𝐂𝐀𝐏 𝟎𝟐 ━━ 𝑆𝑛𝑜𝑓𝑓𝑛𝑢𝑔

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Se lembra de quando eu disse que os festivais da vila são tão venerados quanto o próprio Jesus?

Era uma manhã de sábado, a neve costumeira ainda caía pela janela, mas desta vez de forma solfejante, como se cada minúsculo floco de neve estivesse sussurrando "hoje é o dia!".

Eu e mais algumas noviças estávamos numa sala espaçosa do convento, diferente das outras, era tão espaçosa que poderiamos sentir nossas respirações, ou ate mesmo ler os pensamentos uma das outras, angustia mesclada com ansiedade preenchiam o ambiente monótono dando um pouco de cor para o lugar.

Eu e mais algumas noviças selecionadas posicionavamos nossos instrumentos musicais, a fim de praticar para o festival de hoje.

O snøffnug nada mais é do que o festival mais aguardado do ano pelos Noruegueses de fé. Mais pela chegada do Natal, pois acontecia três dias antes do mesmo, é como uma noite de celebração por Jesus ter nascido. Haveria vinho, comidas, concertos de música e uma competição de pinheiros.

Sério, quem teve a ideia de colocar pinheiros de Natal decorados em exibição? E por que votam por pinheiros de Natal?

Nem tantas noviças sabiam manusear instrumentos musicais, então havia uma sala espaçosa para seis mulheres e um maestro. Duas delas eram violinistas, duas tocavam flautas transversais, uma tinha uma harpa, e eu era a única do convento inteiro que podia tocar um contrabaixo.

O maestro se encontrava impaciente, olhava para a partitura a sua frente fixamente enquanto pincelava seu bigode com os dedos.

Lenna, nota de partida para os instrumentos de corda.

Levo o arco até as cordas de meu contrabaixo, a seguir um coral de instrumentos.

─ Há um enorme ritornelo bem no meio da sua partitura, Maja. Por que não acompanha suas colegas? ─ Repreende o irado homem a uma de suas flautista, a qual encara a figura bem no meio de sua partitura com um semblante desesperançoso.

─ Muito bem, por hoje é só, para as flautistas, uma aula dobrada por hoje.

Guardavamos nossos instrumentos e deixávamos a sala, e a última coisa que poderíamos ver eram os rostos desapontados das flautistas.

Essa época do ano é sempre mágica, o snøffnug é um dos únicos festivais no qual eu poderia abandonar as atividades convencionais do convento e rever a minha família.

─ Droga, tenho que polir meu violino para hoje.

─ Sabiam que o filho do prefeito das ilhas do Norte vai estar lá? E você Lenna, está ansiosa?

Freya me tira de meus pensamentos, fazendo eu retornar para a realidade lentamente.

─ Eu não sei. Acho que sim. ─ Respondera ainda pensativa, seria deveras inconveniente se eu assumisse que estou ansiosa para largar as atividades entediantes do convento por um tempo.

─ De qualquer forma, acho que seguiremos caminhos opostos, então.... nos vemos mais tarde. ─ Dizia para o grupo de irmãs enquanto apontava para a direção oposta.

─ Mas espera aí Lenna, você não quer ensaiar com a gente? O maestro disse que poderíamos pegar o metronomo dele emprestado... ─ Dizia a mais baixa do grupo.

─ Tudo bem, não farei nada além de míseros acordes, e além disso tenho uma coisa muito importante para fazer.

Antes que pudessem completar mais alguma coisa, sigo em direção oposta, fazendo-as se entreolharem e por final darem de ombros.

Não me julgue mal, eu realmente gosto dessas mulheres, são diferentes das demais noviças do convento, não criam rivalidade, não fazem piadas de mal gosto e nada que possa prejudicar as outras garotas. Na verdade, se não fosse por elas talvez não aguentaria um mês sequer nesse convento, deve ser por isso que Deus não deixou o homem sozinho no princípio, e o arrancou uma de suas costelas.

