Capítulo - 24

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Sana dormiu a noite toda, mas não se sentia descansada. Sentia como se seus olhos estivessem cheios de areia, e a boca estava seca.

Sabia o motivo: Tzuyu não havia dormido com ela, não havia enrolado seu corpo grande quente em volta dela e a segurado bem perto. Mesmo dormindo saberia se ela tivesse ali.

No entanto Tzuyu nem se deitou com ela na cama.

Sana se perguntou aonde ela teria ido. De volta para casa, para repensar sobre o amor que havia lhe declarado na noite anterior?

Estava tão perdida em suas reflexões profundas que quase não percebeu Tzuyu sentada no canto do quarto. Ela se sentou tão rápido que, durante alguns segundos, tudo girou.

- Ainda está aqui? - Sentiu a garganta seca.

- Fiquei aqui a noite inteira.

Ela vestia o jeans da noite anterior e o cabelo estava virando nas pontas, como se houvesse puxado. Parecia tão horrivelmente tensa.

Apesar de se sentir como se fosse pegar uma gripe forte, Sana empurrou as cobertas e estava prestes a se levantar para atravessar o quarto quando ela perguntou:

- Tem tomado café desde que ficou grávida?

Ela franziu o cenho diante da pergunta esquisita.

- Sim.

Os lábios dela se apertaram.

- Ficou perto de gatos?

Por que a estava tratando dessa maneira? Como se fosse uma ré no banco das testemunhas. Como alguém que houvesse feito tudo errado.

- Sim.

- E cobertores elétricos e banheira quente? Usou algum dos dois?

Obviamente suas perguntas aleatórias deviam ter alguma ligação. Mas qual?

- Por que está me perguntando essas
Coisas?

Tudo doía agora, pior do que antes. Ela se encostou novamente na cabeceira da cama, puxando um travesseiro sobre o colo para se segurar.

A Chou tirou alguma coisa do colo. Era o livro O Que Esperar Quando Você Está Esperando.

- Passei a noite lendo isso aqui.

Ah, não. A médica havia avisado a elas sobre o livro, mas Sana não havia pensado muito sobre isso. Agora, via que deveria ter imaginado que Tzuyu faria isso, querendo proteger a ela e os gêmeos que carregava, deixando que todas as advertências do livro tomassem um tamanho desproporcional. mas antes que pudesse dizer qualquer coisa para acalmá-la, Tzuyu levantou-se da cadeira, segurando o livro aberto.

- Tem que arranjar outra médica. Não posso acreditar que ela nos disse que não tem problema fazer sexo. Aqui diz que quando vai ter gêmeos precisa ser extracuidadosa durante a gravidez.

- Tzuyu - ela disse com uma voz que esperava suar paciente sem ser condescente - Minha mãe teve oito filhos. Até agora está correndo tudo bem com a minha gravidez. Isso aí são só coisas relacionadas às piores situações. Sei com o que eu devo tomar cuidado.

- Então, o que me diz disso? Penetração profunda pode causar sangramento. Se ja sabia disso, então por que me deixou transar com você feito uma doida? Não dava pra ter ido mais fundo do que eu fui na piscina.

Sana tentou não perder a paciência de novo.

- Mostre para mim onde está escrito isso.

Ela só queria o que era melhor para Sana, ela tentou se lembrar, mas parecia ainda maior e mais forte do que nunca quando se levantou da cadeira e segurou o livro aberto na frente dela.

Mas, quando Sana leu o trecho ao qual ela se referia, estava cansada demais para deixar sua irritação de lado.

- Às vezes. Aqui diz que às vezes a penetração profunda pode causar sangramento e para não se preocupar até que realmente aconteça! Será que não consegue nem ler? Ou só cria palavras para servir aos seus propósitos mandões?

Uma onda de náusea misturou-se à frustração dela, mas, mesmo tentando sair desse estado de enjoo matinal, pôde sentir a temperatura no quarto esfriar pelo menos uns 12 graus. Durante todos os anos em que conhecia Tzuyu, nunca a viu desse jeito: tão distante, tão fria.

- Engraçado. Aqui estava eu tentando achar um jeito de contar a você - ela disse com a voz áspera -, mas você já descobriu.

