17.

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FELIPE.

Respirei fundo não sei quantas vezes encarando ela aqui na minha frente. Não sei quantas vezes desviei do agora e fui pro passado lembrando de nós. Não sei quantas vezes quis fugir daqui e me trancar em um lugar que ela não pode não entrar, em um lugar que só vai estar eu e minhas mágoas.

Decidi isso aqui durante a noite, durante uma insônia, durante um presságio do passado e presente em uma só linha do tempo. Posso estar cometendo o maior erro da minha vida agora, mas eu juro que isso tudo aqui é pra se vingar dela. Juro que eu quero fazer da vida dela um inferno e, sem dúvidas, quero que ela tenha um por cento da dor que senti quando ela partiu.

Eu tenho tudo esquematizado. Eu só preciso começar o plano, que na real já está começando com ela assinando esses papéis sobre a mesa.

- Bem- vinda a agência, Débora! - estendo minha mão para ela sem ânimo algum.  - Espero que seus dias aqui seja os melhores possíveis.

- Felipe...

- Eu? - levanto da cadeira e vou pra onde tem um sofá. Ela está me acompanhando com o olhar, sinto essa porcaria de sensação a cada mínimo movimento que faço. - Pode falar.

- Não, não é nada. - responde e fica um silêncio na minha sala. Depois de minutos ela decide falar. - Eu preciso estar aqui todos os dias?

Dou de ombros. Mas se eu quero fazer dar certo, eu preciso que sim.

- De preferência. Mas não em horário integral como alguns.

- Compreendo. - concorda. - Felipe, eu quero muito ter uma chance de conversar com você, eu não sei o que isso aqui pode virar, o que nós podemos nos tornar, mas eu preciso só de uma oportunidade.

- Você é minha inimiga da vida, Débora...! Mas aqui dentro você é apenas minha funcionária, apenas a garota que vai  cuidar da imagem da agência e não é desmerecendo teu trabalho. 

Posso estar sendo o maior pau no cu para todos, mas porra... Não posso ter um momento de graça com ela? Quero brincar um pouco com isso. 

- Por que então você não deixa eu chegar perto? Por que coloca uma maldita distância que impede de eu e você ter uma conversa para dar um basta?

- Não sei se você se lembra, mas quem colocou distância aqui foi você. Ou quer que eu te lembre de cada detalhe?

- Não precisa disso, Felipe.

- Mas eu faço questão, não seja por isso. - sento relaxado no sofá e fico agora de frente a ela. O cabelo preso em um coque, o salto fino, a saia curta e uma blusa verde que contrasta pra caralho com ela. - Bom, tudo isso iniciou quatro anos atrás...

- Por que? - pergunta. - Por que tudo isso agora?

- Há quatro anos atrás infelizmente ocorreu uma fatalidade na sua família, e papo reto, não vejo culpa alguma nisso. Mas aí passou um mês, passou outro e tudo começou a mudar, você se tornou fria, não fazia questão de nada, não lembrava que existia alguém que te amava e que te apoiaria dali pra frente, só um não, né... Várias pessoas que estariam ali pra te ajudar. Mas aí, em um dia normal vou te visitar pra saber como você está e quando chego vejo coisas. Vejo caixas por todo lado, vejo malas e malas de roupas, vejo você jogando tudo por água a baixo sem mais nem menos...

- ...Só pegou toda a responsabilidade afetiva e enfiou no cu, enfiou a porra de um namoro no lixo. Mas o que eu podia fazer, né? Não tinha condições tão boas, não podia oferecer luxo pra princesa que sempre teve de tudo e do melhor. Não adiantava eu lutar quando você nem ouvia eu dizer que tudo ia ficar bem porque você me tinha! Não adiantava eu implorar pra você ficar porque você já tinha resolvido com sua avó de ir pra Curitiba, porque já havia comprado passagem. Não adiantava dizer que o amor que eu sentia por tu era o bastante, afinal, amei sozinho.

- Para, por favor. Não foi nada disso!

- Nada? Tem certeza? - rio, incrédulo. -  Ah, então foi tudo um delírio da minha cabeça em uma das vezes que me drogava por sua causa. Entendi... Cara, namoral, tu é uma piada.

- Eu errei, eu sei. Mas não tem nada disso, quem disse que você amou sozinho? Quem?

- ENTÃO POR QUE NÃO FICOU? - altero o tom de voz e me repreende por isso, mas foi inevitável, é inevitável. - Você marcou um jantar, você disse que aquela era nossa última noite juntos, você que foi embora depois de eu ter implorado pra ficar. Tudo foi você. E agora vem falar que também tinha amor à mim? Não, Débora, você tinha tudo, menos amor. Amor não faz isso! Amor não deixa as pessoas como você me deixou.

- Eu tô indo embora. - levanta da poltrona e sai pela porta que entrou. E agora eu fico aqui sozinho mais uma vez depois da bagunça que ela causou.

Ela sempre vai embora. Ela sempre foge dos problemas.

Minha vontade é sair daqui e ir pra qualquer rumo que a vida pode me levar, mas eu sei que se fizer isso eu vou parar no lugar que não devo.

DÉBORA.

Dou tantos socos no volante do meu carro que sinto minha mão doer muito. Meu cabelo que antes estava alinhado ao máximo, sem um mísero fio fora de ordem já está todo bagunçado. Bagunçado igual a minha cabeça, igual aos meus sentimentos, igual a tudo.

Eu não sei se foi uma boa ideia assinar isso, de trabalhar para ele. Eu achei que ter isso seria uma oportunidade de ter ele de volta pra mim, de ter a chance de nos resolvermos, mas não, tudo que acontece é jogar na minha cara que errei, que deixei ele para trás.

Mas ninguém entende meu lado. Ninguém entende o quão sufocante era estar aqui. Eu realmente posso ter aberto a mão de várias coisas naquele período? Com certeza, eu não posso negar isso, eu me afastei do nosso relacionamento, mas eu nunca amei ele pouco. Nunca. Eu sempre soube que ele tinha a minha melhor versão, que ele era o único dono do meu amor.

Tento parar de chorar, mas o nó preso na minha garganta me deixa com mais vontade. Eu não vou aguentar isso, eu não vou conseguir fazer o que quero. A primeira coisa que vou fazer quando chegar em casa vai ser olhar passagens pra voar pra Itália.

Lá é o meu lugar, lá é longe de todo esse caos.

PODE FICAROnde histórias criam vida. Descubra agora