Mas eu realmente tenho um assunto importante para tratar. Todos os anos, nessa mesma época do ano, escrevo uma carta para minha mãe, perguntando coisas do tipo "como você está?" "O papai poderá vir para o festival ou estará muito ocupado com a Marinha?" Geralmente, as noviças não podem sair escrevendo e enviando cartas quando bem entendem, todas tem que passar pela Madre, e serem escritas com a autorização da mesma. Mas particularmente, comigo ela não ligava portanto que as outras garotas não saibam desse meu "privilegio".

Me encontrava novamente subindo as intermináveis escadas da igreja, na qual estranhamente estava muito silenciosa, apenas podendo ser ouvido meus sapatos colidindo com o pedregulho dos degraus. Não havia ninguém na sala da Madre, e o cheiro de tinta fresca me recebia, encima de sua mesa, que estava bem centralizada, além de inúmeras pilhas de papéis e documentos burocráticos, havia a pena, uma folha de papel e a tinta. Era como se a Madre já soubesse que eu escreveria a carta.

Ninguém jamais poderia ousar adentrar o escritório do convento, a não ser se você for solicitado, ou for escrever uma carta, como o meu caso. Por isso, verificava a porta o local, para ter certeza de que não havia ninguém, não queria ser obrigada a ouvir os burburinho de alguém ter sido condenada a comparecer a temida sala da sra. Angerbotha.

Conforme eu fechava a pequena fresta da porta, sentia minha mão sendo retida por um toque furioso do lado de fora, a Junto de um olhar traiçoeiro e enfuriado, bem vidrados em meus olhos, como se estivessem falando "te peguei".

─ Mas olha só o que temos aqui... não acho que a Madre irá gostar de ver a protegida dela invadindo seu escritório.

Era uma das garotas de antes, das quais me apontavam os dedos, qual era mesmo o o apelido dela?... Era Asmodeus, ah sim, a líder das demais que acompanhavam ela. A garota empurra a porta com toda a sua força, fazendo-me dar um passo para trás.

─ O que a Madre me mandar fazer é apenas da conta dela e minha, Norabel. E eu não sou "protegida" dela, como falam.

Tentava lhe dar um empurrão, mas  mesma se afasta antes mesmo, com repulsão em seu rosto.

─ Não, não encosta em mim! Vai ver sua MALDIÇÃO é contagiosa.

Não era nem a primeira, nem a segunda fez que citavam minha "maldição", ou de como sou "especial e agraciada", mas ainda sim, machuca.

─ O que houve, LILITH? Não vai falar nada? E por que você sabe que é verdade, não é? Sabe que esse convento abriga um demônio infernal bem de baixo de seu teto.

Era como se minhas cordas vocais tivessem sido travadas em um nó, e tudo que eu poderia fazer era encarar aqueles olhos esverdeados e sagazes caçoando da minha cara.

─ Mas você também não é muito pura....

Conforme minha palavras solfejavam em seus ouvidos, Norabel desmanchava seu sorriso.

─ Como ousa, seu demônio? ─ A mulher me empurrava, dando ênfase em cada palavra que saia de sua boca.

─ Você não pode se tornar freira, Norabel. Você não é mais pura. Acha que ninguém sabe disso? Acha que ninguém sabe dos homens dos quais você se deita quando não está no convento? Quando pretende contar isso a Angerbotha?

Seu semblante vitorioso desaparece completamente de seu rosto, apenas fitando-me, sem poder dizer uma palavra.

─ Não seria você a prostituta que está citada no livro de Apocalipse?

Não pude conter minha risada, Norabel parecia completamente arrasada, saiu pelo corredor falando todos os insultos que passava em sua cabeça, mas que eu estava muito ocupada para ligar, já que além de escrever a carta para minha família, também precisava correr com os preparativos do festival.

✒️ - NOTAS DA AUTORA

Vi que sentiram falta dos capítulos, obrigada pelo carinho, de verdade!
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Não foquei muito no Euronymous desta vez, precisava adicionar coisas que seriam mais relevantes no andar dos capítulos...
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Os votos e comentários me motivam demais a escrever, caso vocês votarem, irei entender que estão gostando do meu trabalho, novamente, obrigado pelo carinho que vocês tem com minhas obras ♡ nunca deixo de ler seus comentários.

𝐉𝐔𝐃𝐀𝐒 ─ ᴇᴜʀᴏɴʏᴍᴏᴜs ✟Onde histórias criam vida. Descubra agora