Sana mal podia respirar com ela a olhando daquele jeito.

- Do que está falando?

- Eu mal consigo ler. - Ela grunhiu - É disso que eu estou falando.

O cérebro dela acelerou-se a medida que tentava raciocinar sobre o que ela estava dizendo. Tzuyu sempre foi dona do coração dela, desde os primeiros momentos em que a viu jogando futebol americano com seus irmãos no quintal. Entretanto, até essa semana, quando ela insistiu em passar um tempo juntas, não sabia o quão difícil foi a infância dela, nem dos detalhes de como havia construído o seu negócio maravilhosamente bem-sucedido a partir do zero. E ela definitivamente nunca soube que ela tinha problemas com a leitura. Ela nunca mencionou,nunca deu nenhuma pista sobre isso. Mesmo que houvesse lhe passado pela cabeça ela teria deixado isso totalmente de lado, por tudo o que ela havia conquistado.

Chacoalhando a cabeça em confusão, ela
Refutou:

- Mas você acabou de ler o livro de gravidez inteiro!

- Dez anos de professores particulares foram que me fez conseguir ler esse maldito livro. Nunca vou amar livros, Sana. Nunca. - A expressão dela apareceu ainda mais amarga. - Estava certa, lá no consultório médico, quando me chamou de idiota.

- Ah, meu Deus, Tzuyu. Não. Não quis dizer isso, você sabe. Estava assustada e chocada aquele dia no consultório, quando disse aquela coisa horrível a você - ela tentou se explicar. - Mas nunca poderia imaginar que você...

- Claro que poderia, Porque é verdade. - Ela apareceu mais agressiva, e fria, do que jamais a viu antes. - Será que não consegue perceber porque tentei tanto esconder isso de você?

A dor tomou conta de Sana por Tzuyu não ter lhe contado algo tão importante,por ter se esforçado para ter certeza de que ela não saber de algo tão importante sobre ela. Teve que cruzar os braços para sempre de chorar. Mesmo assim apesar de sua dor, não era verdade que esteve tão envolvida com a sua gravidez acidental, na esperança, nos sonhos e no medo de que Tzuyu nunca amasse do mesmo jeito que ela a amava, que não foi capaz de descobrir o segredo de longa data da Chou?

- Eu amo você - ela sussurrou. - Deveria ter me contado, deveria ter confiado em mim.

- Durante todo esse tempo, ficou dizendo que me amava, mas você ama só uma porcaria de fantasia. Não a mulher que eu realmente sou. Dê uma olhada, princesa. Dê uma boa olhada.

- Sei quem você realmente é - ela prosseguiu, mal conseguindo erguer a voz acima de um murmúrio.

- É mesmo? Você me conhece mesmo? Sabia que meu pai era um bêbado e o que mais gostava de fazer quando estava bêbado era me bater até me deixar roxa? Sabia que um dia a coisa foi tão ruim que eu peguei uma faca e o fiz sangrar? Sabia que quando ele bebeu até morrer eu nem liguei, que nunca derramei uma só lágrima por ele? Nós duas sabemos que não pode amar uma mulher como eu. Havia um motivo para eu nunca querer ser mãe. Eu não deveria ser mãe, não deveria transmitir essa genética podre para duas crianças inocentes. Mas você não podia me deixar em paz, não é? Não podia me deixar amá-la a distância para sempre e te manter longe de mim. Nunca deveria ter tentado convencer você de que eu era digna de me casar com você. Ou que poderia dar conta de ser mãe de duas crianças. Nós duas sabemos que vocês três vão ficar muito melhor sem mim.

- Por favor, não vá embora. Eu amo você.

- Não. Você não me ama. Você ama somente uma fantasia que não existe. Uma fantasia que nunca vai existir.

Ela se virou de costas para sair do quarto e ir embora, e, de algum modo, Sana encontrou forças para alcançá-la. Mas, antes que pudesse tocar as costas dela, o chão balançou e a dor espalhou-se por suas entranhas.

Tudo ficou escuro.

Só Tenho Olhos Para Você | Satzu G!POnde histórias criam vida. Descubra agora