Um casal

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Estamos voltando pra São Paulo depois de passar uma semana na praia e nos pontos turísticos da cidade. Estamos no carro e estou fazendo meu papel, cantando as músicas que eu coloquei.

– The clock is Moving – grito no carro – Hands to Midnight / Can we get through this? / While the walls come down we all pretend / Here comes the end / Here comes the end / Now can you feel, can you feel it? / The time is running out / The days are moving fast / The riot squads are restless and there's no more light / Just the creeping paranoia and the sleepless nights / Look away / 'Cause they got nothing to say!

Continuo cantando e percebo que amo Here comes the end. Gabriel entende a letra perfeitamente e fica com os olhos arregalados até ela acabar.

– Você tá bem? – ele pergunta. E eu nunca estive melhor. Apesar a letra falar sobre o fim dos tempos, eu nunca me senti tão bem assim.

– Eu estou mais que bem. Sei que a letra é complicada, mas e daí? Eu poderia estar cantando Something sem estar apaixonado. Mas nesse caso meu amor, eu estou apaixonado por você! – exclamo e volto a cantar – It's been a hard day's night / And I've been working like a dog / It's been a hard day's night / I should be sleeping like a log / But when I get home to you / I find the things that you do / Will make me feel alright, owww!

Paro de cantar e percebo que piorei de novo e foi um tempo recorde. Nunca foi tão rápido. Pego meu celular e tiro a música.

– O que foi? você tá bem? – ele pergunta dando breves olhadas para mim.

Não, não estou.

– Tudo piorou de novo em questão de segundos – digo em quanto puxo minha pele do rosto para baixo com os dedos.

Ele pega meus dois pulsos com uma mão.

– Para – ele suspira – acho que vamos ter que ir a um psiquiatra porque acho que sei o que você tem.

. . .

– Eu acho que você é bipolar, mas precisaríamos de mais algumas consultas para concluir – o psiquiatra diz – você pode vir mais vezes?

– Posso – respondo.

Saio da sala e volto para a recepção, Gabriel está me esperando ali sentado, mas por algum motivo minha visão escurece e eu caio no chão. Eu desmaio.

. . .

Estou deitado no chão com metade do meu corpo em cima de Gabriel.

– Você comeu hoje? – ele pergunta – eu não vi você comer.

– Não, nem antes de ontem. E se eu comi, eu vomitei tudo.

Ele não diz nada, apenas meu abraça. Em seguida me ajuda a levantar.

– Vamos numa padaria, vem – ele pega minha mão e me leva até o carro.

Ele para o carro na frente de uma padaria.

– Me deixe aqui. Vai lá comer – eu digo.

– Como assim? Eu vim aqui pra você comer e não passar mal de novo.

– Ah – digo, mas antes que possa contestar ele me tranca dentro do carro e entre lá.

Ele volta com uma coxinha de frango, e um donuts de frutas vermelhas. De bebida, ele pegou um chá gelado e um suco de laranja.

– Come – ele diz em quanto me olha, olhando a sacola.

Só de pensar em comer, meu estomago começa a revirar.

– Como sabe que donuts é o único doce que eu gosto? – pergunto.

– Eu via vários podcasts seus antes de me obrigar a te odiar, e em um você dizia que amava esse donuts. E eu tenho que concordar, ele é muito bom – ele ri, mas fecha a cara logo – come logo.

Eu suspiro.

– Desculpa, mas acho que não consigo – digo.

– Vamos levar para casa e você come algo lá – ele diz e liga o carro.

. . .

– Come, meu anjo, por favor – ele diz.

Eu não respondo. Ele empurra o prato para mais perto de mim.

– Vai Cauã, por favor.

Eu não respondo e também não olho para ele. Ele se levanta e arrasta a cadeira para se sentar do meu lado. Ele pega um pouco de comida e coloca na colher e a leva até minha boca. Eu não abro. Ele faz carinho no meu cabelo e devolve a colher no prato. Ele me abraça e eu o abraço de volta.

– Você tá chorando? – eu pergunto.

– Me desculpa – ele diz e se afasta em quanto limpa o rosto – é só que... eu não quero te perder. Já vi pessoas da minha família nesse estado e não acabou bem. Então, por favor, tenta comer – ele está chorando muito e eu me sinto mais culpado ainda.

Pego uma colher cheia e enfio na boca e engulo sem pensar duas vezes. Logo em seguida, bebo um pouco do suco que ele comprou.

– Não precisa fazer isso de uma vez – ele diz – eu vou estar aqui com você e não quero que faça rápido porque pode piorar.

Eu assinto e tento comer mais um pouco, mas mais devagar e não como nem dez por cento do prato.

– Me desculpa Gabriel – digo – é que as vezes parece que isso é a única coisa que eu consigo controlar na minha vida confusa e agitada. Eu prometo tentar voltar a comer mais.

– Quando as coisas piorarem, saiba que eu vou estar aqui. Here, there and everywhere com você – ele faz referência a Beatles – e Can't take my eyes of you – outra referência, mas agora a Frankie Valli.

Sorrio para ele e ele faz o mesmo.

. . .

Estamos deitados no sofá. Eu estou com a cabeça deitada na sua perna e está com uma mão no meu cabelo e outra no celular. Ele tira uma foto nossa e meu celular vibra em seguida.

16:27

Instagram

@gabs_alves postou uma foto.

Sim, eu tenho um namorado e amo ele 💕

eu me sento boquiaberto, mas sorrindo.

– Eu te amo tanto, meu Deus – digo e o abraço – não precisava fazer isso se voc...

Ele me interrompe quando pega no meu rosto.

– Eu queria e agora que já fiz não quero mais. Eu te amo, namorado – ele diz.

Sento no seu colo e começamos a nos beijar e acabamos parando na cama sem roupa pela segunda vez.

Estamos deitados, ofegantes um ao lado do outro. Ele pega o celular e em seguida tira uma foto nossa.

– Você não vai postar, né?

– Não, é só recordação – ele diz – aliás, preciso tirar mais fotos nossas. Momentos são coisas passageiras e a melhor forma de lembrar deles são com filmagens e fotos. E você com certeza é meu momento favorito e espero que dure até ficarmos velhinhos.

Amo esse garoto, meu Deus. Como era possível o odiar?

Um amor entre notas músicaisOnde histórias criam vida. Descubra agora