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três anos atrás...

DÉBORA.

Hoje é minha última prova do vestido antes de iniciar a semana de preparatórios para o casamento. Faltam sete dias para que eu me torne uma mulher casada.

O meu coração bate forte no peito quando me deparo comigo mesmo no espelho, vestindo um vestido tradicional, armado, com rendas, o que não faz muito meu estilo, mas ele é inspirado no da mamãe... o que ela usou no seu casamento.

E eu sinto que preciso de algo que me deixe mais perto deles, já que não estão presentes em corpo. Não sei qual seria a reação deles em saber que me casarei, ainda mais sem amor.

O motivo que me fez concordar com isso foi a empresa da família. Meu avô que cuida da vinícola da Itália apenas disse que era preciso, pois é a solução que da para ajudar a manter ela de pé sem que alguma área não seja afetada.

O que para mim não faz sentido, já que ela está entre as melhores e se supera a cada vez. Além de que isso só irá abrigar a empresa dos pais do meu noivo, que apesar de dizer que me ama, sempre pensou em mim (desde que fui embora da Itália quando criança e da outra vez quando jovem adulta), entende que só estou fazendo por amor a família. Aos meus pais.

Ele sabe que não o amo. Minhas atitudes são gélidas, rasas. Mas nós como amigos nos damos bem. Ele consegue me compreender.

Olho no espelho o véu sendo colocado na minha cabeça e os olhos da minha família sob mim. Todos hipnotizados. Sendo que é uma imagem sem sentido.

- Mio Dio! Quanto sei bella, amore mio. (Meu Deus! Como você é linda, meu amor.) - meu nonno diz emocionado na chamada de vídeo. Inclusive a voz está embargada. - Senza dubbio sei la sposa più bella che abbia mai messo piede in Itália. (Sem dúvidas você é a noiva mais linda que já pisou na Itália.)

- Ah...nonno! Così mi fai piangere. ( Ah...vovô! Assim eu choro.) - respondo. Meu italiano nunca saiu de mim, até porque meu avô apenas conversa em italiano. - Domani sarò li per uccidere il desiderio. ( Amanhã estarei aí para matar toda a saudade.) - Ti amo.

- Ti amo, amore mio.

- Está linda, figlioccia. Agora você irá se casar e construir sua família, além de continuar o legado da nossa família. - alguma tia minha fala e eu me seguro para não revirar o olho. - Perfeita.

- Já posso retirar o vestido? - pergunto para minha avó, que não falou nada sobre. Ela apenas parece estar deslumbrada. - Quer que eu coloque algo mais? Talvez brilhos?

- Está impecável, amore.

- Sendo assim eu irei retirar e ir para a última campanha antes de irmos para a Itália. - falo. É meu último trabalho aqui no Brasil, vendo que as vezes que estarei aqui serão raras, já que assumirei uma parte da vinícola. - Tia, pode deixar a nonna em nossa casa?

- Débora, você está priorizado um trabalho do que seu próprio casamento. - respode. Eu bufo, não há nada além disso para fazer. Se eu relutar entraremos em uma discussão. - Seu casamento é sábado.

- Meu casamento é sábado, tenho sete dias para fazer o que eu quiser com ele. Desistir? Talvez. Casar-me? Possivelmente. - minha paciência para esse assunto estoura. - Mas eu não irei parar ela aqui no Brasil por conta de um papel assinado. Eu tenho uma vida aqui!

- Débora...

Vovó me interrompe chamando atenção e eu me calo. Termino de vestir minha roupa e fico esperando o vestido ser colocado na caixa para que eu leve ele para a Itália. Ainda preciso organizar minha mala principal, já que outras coisas já foram despachadas durante a semana.

Entro no carro e escoro minha cabeça no volante, respirando fundo. Coloco no gps o endereço do estúdio e vou até lá para fazer a última sessão da campanha de arquitetura.

Horas de cliques, retoques, pausas. Minha cabeça foca no trabalho, o assunto é dissipado quando estou com uma máquina fotográfica na mão.

Meu celular toca e imediatamente um arrepio sobe pelo meu corpo, arrepiando até os pelos das costas.

Ele não me ligou em um ano.

Não será agora.

- Alô? - atendo e ouço uma respiração do outro lado da linha. - Oi? Quem é?

Pergunto. A chamada é desligada e eu sinto uma vontade absurda de chorar. Era ele.... Eu senti. Felipe pode até não ter falado nada, mas eu sei que apenas era ele.

Olho a tela esperando que ela acenda novamente e o número "desconhecido" apareça para que eu possa atender. Mas, ao contrário, aparece Tomás.

Penso em não atender, fico vendo a tela acesa e a mesa vibrando junto do toque. Ele desliga e eu respiro aliviada, podendo voltar a focar no meu trabalho. Só que após alguns minutos ele retorna a ligação e dessa vez decido atender.

Talvez nem tenha sido o Felipe antes. Talvez é só a minha mente tentando criar soluções para que eu volte para o Rio de Janeiro.

Respiro um. Respiro dois. Respiro três. Respiro nove. Respiro dez. Atendo.

- Olá, Tomás. - falo, simpática. Fingir entusiasmo com esse noivado já virou rotina, nem forço mais as emoções por ter me acostumado a agir assim. - Que surpresa receber sua ligação essa hora do dia.

- Liguei para minha principessa e futura moglie para saber se está tudo bem... - ele fala. O português dele é um pouco enrolado, mas dá para entender. Apesar de eu ter dito que ele não precisa se esforçar e que eu era fluente no italiano, teimou e disse que aprenderia português. - Amanhã estarei te esperando. Não vejo a hora de ver você vestida de noiva.

- Huh... me desculpa, mas eu estou no meio de uma campanha e preciso terminar. - falo, fugindo do assunto. - Amanhã estarei aí.

- Estarei te esperando, principessa.

Desligo e relaxo na cadeira. O copo de água em cima da mesa que está ao meu lado vem até minha boca e eu seco em segundos. Querendo mais.

Você vai se casar, vai cumprir o papel e depois dizer tchau. Só isso.

PODE FICAROnde histórias criam vida. Descubra agora