Capítulo 5

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         -- Quantas bolas? – a atendente da sorveteria pergunta.

         Theo olha para mim esperando uma resposta, enquanto pega sua carteira no bolso do seu moletom do time de lacrosse. Me pergunto por quê ele saiu do time, afinal.

         -- Você tava falando sério? Olha, eu posso pagar meu sorvete. – digo e coloco a mão no bolso de trás da minha calça jeans para pegar minha carteira.

         Ele impede meu braço na metade do caminho e diz:

         -- Ei, cadê seu espírito esportivo? Já disse que compro sorvete pros perdedores.

         -- Se é assim, vou querer 4 bolas então.

         Tudo bem, até eu sei que era muito, mas é minha resposta, mesmo sem estar com tanta fome assim. Segui um impulso. Nunca algum impulso repentino vindo de mim tinha bons resultados, mas que mal muito sorvete poderia fazer?

         Peço três de chocomenta e uma de morango, e ele duas de capuccino. Então, vamos nos sentar em uma mesa do lado de fora, que dava para a rua e uma praça.

         -- Ok, então você gosta muito do sabor verde.

         -- E você do marrom.

         Cada um olha para sua taça e dá uma colherada.

         -- Capuccino. – ele diz confirmando.

         -- Chocomenta. – completo.

         Observo o movimento da rua, enquanto como. O barulho dos carros que vem e vão, uma senhora passeando com um cachorro quase da mesma altura que ela, crianças brincando de luta de espada com gravetos e ouço a fofoca por telefone de uma mulher em algum lugar por aqui perto - sabe, superaudição. Sinto falta de andar na rua e conseguir notar esses detalhes. Parece que sempre tem algo maior e mais urgente acontecendo, que merece mais atenção. Às vezes preciso ficar me lembrando que ainda sou um adolescente.

         Por um momento, até me esqueço que estava tomando sorvete com Theo. Assim, percebo que estávamos em silêncio esse tempo todo. Sem seus clássicos comentários irritantes e, até mesmo, sem nenhuma necessidade de falar. Muitas vezes tenho que me esforçar para continuar uma conversa, porque gosto do silêncio e gosto de ficar na minha.

Mas, por incrível que pareça, me senti... confortável ali. Sem pressões. Sem o mundo acabando.

         -- Se você fosse um animal, qual seria? – pergunto, sem pensar muito.

         -- Do nada?

         -- Sim, e não me faça arrepender de ter perguntado.

         -- Ok. – ele parece pensar. - Ok, nós literalmente meio que já somos um.

         -- Fale por si mesmo, coyote. Eu ainda fico no meio.

         -- Tá certo, Liam, O Mais Humano. – revira os olhos. – Será que não é, na verdade, "O Mais Sem Sal" porque nem fazer a transformação completa você consegue?

         -- Tá feliz por poder correr pelado no meio da floresta?

         -- Pode rir o quanto quiser, mas é um dos grandes benefícios.

         -- Pensa um dia ser mordido do nada e hoje ficar correndo pelado na floresta. – brinco.

         -- Exceto que comigo foi diferente. – ele diz e logo me arrependo do que falei. - Troca a mordida por agulhas e bisturis.

Do Outro Lado da Porta de Uma Camionete EnferrujadaOnde histórias criam vida. Descubra agora