Capítulo 23

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(POV do Theo)

         Já fazem umas 3 semanas que eu e Liam estamos saindo. Fala isso para o Theo de meses atrás, que ele, provavelmente, iria dar risada. Fala para ele, também, que ele está morando na casa do Scott, que a reação seria a mesma - ou até pior.

         Acho que não posso dizer que minha vida virou de cabeça para baixo, porque a verdade é que parecia ter sido o contrário. Pela primeira vez, as coisas parecem estar no lugar certo e não sei exatamente como reagir a isso. Estou acostumado a sempre esperar pelo pior, então meio que não consigo aceitar que agora, cada vez mais, está tudo melhorando.

         As coisas são tão... fáceis com Liam e, também, com seus pais, amigos e com Melissa, que é difícil de acreditar. É estranho dizer isso, mas posso dizer que encontrei meu lugar – e ,mesmo que seja o mesmo de antes, não parece o mesmo.

         Não quer dizer que os pesadelos tenham sumido também, eles só aparecem com menor frequência. Tipo hoje. Às 2 da manhã, acordo suando e tremendo. As mesmas cenas de sempre: o inferno subterrâneo de Beacon Hills. Gritos no fundo. Uma angústia gigante. E, por último, Tara vindo em minha direção me puxar, e é aí que acordo sem conseguir respirar.

         Me sento na cama tentando recuperar o fôlego. Por favor, que eu não tenha gritado. Por favor, que eu não tenha gritado, de novo. Acho que não fiz barulho, porque posso ouvir os roncos de Melissa em seu quarto. Uma vez a acordei, sem querer, e me senti muito mal. Ela já faz muito ao me receber, de portas abertas, em sua casa.

         Desço, tentando ser o mais silencioso possível, para buscar um copo de água gelada. Foi só um sonho. Você tá bem. Isso é real. Quando volto, lavo o rosto umas 3x e a sensação ruim começa a passar. Meu celular ilumina o quarto escuro com uma notificação. Me deito, de novo, e vejo que é uma mensagem de Liam. 2 da manhã?

         "Tá acordado?"

         "Sim, tá tudo bem?"

         Ele começa a digitar algo, mas segundos depois me liga. Me levanto para fechar a porta do quarto e atendo.

         -- Insônia? – pergunto.

         -- Tipo isso. E você?

         -- Também. – minto, porque a pior parte já havia passado e não havia motivo para preocupá-lo com isso agora.

         -- Theo.

         Já posso sentir minhas batidas desacelerarem e voltarem ao normal. Como eu disse, tudo com o Liam não só era fácil, como também tornava tudo mais fácil de lidar, mesmo que ele não soubesse disso.

         -- Liam.

         -- Eu gosto muito de você, sabe?

         Minha boca forma um sorriso, sem eu perceber.

         -- Você tá bêbado ou algo do tipo?

         -- Seu idiota. Você sabe que não. Bem que eu queria, na verdade.

         -- Eu também.

         -- Queria estar bêbado?

         -- Também gosto muito de você, Liam. – posso sentir seu sorriso pelo telefone. - E estar bêbado agora, também, não ia mal.

         -- Então... ok. Boa noite, Theo.

         -- Você só solta isso e sai?

         -- É. Não gostou?

         -- Vir aqui que é bom, nada, né?

         -- Isso é um desafio?

         -- Por que tudo tem que ser um desafio, seu pincher competitivo?

         -- Para de ser um babaca. – ele diz mas sei que está sorrindo. – se eu, pelo menos, tivesse um carro...

         -- Tudo bem, lindo. Se não fosse tão tarde e a gente não tivesse aula amanhã eu mesmo ia até aí.

         -- Até amanhã, Theo.

         -- Até.

         Minutos depois eu já estava dormindo, de novo, e só acordo de manhã com o despertador.

         Me junto à Melissa no café da manhã. Scott já tinha voltado à faculdade, uns dias atrás.

Eu já tinha me acostumado: acordar um pouco mais cedo e fazer capuccino para eu e ela tomarmos junto com as panquecas ou os ovos, que ela normalmente fazia para acompanhar.

Eu só não esperava que ela fosse tão engraçada assim antes. Esses dias têm sido uma surpresa, em todos os aspectos.

Quando ela descobriu que eu ainda estava morando em meu carro, não hesitou em me convidar para seu quarto de hóspedes. "Você não pode passar seu Senior Year assim. É um ano de criar muitas lembranças!", ela disse. Eu nem saberia explicar como sou grato por ela, também, ter me dado esse voto de confiança.

O dia que aquilo tudo aconteceu, todo aquele caos com aquele velho, mas também o dia que eu e Liam nos beijamos pela primeira vez, eu não consegui dormir. Descobri, depois, que não tinha sido o único quando desci para comer alguma coisa na cozinha, de madrugada, e encontrei Melissa lá fazendo o mesmo.

-- Não consegue dormir, também? – ela perguntou.

-- De jeito nenhum.

-- Depois de tudo que vocês passaram acho que qualquer um ficaria sem dormir por dias. Ah, claro. Com exceção do Scott, que tem essa habilidade de dormir a qualquer momento, independente do que aconteça.

Rimos. Eu não sabia disso.

-- Dia difícil no hospital, também? – pergunto ao me sentar à bancada.

-- Nem me fale. – ela pega dois copos do armário. – Leite? Tem uns cookies, que fiz mais cedo, se quiser.

Faço que sim e lá estávamos nós lanchando às 4 da manhã.

-- Por que eu sinto que aconteceram outras coisas mais interessantes que aquele senhor desocupado?

Como ela sabia?

-- Quê? Por que você diz?

-- Era só um palpite, porque você parece ter chegado menos abalado que o Scott, mas agora, pelo jeito que você perguntou, acho que estou certa.

-- Não tenho ideia de como você soube, mas é verdade. Teve partes mais... interessantes.

-- Agora vou querer saber a fofoca toda. – ela sorri.

Ela realmente estava interessada? Isso é muito novo. Ela só deve estar tentando ser educada. E outra: e se ela for homofóbica? Não. Ela é legal demais para isso. Sigo meu coração e conto:

-- Eu e Liam nos beijamos.

Ela larga o leite e os cookies e arregala os olhos boquiaberta.

-- Não acredito!

-- Confia em mim, nem eu acredito.

-- Como que vocês tão falando hoje em dia mesmo? Shippo? Porque eu já shippava vocês dois antes.

-- Como assim? – pergunto surpreso.

-- Não era difícil perceber que vocês se gostavam, fala sério. O pouco que vi, já estava na cara.

Solto uma risada.

-- Acho que do meu lado não era mesmo, mas eu, de verdade, não sabia se ele iria retribuir.

-- Amei. Estou torcendo por vocês, viu?

-- Obrigado. Foi legal ter comentado com alguém.

-- Que isso! Pode comentar sempre que quiser, até de outras coisas. Você já é de casa. – ela passa a mão pelo meu braço e se levanta para recolher os pratos.

E pela primeira vez, em muito tempo, eu realmente me senti em casa.

Do Outro Lado da Porta de Uma Camionete EnferrujadaOnde histórias criam vida. Descubra agora