— Volta aqui — gritou Bea para Philipe. — Temos que conversar uma coisa antes de ir.
Ele não pareceu muito feliz por perder tempo, mas obedeceu ao desejo da amiga e voltou. Gael já tinha se recuperado do choque momentâneo e voltou a ficar de cara fechada. Seguiu Philipe até a garota, voando silenciosamente sobre a pilha de corpos. Havia algo entre 20 e 30 pessoas ali. Por mais que eu já tivesse visto muitas mortes, muito sangue e até matado em circunstâncias certas, aquilo ainda era um pouco demais para mim.
— Vamos voltar. Não tem por que ir à cidade — começou Bea, e obviamente Phil foi o primeiro a discordar.
— Temos uma missão — opinou o anjo.
— Que era reconhecer o local e salvar os soldados que ainda estivessem vivos. Não tem condições de nós quatro invadirmos uma cidade — fazia sentido, mas a verdade era que, depois daquilo tudo, qualquer coisa que Bea dissesse para nos tirar dali eu apoiaria.
— Não salvamos os soldados ainda — argumentou Phil. — Não estavam aqui.
— E nem estarão lá — comentei, me aproximando deles. — Gael disse que estão mortos. Ele ouviu de alguns homens enquanto estava preso.
— Vamos voltar — disse Gael, de forma definitiva. — Podemos retornar depois. Não tem por que correr riscos, arriscar nossas vidas e a de inocentes.
— A cidade está tomada. Se havia tantos homens aqui, há grande chance de lá ter ainda mais — a voz de Bea se mantinha constante, mas suas mãos tremiam, escondidas atrás de suas costas. Consegui ver sangue salpicado em suas roupas pretas. O que quer que tivesse acontecido antes de chegarmos abalou bastante a garota. — Não vou arriscar minha vida em uma missão suicida. Você pode ter seus jeitos de lidar com isso, mas eu não quero passar por algo assim.
Philipe não respondeu, mas pelo olhar percebi que ele entendeu que Bea estava com medo, que eu estava igualmente assustado e que Gael estava impaciente com a situação. Ele deu um longo suspiro e, por fim, disse:
— Me desculpa.
Aproximou-se da amiga e a abraçou. Ela não se moveu, mantendo as mãos junto ao peito, mas recostou a cabeça no ombro do anjo que tentava lhe confortar.
— Vamos embora.
Ela assentiu em silêncio, e eles saíram sob o céu ainda estrelado.
— Não comente com ninguém sobre isso — falou Gael para mim antes de partirmos. Olhei para ele, desconfiado — Em poucas horas, os homens de Simon devem chegar aqui e limpar tudo. Anansi não vai deixar isso passar se ficar sabendo.
— Mas se Philipe não tivesse feito, você faria. Você mesmo disse que não sairia daqui antes de matar todo mundo — retruquei.
Ele se aproximou o suficiente para que eu precisasse olhar para cima para encará-lo. À luz da lua, seu rosto brilhava em bronze, e seu maxilar se contraía levemente a cada passo.
— Existe um abismo de diferença entre eu fazer isso, tendo sido treinado para tal, e um bando de crianças resolverem cometer uma matança em uma floresta, tarde da noite. — Ele foi ríspido e direto. — Eu posso e consigo lidar com as consequências. Mas vocês? Principalmente você. Tome cuidado com o que faz por aqui. As pessoas podem ser muito cordiais, mas, na primeira oportunidade, vão te jogar em uma cela para apodrecer pelo resto da eternidade.
Ele estava agora a poucos centímetros de mim, olhando diretamente nos meus olhos, sem pestanejar.
— Não deixe eles vencerem.
Com um movimento das asas, Gael voou em direção a Lunis. Logo depois, eu o segui, deixando tudo para trás e tentando apagar aquilo da minha mente.
Quando chegamos na casa, a porta já estava aberta. Bea estava trancada no quarto, e Phil cantarolava na cozinha enquanto pegava algo para comer. Ainda estava escuro, mas eu acreditava que faltavam poucas horas para o amanhecer. Gael não ficou em casa, voando novamente em direção a Lunis assim que me viu entrar.
![](https://img.wattpad.com/cover/341949935-288-k698936.jpg)
VOCÊ ESTÁ LENDO
Sombras do Passado - Livro 1
FantasyPara pôr fim a uma guerra de anos, um tratado foi selado, Leonard e Tessa foram prometidos em casamento para o bem e a paz entre os reinos. Tessa era a princesa das bruxas, a filha da rainha mais amarga e perversa que já existira naquele reino enqu...