Cap. 4 - O conto do balanço-pneu

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O quintal gramado da nova casa era enorme, cheio de canteiros de flores que contornavam as cercas. A coisa mais bonita e marcante era a árvore gigantesca bem ao meio. Aquilo foi muito nostálgico para Nathan, pois se recordou da antiga casa que tinha uma idêntica àquela. Foi lembrando também de quando pediu para David construir um balanço a partir de um pneu e cordas...

Alguns anos atrás

Entrou correndo pela casa com seu tênis que acendia a parte de trás ao pisar. Chegou às pressas em seu pai e pediu animadamente que o fizesse. Com preguiça, David foi procurar os materiais necessários, mas após dez segundos não conseguiu achar nenhum, dizendo ao filho que não teria como fazer. Desapontado, Nathan foi até a frente da casa e reparou em uma corda que escapava da boca do lixo e um pneu jogado a poucos metros dali. Ficou perplexo, pensando como David não enxergou aquelas preciosidades jogadas fora. Levou para dentro e entregou para seu pai que assistia TV. David olhou com uma cara de tacho e foi para fora fazer o bendito balanço, carregando o pneu e as cordas nas mãos. Após duas horas enrolando, estava pronto. Alegremente, o garotinho dos tênis que acendiam subiu nele, deu duas balançadas e o galho estourou, pois era fino demais. Nathan ficou observando a árvore e notou que havia galhos muito mais resistentes ao lado. Novamente perplexo, estranhou seu pai não ter notado.

Lily e Emily já tinham ouvido falar nessa história, e não hesitaram em correr para David e pedir para que fizesse um para elas. Ele achou rapidamente o pneu e as cordas, correu entusiasmado até o quintal e demorou incríveis dez minutos para terminar. Sem tirar que ficou tão resistente que se o planeta fosse explodir, as pessoas correriam para se proteger debaixo do balanço.

Enquanto Nathan passava o rolo encharcado de tinta azul na parede, podia ouvir as risadas de suas irmãs brincando lá fora.

— Oi, filho... — Sua mãe foi entrando.

— Oi. — respondeu emburrado, sem nem mover a cabeça.

— Que cor linda, né?!

— É. — Continuou seco nas respostas.

— Você tem um bom gosto...

A raiva circulava seu rosto naquele instante, mas a única coisa que fazia era continuar pintando no modo automático.

— O das meninas já está pronto, resolvemos pôr papel de parede.

— Ué — Ele franziu as sobrancelhas. —, você não disse que essas coisas eram muito caras?!

— É... Eu tava enganada... — respondeu pensando.

Nathan revirou os olhos e controlou seu estresse, pintando a parede com mais força no rolo.

— Você tá bravo comigo, filho?

— Não... — respondeu, encarando ela com sarcasmo.

— Ah, sim. Por um momento eu pensei que tava.

Ele juntou os lábios com mais precisão e continuou a fazer o que estava.

— E aí... Ansioso pra escola amanhã? — Nathalie continuou.

Ele respirou fundo, fechou os olhos e se virou para ela, abrindo-os.

— Eu não vou!

— Claro que vai. Vai parar de estudar?! — Cruzou os braços e se aproximou dele, disfarçando um sorrisinho.

— Vou, até a gente voltar pra casa! — Ele se afastou, pintando outra parte da parede.

— Aqui é a nossa casa agora, Nathan. Você sabe o quanto isso é importante pro seu pai. A gente veio porque o trabalho dele exigia.

— E por que não veio só ele?

— Ah, filho, porque daí você ia sentir a falta dele.

Nathan não moveu um músculo facial, só a encarou sem dizer nada, e voltou ao normal após alguns segundos.

— Ok, vou repetir a pergunta...

— Nathan! Amanhã cedinho, escola! — disse Nathalie, logo saindo.

— Eu já disse que não vou! — Ele tentou ir até ela, quase se levantando.

— Amanhã cedinho! — E fechou a porta em sua cara, novamente. Na terceira vez que ela fizesse isso poderia virar tradição de família.

Nathan se irritou mais ainda e descontou a raiva na parede, chutando a parte de baixo, o que fez os cantos de cima desgrudarem, despencando na direção dele. Arregalou os olhos, segurando com as mãos esticadas. Era de madeira e bem fina, portanto, a única dificuldade é que ficava cambaleando para os lados. O medo daquela coisa cair se misturou com seu olhar surpreso ao ver o outro lado.

— Nathan, o que aconteceu? — Nathalie retornou.

Nesse instante ele já havia voltado a parede de uma forma que pudesse mantê-la até sua mãe sair dali.

— Nada... — Disfarçou.

— Tá ok... — Nathalie sorriu. — Boa pintura pra você!

— Valeu... — Permaneceu com um sorrisinho forçado, aguardando sua mãe desaparecer corredor a fora para que pudesse pensar melhor no que fazer. 

A Lista MalditaOnde histórias criam vida. Descubra agora