Capítulo 19

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Bai Huowu

Ok, eu já aceitei isso: fui curvado, sou um corta-manga, um pêssego mordido, gay, enfim. Eu gosto dele, talvez fosse algum deslumbramento com sua beleza ou a atração sexual que influenciava meus sentimentos, ou seu sorriso, que quando surgia costumava ser tão luminar quanto o brilho do sol ou suas mudanças de humor, ora frio, ora quente. Pelo sete céus, tudo nele era perfeito! Acho que estou perdido!

– Posso pedir mais bolinhos de chá verde? – Chen Dalun, o pequeno de cinco anos sentado em meu colo perguntou, ele tinha lindos olhos castanhos avermelhados e quando estivesse mais gordinho seria muito fofo.

Dei um sorriso.

– O que quiser. – toquei seu pequeno nariz.

Ele saiu do meu colo, seguindo em disparada para pedir os amados bolinhos.

– Vai cuidar ele? – Liu YuanQi tomava chá de damasco, seu rosto como neve deixava escapar traços de curiosidade.

Estávamos no restaurante da estalagem, eu já me sentia bem o suficiente para comer fora do quarto, mesmo que tivesse melhorado ainda naquela manhã. Liu Yuanqi insistiu em me acompanhar, ele parecia pensativo e mais observador do que nunca.

Eu sentia como me olhava, procurando. Ele devia está desconfiado da minha identidade. Era agora que viraríamos inimigos? Eu torcia que não, pois ainda desejava gozar de sua presença o máximo de tempo possível, até o instante último de minha partida.

– Não acho que terá muito futuro se ficar comigo. – comentei, eu estava sendo sincero.

Ele me observou em silêncio.

– Eu tenho noção de minhas capacidades, e com certeza ser pai não é uma delas. – continuei a falar enquanto escolhia um baozi com os Kuàizi.

– Como tem tanta certeza? – ele perguntou erguendo uma de suas sobrancelhas.

– Eu sou um canalha desavergonhado, não há correção para mim. – dei de ombros. Apenas repeti o que sempre ouvi de todos, se eles falam isso de mim devia ser verdade, não é?

– Tem muito pouca fé em si, para alguém que almeja algo até então impossível. – rebateu o imortal, tomando um longo gole de seu chá.

– Sei no que sou bom. – dei de ombros.

Um silêncio incomodo nos envolveu, olhos ainda procurando algo em minha face, análise minuciosa como se buscasse algum feitiço. Ele suspeitava da minha real natureza e não se esforçava em esconder. Era como se quisesse que eu percebesse, como se desejasse saber de minha boca a verdade ainda não revelada.

– Sabe, sempre quis saber, por que queria ser um ferreiro celestial? – perguntou o imortal, me sondando, esperando por respostas e torcendo para não serem mentiras. Eu sentia sua angústia. Era perceptível na forma como seus ombros estavam tensos, suas mãos se apertando. Sua expressão corporal gritava, o que não se expressava em suas palavras frias e em seu rosto congelado.

Assim, decidi ser sincero.

– Porque eu não podia ser um cultivador. É o que dar, quando se é vendido pelo pai, como escravo, aos 10 anos. – dei de ombros.

Liu Yuanqi me analisou, seus olhos num tom de avelã se tornaram mais para um tom de verde, eram calorosos, quase pesarosos, como se dividisse a minha dor, como a se a sentisse como sua. Meu coração se aqueceu, não precisava palavras, suas pequenas variações de expressão me contavam o que eu precisava saber.

Isso me fez querê-lo ainda mais. Seus lábios rosados pareciam mais chamativos, como se me convidassem a prová-los. Pisquei o desejo queimou e num suspiro, se foi. Não devo começar algo que terminará mal. Principalmente quando eu voltar, pois meu ódio por imortais irá se reacender como uma chispa de fogo numa floresta seca, então eu irei o odiar.

Bebi mais um gole de licor direto da garrafa, me sentindo triste por ansiar e nunca poder ter. E ele estava ali, tão próximo, um erguer de braço e eu poderia puxá-lo para mim.

Sacudi a cabeça, eu estava pensando demais. Afinal, talvez o imortal não me quisesse, sendo assim, eu nunca o forçaria.

Depois de algum silêncio, rompido por risadas infantis que provinham da grandiosa mesa atrás de nós. Isso atraiu a minha atenção, me virei, o pequeno Chen Dalun contava uma das histórias que lhe narrei em Jhakar na tentativa de acalmá-lo. O menino contava com tanto gosto, que seus miúdos olhos castanhos-avermelhados cintilavam como chamas.

Por isso, não havia voltado após pedir seus amados bolinhos de chá verde. Quando voltei o olhar, Liu Yuanqi me encarava, ele desviou a atenção para o bule de chá de porcelana, o cenário de duas montanhas estava retratado no conjunto de chá. O desenho era primoroso, feito por mãos habilidosas que traçaram até um barquinho nas águas que refletia as duas montanhas. Um conjunto adequado para está nas mãos, de dedos longos e brancos como jade, do imortal.

Em seu rosto gélido como o inverno, havia uma pincelada de hesitação, ele apertava a gaiwan e eu temia que a peça quebrasse em suas mãos, acabando por feri-lo.

– Pergunte. – o incentivei, enquanto bebia o licor direto da garrafa, o imortal me lançou um olhar de repreensão, o que me fez sorrir.

Fiz mais um gesto de incentivo para falar, o aperto entorno da gaiwan diminui, seu foco estava na mesa e suas palavras saíram lentas:

– O Ancestral te chamou de imperador; durante seu surto, você se referiu a uma meimei, que não existe...

Havia dúvida, quase como se Liu Yuanqi pesasse suas próximas palavras e temesse a resposta da indagação ainda não feita.

– Quem é você, de verdade?

– Acho que já tem um palpite. – coloquei um baozi na boca e o encarei. Engoli a comida e finalizei a fala. – E não está errado.

O imortal se curvou, se aproximando de mim, me analisando com curiosidade, não com medo. Isso foi uma feliz constatação.

– Como? Como pode ser um cultivador demoníaco se nem tem os característicos olhos roxos? Como?

– Existem muitos segredos nesse mundo.

Ele me analisou, pesando minha fala e minha clara indisposição de compartilhar determinados detalhes. Eu não podia dizer como conseguir "outro corpo" e principalmente não poderia falar nada acerca das propriedades mágicas das sementes Yin. Não. Ninguém poderia saber sobre elas. Liu YuanQi expirou pela boca, sobrancelhas tensas se apertando.

– E mesmo assim está disposto a me fazer uma espada divina? Por quê? - ele mudou de assunto.

– Até onde eu saiba, temos inimigos em comum.

Tomei um grande gole de licor de ameixa, meu favorito e me recostei contra o assento.

– Entendo. – havia outras questões que se aglomeravam embaixo de seus volumosos cílios, mas essas nunca ganharam voz. Liu Yuanqi tomou o resto do chá. – Quando vai partir? – indagou o imortal, com uma expressão enigmática no rosto.

– Amanhã.

– Posso confiar em você?

– Pelo histórico de sua gente em relação a minha, eu que deveria perguntar isso. 

Me levantei e desviei o olhar, pouco desejoso de ver o pânico e nojo que surgiria naquela face. Virei as costas e me afastei. Saí do restaurante no térreo e segui para as escadas, voltaria para o meu quarto e descansaria um pouco, afinal a viagem de volta seria longa.

 Saí do restaurante no térreo e segui para as escadas, voltaria para o meu quarto e descansaria um pouco, afinal a viagem de volta seria longa

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A Espada que Corta as TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora