- Acabei de perceber, estamos juntos a 12 anos e realmente nunca transamos.
- O que?
Hugo vira para mim, abandonando as garrafas de vinho e whisky que arrumava na sua tão preciosa estante de bebidas do bar. Ele me olha incrédulo, como se fosse impossível ter escutado isso. O pano que antes tinha nas mãos vai para o seu ombro do mesmo jeito que fazia anos atrás, só que agora ele esquece que usa um blazer caríssimo.
- Você escutou o que eu disse?
- Escutei e to pensando se você bebeu sem eu ver, Teo.
Apoio o rosto na minha mãos, com o braço no balcão de madeira quente e sorrio.
- Eu só apontei uma realidade, não entendo o problema nisso.
Não há ninguém ocupando as mesas, a varanda, se enchendo de álcool ou acendendo seus cigarros incômodos. Ainda não abrimos, falta um bom tempo, o suficiente para eu ter paz com o meu marido na nossa segunda casa.
- Mas por que isso do nada? Você por acaso quer transar? - ele se aproxima e apoia as mãos no balcão. Estou a segundos de arrancar o pano do blazer púrpura de risca de giz que encomendei especialmente para ele.
- Você quer? Está precisando disso?
- Aí ruivo, tenha santa paciência, uma hora dessa, depois de tanto tempo vem me perguntar isso?
- Você tá sendo exagerado, querido!
- E você louco varrido, biruta, desequilibrado, precisando de ajuda, acompanhamento psicológico ou que eu tire o café da sua vida por um ano
- Ei, deixa meu café fora disso - ele revira os olhos - e tira esse pano sujo da roupa, idiota.
Ele grunhe para mim e pendura o pano em um dos ganchos que tem na parede com os utensílios.
- O barman que você passou aqueles meses todos treinando começa hoje né?
Tomo um gole do suco de laranja com morango que tem na minha frente, por enquanto nada de álcool, a noite vai ser longa e somos os anfitriões.
- É, ele tem potencial meu bem, estou animado para saber como os clientes vão receber, especialmente os veteranos.
Faz somente dois anos que abrimos nosso próprio bar e adoro reviver a alegria palpável que Hugo sentiu naquele dia e como seus olhos brilhavam em êxtase. Quando ele me apresentou como seu esposo na inauguração e o responsável pelas obras que decoravam as paredes e todo o resto da decoração, me senti feliz em segurar sua mão na frente de todos e ser ovacionado com mais palmas.
Hoje é a noite de gala, uma ideia minha para uma noite especial no nosso estabelecimento, já que o urso com quem eu divido a cama gasta toda a sua criatividade com bebidas, por isso estamos vestidos com roupas elegantes. Meu marido dá a volta no balcão e me segura pelo corpete preto que uso por cima de uma camisa clara de tecido leve, a calça social é um charme a mais.
- Então por que você continua atrás desse balcão? Temos que receber os convidados, abrir a noite e você vai fazer tudo isso já cheirando a álcool e limão?
- Você trouxe seu caderno de rascunho e está neste momento escrevendo - olho para o objeto velho embaixo do meu braço - e tem o seu notebook ali no escritório .... devo continuar?
- Não.
- Ótimo, então deixa eu aproveitar, você sabe que não consegue viver sem as minhas bebidas.
Suspiro e reviro os olhos, roubando um selinho dele, com dificuldade pela diferença de altura mesmo que esteja de salto.
- Mas deixa o novato ter seu momento tá.
- Uhum.
Me afasto para andar entre as mesas, conferindo as decorações que planejei para a noite. Me sinto leve, contente e vivo de certa forma, as coisas entre mim e Hugo se tornaram sérias e estáveis, nós amamos.
Eu o amo como nunca amei alguém nesse mundo. Porra ele soube me refazer por inteiro.
- Ei espera aí, vamos voltar para o outro assunto, mocinho - ele abandona mais uma vez as garrafas e eu escondo uma risada para não o irritar ainda mais - Por que está falando sobre a gente transar? Você sabe, eu deixei claro no primeiro dia, que eu não precisava de nada disso com você e que nem procuraria em outro lugar
- Eu sei
- Então o que houve agora? Você quer transar?
- Não.
Hugo levanta uma sobrancelha, completamente perdido na conversa. Eu suspiro e caminho sonoramente, de volta para o bar.
- Não quero transar, mas não faz mal termos essa conversa mais uma vez. - ajeito um fio do seu cabelo que saiu da trança lateral - se você quiser podemos tentar pelo menos uma vez.
- Teo - ele segura uma gargalhada, depois de arrastar o meu nome, do mesmo jeito que faz ao me consola nas minhas madrugadas ansiosas, quando me lembra que não estou sozinho para aguentar tudo. - nós já nos fodemos figuradamente de tantas formas, entre os lençóis, conversas na cozinha da nossa casa ou até mesmo no balcão do bar, que não precisamos de nenhuma atividade para termos nosso sexo. Não vejo a hora de comemorarmos mais um ano sem termos transado.
Sorrio, como sempre são meus sorrisos desde que o conheci, aqueles que me fazem aceitar o presente que eu tenho, um sopro a mais de vida.
O beijo, até que alguém chame na porta.
Me afasto e pego um cigarro dentro do maço no seu blazer e acendo com o isqueiro no meu bolso.
- O novato chegou, falta 1h para abrirmos e você tem 20 minutos para arrumar tudo com ele antes que eu venha te arrastar para longe das bebidas - aceno para o garoto entrar - se precisarem de mim, já sabe o que estou fazendo.
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Chopp de Morango com Laranja
Romance"The club isn't the best place to find a lover So the bar is where I go". Menos este bar. E não que Teo estivesse procurando um amor, pelo menos não depois do que aconteceu. Mas as coisas são imprevisíveis ou apenas o universo é brincalhão, ele não...