Capítulo 8

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Peregrina narrando

Após ser devidamente apresentada à todos, a reunião continuou. Se eu achava Juca amedrontador, esses caras pareciam mil vezes piores.

Eu já tinha noção do que aconteceria ali, mas observando tudo com meus próprios olhos, era desesperador. Eles simplesmente decidiam sobre a vida de uma pessoa como se não fosse nada.

Fazia algum tempo que eu me envolvi no crime. No começo apenas quebrava uns galhos para os envolvidos. Fiz amizade com os meninos e eles me envolviam em corres que me dariam mais dinheiro.

Com o passar do tempo, VS me colocou para trabalhar no asfalto. Eu entregava drogas para todo o tipo de gente, até mesmo para pessoas consideradas importantes no meio de negócios diversos.

No entanto, eu nunca havia participado de situações desse nível antes. Já cobrei pessoas, até já fui paga para bater em algumas outras. Mas decidir sobre quem vive e quem morre estava bem longe do meu convívio.

- O bagulho é esse, mano. - Juca conclui depois de mostrar todas as provas. - Está tudo aí. O cara foi pilantra, agiu de má fé e roubou a banca.

- É isso aí mesmo, irmão. - um cara concorda. - Esse verme agiu na pilantragem.

- Mas e aí, PH? Vamos deixar a vida do cara nas mãos dessa mina que chegou agora? - um outro duvida, me olhando com indignação. Um arrepio passou pelo meu corpo, mas eu continuei do mesmo jeito.

- Quer dizer o quê com isso, Marconi? - Juca se mexe ao meu lado, parecendo cada vez maior, a postura rígida. - A mina é de confiança.

- Estou ciente disso, patrão. - ele vacila um pouco. - Mas o cara é cria nosso.

- E porquê ele é nosso cria, que ele tem o direito de ficar vacilando? - PH questiona irritado. - Ele traiu o movimento.

- É isso, irmão. - um baixinho concorda. - Às contas que a dona aí fez estão batendo, não estão? Tem mais dúvidas de quê?

- Então é isso, meus irmãos. - Marconi aceita a decisão por fim. - Vocês estão certos.

- Abre a boca aí, verme. - Juca dirige a palavra ao antigo contador. - Dá a tua versão.

O homem tremeu no instante em que foi citado. Seu corpo vacilou e ele deu um passo em falso. Entretanto, não demorou muito para que ele arrumasse a postura.

- Talvez eu só tenha errado os cálculos, mano. - fala com a voz trêmula. - Jamais agiria na pilantragem com vocês.

- Aí a tua explicação vai ser que tu anotou errado? - PH dá risada.

- Qual foi? Vocês sabem que as vendas decaíram nesses últimos meses. - se defende.

- Claro que decaiu. - Juca abre os braços. - Você estava roubando o meu dinheiro, comédia.

- Mal tinha produtos pra vender, patrão. - fala choroso. - Me ajuda aí, meu padrinho. Eu não roubei ninguém não.

Padrinho? Então é por isso que o tal Marconi estava defendendo ele, e me inferiorizando.

- Conta outra, menor. - Juca fala irritado. - Gastei a maior parte do meu dinheiro comprando produtos.

- Boto minha palavra nisso também. - PH confirma. - Eu fui um dos que estava na frente da compra, pô. Como que não tinha produto?

- Eu só errei, mano. - o antigo contador murmura. - Por favor.

Eu estava nervosa, e eu sequer estava sendo julgada. Conseguia imaginar o desespero que o homem devia estar sentindo naquele momento.

- Não tem essa agora. O seu erro custou muito dinheiro ao meu bolso. - o mais velho finalmente virou o corpo para me encarar e me lançou um olhar sério. - Solta a voz, Peregrina.

E quando eu achava que não tinha como piorar, o destino resolvia zombar da minha cara.

Eu simplesmente não sabia o que falar. Não queria ter que dar o xeque-mate na vida de alguém. Não queria sujar minhas mãos dessa maneira.

- Precisamos ouvir o que tem pra dizer, Peregrina. - respiro fundo quando ouço PH falar meu vulgo.

- E-eu... - tento argumentar, mas acabo por gaguejar miseravelmente. - Assim como Juca citou mais cedo, foram dadas provas sobre a divergência dos valores apurados.

Engoli em seco, direcionando meu olhar a Juca, o qual balançou a cabeça me incentivando a continuar. Querendo ou não, me deu uma certa confiança.

- Se quiser insistir que foi apenas um erro, tudo bem. - olho para o ex contador. - Mas você tem que admitir que errou em todos os cálculos.

- O que você sabe sobre isso? - ele questiona em total indignação pela minha acusação.

- Sei mais do que você pelo visto. - retruco. - O fato é que você prejudicou terrivelmente os negócios.

- É isso, meus irmãos. - Juca torna a falar. - As provas estão aí, e já comentamos sobre o bagulho. Por mim é pau no gato, sem massagem.

- Meu aval é o mesmo. - PH confirma. - Não tem outro papo.

- Por favor, patrão. - o julgado implora, as lágrimas escorriam por seu rosto. - Me dá uma chance, mano.

- Uma chance? - os caras riem, pouco se importando com o choro do homem. - Por que eu deveria te dar uma chance, se você nem tem a capacidade de assumir o teu b.o?

Vejo o exato momento em que o corpo do homem vacila mais uma vez. Ele parece pensar um pouco, e logo volta a falar.

- Eu confesso que tirei uma parte do dinheiro uma vez. - todos os presentes soltam murmúrios indignados. - Mas foi porque eu estava precisando.

- Então temos uma confissão? - meu patrão pergunta em um tom irônico. - Era só isso que eu precisava ouvir para ter a certeza.

Não havia mais caminhos a seguir. O ex contador cavou sua própria cova ao assumir o erro. E assim foi tomada a decisão final.

O caminho para casa foi silencioso. Eu tinha tanto a falar, mas as palavras não saiam. Na verdade, eu estava com medo. Medo de que se algo saísse do controle, eu teria o mesmo destino.

- Sã e salva. - Juca fala ao estacionar enfrente a minha nova casa.

Até quando? Penso em suas palavras. Isso tudo é uma droga. Eu devia ter pego minha mãe e fugido para bem longe desse lugar. Devia ter ludibriado VS e deixá-lo sozinho com seus próprios problemas.

Agora eu estava aqui, sozinha e sem ninguém de confiança. Precisando segurar todas as minhas emoções para não parecer fraca. Pisando em ovos todo o maldito tempo.

- Eu estou ligado que o bagulho lá encima foi demais pra você. - direciono meu olhar para o dono da voz. - Mas você vai ter que se acostumar, Peregrina. Aquilo lá é o mínimo das barbaridades que acontecem aqui.

Engulo em seco. Se tudo o que aconteceu foi o mínimo, eu nem queria pensar no que estava me aguardando a seguir.

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