eu estava no meu último ano do ensino médio e ainda não estava satisfeita com nada, isso estava me deixando desesperada.
O menino mágico parava em frente a mesa branca de plástico e tirava o baralho do bolso com um sorriso. "Querem ver uma mágica?", ele dizia. Então uma de nós escolhia uma carta e, de algum jeito, ele sempre acertava qual era, ou então fazia uma moeda desaparecer, como naqueles truques clichês de tirá-la da orelha de alguém logo em seguida.
Lembro que falávamos sobre ele tentar tirar um coelho da cartola algum dia, mas ele nunca conseguiu levar um coelho para a escola e nunca o vi usando nenhum chapéu a mais do que um boné azul marinho que usava de vez em quando. Me lembro de como o chamávamos de mágico e comentávamos sobre os truques depois.
Porém, nunca decorei o nome dele, nunca soube nenhum detalhe pessoal ou qualquer outra coisa sobre sua personalidade além daqueles pequenos momentos na hora do intervalo. Momentos em que ele fazia um truque de mágica simples que provavelmente havia pesquisado na internet no dia anterior ou lido em um livro infantil quando criança.
Mesmo assim, o menino mágico fez parte da minha vida na escola durante alguns meses e me lembro perfeitamente de seu sorriso quando nos via rir no final do truque. Lembro como ele sorria ao pegar a carta exata que minha melhor amiga havia escolhido e mostrar com orgulho a mágica que havia feito.
Eu podia não ter decorado o nome dele, mas ele sabia o meu e lembro o quanto isso me deixou feliz por pequenos segundos enquanto eu caminhava por um corredor da escola. Eu estava indo até o banheiro e ele e aqueles mesmos meninos com quem ele sempre andava passaram por perto e ele disse oi pra mim, falando meu nome, com todas as letras. Foi quando eu percebi o quanto é bom ouvir o próprio nome.
Na verdade, é algo que realmente existe, essa sensação boa em ouvir alguém falando seu nome. Lembro de pesquisar sobre isso no ensino médio, é um efeito automático do cérebro que acontece ao ouvir o conjunto de sons associados diretamente a você. Nosso próprio nome é a palavra que mais ouvimos sobre nós mesmos, é como uma afirmação de que o que vem a seguir nos diz ao respeito.
Quando somos chamados, muitas vezes nem esperávamos ouvir nossos nomes, as vezes ficamos surpresos por ouvi-los, é algo que sempre me chamou atenção. Lembro de ler pesquisas sobre isso na internet, lembro que cientistas diziam que o som do próprio nome nos deixava automaticamente mais atentos, como se fosse o suficiente para te deixar pronto para interagir com o mundo.
Se sentir chamado, se sentir visto, se sentir pronto, sempre foram coisas que eu tive dificuldade, uma grande insegurança em ser relevante o suficiente em minha própria existência.
É um pouco esquisito, eu sei, mas as vezes eu esquecia de mim mesma, as vezes eu falava meu nome e me perguntava quem era aquela pessoa. Mas ele sabia quem era, ele sabia que aquela era eu. E isso me deixava bem.
Como é estranho como um simples oi pode fazer o dia de alguém, não? Como uma pessoa só chamar alguém pelo nome pode fazer esse alguém se sentir melhor, alegrar pelo menos um pouco até em um dia que estava sendo péssimo, como quase todos durante meu ensino médio.
Enfim, eu deveria ter decorado o nome do menino mágico. Só que eu me formei e nunca mais o vi, assim como o menino da astronomia, que também fazia parte do grupinho.
Me pergunto se ele continuou com os truques de mágica, me pergunto se era uma coisa que ele realmente gostava ou se era só um simples hobby que foi completamente abandonado assim que ele enjoou disso.
Me pergunto se existiram outras meninas sentadas naquela mesma mesa branca do intervalo que viam aqueles mesmos truques. Me pergunto se o menino mágico e os amigos continuaram andando juntos, se eles realmente eram próximos ou se foi algo que eu inventei na minha cabeça.
Eu faço bastante isso, inventar grupos de amigos, inventar conexões entre as pessoas, as vezes eu esqueço que algumas pessoas só são colegas e nada mais profundo do que isso. Mas não é triste? Quer dizer, eu entendo, é normal não conseguir uma amizade fantástica com todo mundo, nem todos conseguem ser seus melhores amigos, mas... Dá vontade.
As vezes eu tenho esses pensamentos malucos de que gostaria de ser próxima de absolutamente todas as pessoas do mundo, só para entender tudo. Eu queria poder chegar em qualquer um e perguntar o que a pessoa quis dizer com um tweet que postou na semana passada ou perguntar o que quer fazer no futuro, qual suas paixões, qual seu personagem literário preferido ou se você fosse um animal, qual seria?
Enfim, voltando para o menino mágico, eu também gostaria de fazer todas essas perguntas para ele. Além de querer que ele me ensinasse como fazer os truques, me contasse como os aprendeu e me mostrasse detalhadamente como conseguiu o carisma que tinha para chegar até nossa mesa e começar um show de mágica tantas vezes.
Mas será que te verei mais uma vez garoto mágico? E será que se eu te ver de novo você vai sequer lembrar dessa sua fase de mágico do ensino médio? Será que ainda vai saber fazer desaparecer uma moeda entre seus dedos? Talvez. Talvez eu te veja mais uma vez quando tiver uma cartola e um coelho.