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Soraya
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_Papai? venha ver quem está aqui_ gritei do pé da escada.

Uma certa música tocava no seu radiozinho que tem na sua oficina, vi pendurado na bicicleta que era minha, o seu chapéu, o qual ele havia me dado.

_Onde será que está o seu avô?_ Henry apenas me olhou.

_Vovô... o vovô_

_É filho, seu avô, vamos atrás dele_ o peguei no colo, e fui subindo as escadas.

No andar de cima, tocava uma música também, e ela vinha do quarto dele, coloquei Henry de volta no chão, segurei em sua mãozinha, e seguimos o corredor, até eu parar na porta do seu quarto, logo um sorriso tomou conta do meu rosto, não quis logo lhe chamar.

Me surpreendi, ao ver, depois de tanto tempo, o meu pai dançando, novamente eu flagrava ele em uma dança de valsa, como se estivesse com alguém, dava os passos para um lado e para o outro, a primeira vez em que lhe flagrei dançando, eu tinha os meus quatorze anos.

_Filha, está muito tempo?_ ele me olhava envergonhado.

_Apenas o suficiente para admirar o senhor dançando_ vi uma roupa sobre sua cama.

_Ah, o que achou dessa roupa?_ me perguntou.

_Muito bonita, o senhor vai sair?_

_Hoje tenho um encontro_

_Um encontro? com quem?_ ele sorriu.

_Com uma amiga, minha filha_

_Hum, uma amiga?_ cruzei os braços.

_Você está parecendo a Soraya enciumada de quando tinha quatro anos_ falou.

_A é? o que fez eu ficar com ciúmes?_

_Você entendia um pouco das coisas, e eu avisei à você que iria sair, e você fez igualzinho, cruzou os braços e semicerrou esses olhos_

_Mas quem disse que estou com ciúmes, papai?_

_Sua mãe dizia isso também, e ainda ficava com os braços cruzados_ a gente sorriu quando ele falou isso.

_Então, se o senhor tem um encontro, deixa eu fazer sua barba, está grande_ falei.

_Vamos lá_ falou.

Henry estava entretido olhando desenho na sala com a Simone agora, fomos até o banheiro do seu quarto, passei a espuma de barbear, e ele já estava sentado em uma cadeira.

_Vou deixar o senhor bem charmoso pra impressionar essa sua amiga_ vi ele dar um sorriso.

_Relaxa filha, ela não vai ocupar o lugar da sua mãe_ disse tranquilo.

Fui passando a gilete, e como ele gostava também, o deixei com o bigode, saí para ele tomar seu banho, com um tempinho depois, ele me chamou, já estava com o seu terno.

_Me ajuda a dar o nó na gravata?_ sorri.

_Está muito charmoso papai_ elogiei.

Coloquei, penteei seu cabelo e ele foi até o rádio da cômoda e ligou, era a mesma música que tocava quando eu cheguei.

_Aceite esta dança com o seu pai?_

_Claro que aceito_ ele me deu seu braço.

Me juntei à ele, ouvi ele dizer que costumava dançar com minha mãe nas noites de domingo, quando ela estava grávida de mim, disse que ela se sentia bem.

_Convide sua Simone para dançar nas noites de domingo, Catarina vai gostar_ ele falou.

_Pode deixar, papai_ com mais alguns passos, deitei a cabeça em seu peito.

Queria que esse momento aqui com ele, não acabasse, queria dançar com ele e vê-lo dançar mais vezes, queria dar o nó em sua gravata para todos os encontros que ele fosse ter, eu só queria que ele ficasse um pouco mais.

_Eu te amo, papai_ sussurrei.

_Eu te amo, filha_ sussurrou também.

Nossos passos eram lentos, calmos, fechei os olhos, começamos a cantar baixinho alguns trechos da nova música que agora tocava, eu sorria quando errávamos alguma letra, sua risada era doce de se ouvir.

_Viva minha filha, dance com a pessoa que você ama, sorria mais vezes, se divirta com os seus filhos, seu pai está orgulhoso de você_ falou baixo, com a voz embargada.

Meu pai tinha orgulho de mim, essa é a coisa mais linda que eu poderia ouvir, me apertei mais em seu abraço, prometi que iria fazer tudo isso que ele falou.

_E mais uma coisinha... ame, você faz isso muito bem, o seu amor cura tudo_ beijou minha testa.

Nosso momento de pai e filha logo foi acabando, ele passou pela sala, se despediu do neto, sorri ao ver ele levantar o Henry e dar uma volta com ele no meio da sala, fazendo o pequeno soltar uma gargalhada gostosa.

Passei a mão pela sua cintura, ele fez o mesmo comigo, andamos pelo corredor de casa, e fomos descendo as escadas, passamos em sua oficina, ele pegou o boné e colocou em minha cabeça, me deu mais um beijo na testa e saiu.

Olhei ele indo em direção à uma casinha próxima da nossa, de lá saiu uma mulher loira, com um vestido longo cheio de bolinhas brancas enfeitando o tecido preto, de lá acenaram pra mim, e essa mulher se pareceu muito com a minha... mãe.

_Soraya, meu amor... acorde, Sol..._ escutei bem longe alguém me chamar.

_Espere um pouco, preciso..._ abri meus olhos, eu estava deitada.

_Meu amor... o seu pai... Sol, o seu pai..._ vi que Simone tentava dizer.

_O que tem meu pai? eu estava com ele agorinha amor_ falei.

_Sol, o seu pai morreu_ não, não, não, ele estava aqui.

_Não Simone, meu pai tava aqui, eu tava dançando com ele_ ela me olhava com os olhos tristes.

_Foi apenas um sonho, meu amor_ olhei na direção da janela, tava escuro lá fora.

Tirei rápido o lençol de cima de mim, saí depressa do meu quarto, indo na direção do quarto do meu pai, ele estava deitado, minha tia sentada ao seu lado, chorava como eu nunca a vi chorar.

_Não, papai... pai, por favor pai, não, não por favor, papai, pai, eu estou aqui, acorde papai, por favor_ implorei.

Me ajoelhei ali perto de sua cama, minha vista ficou embaçada pelas lágrimas que eu já derramava, seu rosto estava tão sereno, como se tivesse dormindo, mas agora ele estava em um sono profundo, e não ia mais acordar...
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🥺

A motoqueira da minha vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora