Quatro

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Usei as primeiras semanas para ajudar meus irmãos a arrumar a casa. O primeiro passo foi se livrar do lixo e da poeira, o que nos deixou com roupas imundas, mas com um espaço limpo, amplo e agradável. Não tinham paredes, na verdade era mais um galpão do que uma casa. Deixaria os meninos à vontade para mobiliar e montar como quisessem. Tudo o que Nero os cedeu foram colchões relativamente novos, um para cada um, religou a eletricidade e internet. Nero costumava usar aquele lugar para trabalhar ao que parece.

Ana me levou para fazer compras na semana seguinte à nossa chegada, alegando que minhas roupas não eram adequadas. Eu usava tudo o que não servia mais nos meus irmãos, então estava sempre com roupas gastas ou largas demais. Ana comprou vestidos, blazers, camisas de abotoar e calças de sarja. Ela me fez experimentar alguns de novo em casa e mostrar para meus irmãos. Louis disse que eu parecia uma boneca, Drik dizia que estava legal, mas eu via o ressentimento por trás do sorriso. Sei que ele queria ter sido a pessoa a poder me dar todas essas coisas. Passei alguns dias grudada nele, com medo de que achasse que eu tinha de repente esquecido tudo o que fez por mim nos últimos doze anos.

Tate tinha voltado do hospital com o braço enfaixado, e tinha que passar pomada e gelo de hora em hora. Assim que ele entrou em casa, enquanto Ana me ensinava a preparar picadinho na cozinha, lágrimas encheram meus olhos e deixei a faca cair. Se não fosse o dom da moça, que fez uma planta próxima crescer além do normal e segurar o objeto, eu teria perdido um dedo. Ou dois.

O garoto sorriu ao meu ver, mesmo aparentando sentir dor. Tate segurou meu rosto com as duas mãos e beijou minha testa, limpando as poucas lágrimas que caíram com os polegares. Impulsos passeavam por meu rosto e mãos com mais frequência do que eu gostaria. Queimavam, doíam, me faziam querer arrancar os cabelos.

— Me perdoa — sussurrei, em um fio de voz. Minha garganta parecia arranhada.

— Auri, meu amor, eu nunca te culpei, sei que foi um acidente. Me impressiona só o quão forte você é. O que está fazendo?

Mostrei a ele, que acenou com a cabeça para Ana. Ela raramente se metia nas conversas que eu tinha com meus irmãos, embora ouvisse e visse a maior parte. Sempre que queríamos comentar algo mais privado, íamos até a casa da piscina. Nero estava sempre trabalhando fora de casa, só aparecia para o jantar. Era melhor assim, ele me assustava, mesmo sendo apenas um humano comum. Se botasse os pesos na balança, era Nero quem devia temer todos os demais.

Depois de um mês, eu já sabia cozinhas algumas coisas, tinha decorado meu quarto com plantas secas que achava no jardim e envernizava com um kit que Nero me deu, Tate tinha melhorado embora o braço tivesse ficado com uma cicatriz horrorosa. Eu passava meu tempo livre na casa dos meus irmãos, com medo de que um dia eles simplesmente fossem embora, como era o plano original. Quando tive uma crise de choro forte o suficiente para atrair uma pequena tempestade para a casa, Louis me agarrou pelos ombros e garantiu que nenhum deles iria embora sem mim.

— A gente vai embora quando? — perguntei um dia, balançando meus sapatos novos para lá e para cá.

— Quando o Círculo aparecer.

Sem uma mesa, Drik trabalhava com o notebook apoiado em uma cadeira que eu arrastei do segundo andar da mansão até ali, e sentava-se no chão, com as costas na parede. Não era a postura ideal, mas entre gastar dinheiro com roupas novas e móveis, acho que eles preferiram as vestimentas. Nero suprir a comida e eletricidade deu uma folga para eles. Louis realmente conseguiu um emprego bem rápido mesmo tendo ficha criminal, como garçom num restaurante próximo e ficava o dia quase todo fora. Tate... Bem, era Tate, as coisas não davam muito certo para ele. Então ajudava a limpar a casa principal como forma de prestar algum serviço ao casal que nos acolheu.

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