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Gritos, gritos e mais gritos estericos da mamãe. Quando ela surta ninguém suporta ficar em casa mas eu não estava no clima de sair então apenas desci para o porão e fiquei observando o homem esculpido na madeira, meu vô está sentado em minha frente enquanto molda. Tenho quase certeza de que oque ele está esculpido é uma coruja.

— Vovô Choi, você se lembra de mim?

Seus olhos opacos se voltaram em minha direção e ele demorou para responder oque arrancou algumas batidas angústiadas do meu coração.

— Que pergunta é essa garoto? É claro que eu me lembro de você. — Soltei a respiração que eu nem sabia que estava prendia.

— Que bom seu velho teimoso, eu ficaria muito chateado se você se esquecesse do seu netinho aqui.

Ele apontou a faca em minha direção por reflexo enquanto dizia.

— Velho é sua mãe!

Eu ri, bem alto.

— Deixa a Dona Carmen ouvir isso... Ela te coloca em um asilo rapidinho.

Ele deu de ombros.

— Um asilo não parece ruim em comparação a confusão lá em cima.

Girei sob as rodinhas da cadeira enquanto escutavao barulho da sua lâmina na Madeira seca.

— Qual é o o motivo da vez? — sei que ele não queria realmente saber, só perguntou por causa da minha inquietação.

— Uma mancha de batom na camisa do papai.

Ele ficou em silêncio apesar dos seus olhos entristecerem.

— Vovô?

— Sim Guto?

— As vezes eu queria ter sua mente. E não me recordar de certas coisas.

— E eu queria ter a sua.

— Mesmo sabendo que pode lembrar de coisas que te tragam arrependimentos? Muitas pessoas dariam uma parte do corpo apenas para apagar uma lembrança.

— Já eu daria uma parte do meu apenas para lembrar. — Estudei seu rosto concentrado. Seus olhos puxados com  marcas do tempo em sua testa nos cantos dos seus olhos.— Mesmo que eu lembre dos meus arrependimentos, das dores, tristezas e medo.

— Se vai lembrar do que doeu porquê ainda querer?— perguntei 

— Porque eu também lembraria de como eu os superei e de quem estava comigo.  As partes da vida que doem é a que nos deixam fortes.

Esbocei um sorriso encarando o teto.

— Agora eu quero ainda mais o seu cérebro. — Ele riu, uma risada que encheu o porão de um sentimento bom.— E assim você não se esqueceria de mim.— Susurrei.

— Oque disse?

— Nada. — me consertei na cadeira. — Quando sua estátua fica pronta?

— Quando eu terminar, oras.

Soltei uma risada.

  — Jura?

Ele me lançou um olhar divertido.

— Pare de pensar besteiras e me passe aquele martelo.— empurrei minha cadeira para perto da mesa e acabei derrubando algumas coisas pelo caminho. — Tome cuidado seu moleque! 

 — Não vou quebrar suas estátuas, são de madeiras.

— Não foi com elas que eu me preocupei.

 (Des) sintonizados.Onde histórias criam vida. Descubra agora