Capítulo 22

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Velitha


— Velitha, vai começar o filme! Anda logo! — Escuto Ali gritar lá de baixo.

— Você sabe que eu escuto bem, né? Não precisa gritar.

— É impressão minha ou ela está cada dia mais mal-humorada? — Ele pergunta para Brindha enquanto desço as escadas vestindo meu pijama. São quase dez horas da noite, e inventaram de ver um filme.

— Ela está cada dia mais mal-humorada, não é impressão não. — Brindha responde e depois enche a boca de pipoca.

— Vocês não fizeram pipoca para mim? — Pergunto, e Ali me estende o pote na mão dele.

— Você não acha que eu vou comer essa coisa sem sal, né?

— Desculpa então, não fizemos pipoca para você.

— Argghhh! — Saio batendo os dentes e sigo para a cozinha fazer uma pipoca decente.

Eles têm razão, estou mais mal-humorada do que o costume. Deveria estar feliz com a visita do Ali, mas só consigo pensar no Kae e no fato de ele não ter me contatado durante a semana toda.

Se eu queria ter certeza de como me senti, não preciso mais. Ali resolve meu problema com as emoções externas perfeitamente. Mas não consigo parar de pensar no Kae. Nem mesmo consigo saber quando me apaixonei por ele. Queria muito falar com ele, mas tenho medo de que esse tempo tenha criado uma distância difícil de superar. Além disso, não tenho mais a desculpa que tinha para aparecer sem ser convidada.

Pego minha pipoca e vou para a sala. Sento ao lado de Brindha, Ali está do outro lado do sofá com os pés na mesa de centro. Não consigo nem comer minha pipoca, quem dirá prestar atenção no filme. Meia hora se passa, e não sei nem quem é o protagonista nem do que o filme trata. Minha frustração é tão grande que só quero gritar para minha mente o quão estúpida fui e correr para o Kae.

— Você deveria ir! — Brindha fala, me tirando dos meus pensamentos. Tenho certeza de que não falei em voz alta, ou falei?

— Do que você está falando?

— Do óbvio. Você está sentada aqui desde que o filme começou, sequer olhou para a tela. Fica olhando pela janela como se alguém fosse aparecer. Vou te dar uma dica: ele não vai. Se você quiser, deveria ir atrás.

— Por que eu deveria? Como você mesma disse, ele não vai se dar ao trabalho.

— Não, ele não vai porque ele tão cabeça dura quanto você. E ele pensa que você está com ele apenas por causa do acordo estúpido que fizeram. Além disso, depois de ver vocês se agarrando no clube naquele dia, eu também não viria atrás.

— Não nos agarramos no clube. — Ali fala.

— Para quem não sabe da situação, era exatamente isso que vocês estavam fazendo. Então, pelo bem da minha sanidade mental, que não aguenta mais sentir esse turbilhão de mal humor que você está sentindo, vai e conversa com ele. Se ele te der um fora, deu, segue em frente.

— Você faz tudo parecer tão simples e fácil.

— Me diz, é simples e fácil ficar supondo milhares de coisas sem saber ao certo o que poderia ser diferente?

— Eu te odeio. — Falo e me levanto do sofá, pego as chaves do carro e saio de casa.

— De nada. — Escuto a Brindha gritar assim que bato a porta.

Ela tem razão, não adianta ficar sofrendo como uma idiota. Eu nunca fui assim.

Dirijo sabendo exatamente onde quero chegar, mas sem ideia do que fazer quando alcançar meu destino. Minha mente quer tentar prever milhares de cenários possíveis, mas só quero seguir em frente, prestando atenção no caminho e decidir o que fazer quando precisar tomar uma decisão.

Entro na garagem do prédio, afinal, ainda tenho o controle e a senha da porta para entrar. Assim que passo pela porta de acesso ao prédio, decido pegar as escadas. O elevador só vai me dar tempo para pensar, então decido subir contando os degraus, até que chego em frente à tão temida porta. Penso se devo bater ou apenas entrar. Por alguns segundos, ou talvez poucos minutos, foco em escutar qualquer barulho que possa vir de lá dentro. 

Kae costuma dormir por volta da meia-noite, ele precisa de poucas horas de sono. Talvez sequer esteja em casa. O que devo fazer caso ele não esteja? Para me obrigar a parar de pensar, simplesmente entro. A casa está silenciosa, e por um momento penso que está vazia. É quando vejo a figura dele na sacada, olhando para mim da escuridão. Um tremor percorre meu corpo, e posso sentir na minha espinha. Posso perfeitamente imaginar ele com o uniforme de capitão do exército de Aragon, ou até mesmo como o imponente príncipe de Avar. Não importa o que esteja usando ou fazendo, ele emana mistério, e meu coração sempre acelera quando o vejo. Desde o primeiro dia, desde a primeira vez que o vi, como pude por um momento sequer imaginar que não estava apaixonada por ele?

— Kae!

— Velitha! — Me aproximo até a sacada, ficando ao lado dele. Tenho tantas coisas para falar, mas não sei como começar. — Sempre amei a vista daqui.

— Sim, é realmente muito bonita. — Ele faz uma pausa, mas sinto que ainda tem mais a dizer. — Alistar já foi embora?

— Não, ele vai ficar mais algumas semanas, ainda não tem certeza de quando vai.

— Entendo. Você tem dormido bem? — Posso entender o que ele quer me perguntar, se eu estava com ele apenas pelo nosso acordo.

— Sim, tenho dormido bem. — Uma grande mentira, mas não quero que ele pense que estou aqui por isso. Não dormi bem porque ele não estava ao meu lado, e não por outro motivo.

— O que você está fazendo aqui, Velitha? — É esse o momento em que preciso falar, mas tenho medo de começar. Então, fico em silêncio até que sinto a coragem aparecer.

— Vim cobrar a promessa que me fez.

— O quê? — Sei que ele lembra do que estou falando. Quando pedi que ele me beijasse, ele disse que o faria se eu voltasse a pedir, mas em um momento que eu não me sentisse tão fragilizada.

— Você esqueceu disso? Ou simplesmente não tem vontade de cumpri-la?

— Velitha...

— Pode ser sincero comigo, Kae. Sou bem grandinha para compreender as coisas. Se você me disser que não está interessado, prometo não te incomodar mais.

— Velitha! — Ele fala ao mesmo tempo em que segura meu rosto entre as mãos. Posso sentir meus olhos enchendo de lágrimas, mas me recuso a deixar que elas caiam. Tenho medo de que ele diga que interpretei tudo errado, que estou louca e ele apenas me tratou como uma irmã mais nova.

— Se eu te beijar, não haverá mais volta. Desde o momento em que te vi, eu sabia que você era a única por quem eu poderia me apaixonar, e eu estava certo. Não consegui te esquecer desde aquele momento. Te beijar vai tornar o que é apenas um sonho real. Não vou conseguir te deixar ir. Vou brigar com a minha família e com a sua para poder ficar com você. Você está disposta a isso?

As lágrimas agora escorrem do meu rosto sem controle. Como seria diferente depois do que acabei de ouvir? Nesse um ano ao lado dele, ele já estava apaixonado e esperou pacientemente até que eu tivesse certeza. Como não amar essa pessoa?

— Para mim, já não há mais volta, Kae.

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⏰ Última atualização: Jul 12, 2023 ⏰

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