bêbado

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Uma vez conheci um garoto e o vi vomitando bêbado em um balde.

Ele não estava falando nada com nada e eu também não estava em meu momento mais sóbria. As palavras saíam de sua boca de forma desconexa e somente pequenos detalhes podiam ser entendidos, ele não estava chorando, mas sua voz tinha uma mistura de tristeza e raiva.

Lembro que ele soltava um nome específico várias vezes, um nome de garota, mas que eu não reconheci de primeira. Primeiro, ele parecia estar tentando contar uma história. Seu amigo, ao seu lado, olhava para o balde vendo se o objeto continuava no lugar e concordava vagamente, como se já tivesse ouvido aquilo milhares de vezes.

O garoto bêbado continuava falando, mesmo assim. Me pergunto se ele achava que suas palavras estavam saindo completamente compreensíveis. Provavelmente sim, na verdade, tenho certeza que sim, já fiquei tão bêbada quanto e sei que, mesmo falando nada com nada, a bebida te faz achar que cada pensamento faz o total sentido, multiplicando seus sentimentos e criando extremos em sua história.

Depois de alguns segundos tentando assimilar o que ele estava tentando dizer, eu entendi que ele estava desabafando sobre uma garota. Dizendo coisas que compreendi depois que tinham um sentido magoado e um pouco teimoso, como se ele não pudesse ficar com ela por algum motivo. Lembro que, depois, quando contei isso para um amigo meu que o conhecia melhor, ele me disse que o nome daquela garota era familiar.

Alguns meses depois, eu ouvi o nome dela mais uma vez quando descobri que o melhor amigo do garoto bêbado estava namorando, com ela. Bom, isso explicaria algumas coisas, mas eu posso ter inventado tudo isso na minha cabeça, minha memória criando histórias e preenchendo furos.

Eu vi o menino bêbado mais de uma vez mas, naquele dia do balde, foi uma das vezes que eu realmente olhei pra ele. Ele era um garoto que me passava uma sensação boba, superficial, mais um homem como qualquer outro. Eu só o vi em festas e cheguei a beijá-lo uma vez, em um momento aleatório de minha vida universitária, mas o dia em que o vi vomitando em um balde foi o dia que me fez querer escrever sobre ele.

O garoto bêbado segurava o balde em seu colo como se ele fosse perdê-lo e sua voz tinha tanto sentimento, queria realmente ter entendido o que ele estava tentando expressar naquele momento. Lembro que ele estava sentado com o amigo no sofá do lado direito e eu estava sentada no outro, no meio, ao lado de um garoto desmaiado, que eu tinha levado para dentro porque estava passando mal.

Lembro que meu celular estava carregando, com um carregador emprestado e que eu estava "sozinha"(sem nenhum amigo próximo), na sala de uma república universitária, em um pós festa, esperando ter bateria o suficiente para pedir um uber.

O garoto bêbado vomitava e falava sem parar. Como eu disse no início, eu também não estava o exemplo de sobriedade e lembro que, quando fui ver o quanto de bateria tinha em meu celular, derrubei a caneca que estava em meu colo, criando um barulho ensurdecedor para pessoas bêbadas que sentiam tudo ao extremo. O garoto bêbado disse meu nome, em reclamação, eu nem tinha certeza que ele sabia quem eu era.

O garoto bêbado que, supostamente, estava apaixonado pela garota que seu melhor amigo começou a namorar meses depois. Talvez seja muito coisa de filme, talvez eu tenha realmente inventado toda essa história. Eu não conhecia muito sobre o garoto bêbado, nem sobre seu melhor amigo, muito menos sobre a garota.

Lembro que, no fim, pouco antes de eu ir embora, o garoto bêbado se levantou e percebeu que aquele balde que estava segurando como se fosse sua maior salvação não tinha fundo. Furado e deixando todo o vômito cair no sofá, o balde acabou imediatamente jogado no chão e o garoto bêbado desapareceu no segundo andar depois de tentar sair da casa e perceber todas as portas trancadas.

Eu fui embora da festa com essa memória aleatória de um garoto bêbado que me desenvolveu essa história. Fui embora da festa com a inspiração para um texto sobre um garoto bêbado, um balde e uma voz cheia de tristeza, raiva e, talvez, medo? Um garoto bêbado que era tão humano quanto qualquer um.

Será que te verei mais uma vez garoto bêbado? Será que vou te encontrar de novo naquela mesma sala após mais uma festa? Será que um dia vou saber se toda essa narrativa maluca era verdade? Ou será que saberei a realidade do que você estava tentando dizer enquanto vomitava em um balde? Talvez nem tenha sido nada tão profundo afinal. Mas talvez eu te veja de novo, esbarrando em você mais alguma vez em uma festa.

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