Capítulo 17

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Peregrina narrando

Subimos aquele morro todo a pé, eu estava pra morrer ali mesmo. Meu coração quase saindo pela boca.

- Não aguento mais, vou passar mal. Puta merda... - murmurei, jogando meu corpo encima do de Cobra.

O mesmo me sustentou, abanando meu rosto com uma mão. Sinceramente, eu tinha esquecido como era andar tudo isso a pé. Estava me acostumando a sempre receber uma carona lá na minha nova casa.

- Deixa de onda. - Matheus me puxou para voltar a caminhar, e eu arregalei os olhos pelo susto.

Cobra não gostou muito dessa atitude, já que o vi fechar o semblante mais ainda. Aliás, ele parecia estar irritado desde a hora que chegamos.

Finalmente chegamos na central, e eu comemorei mentalmente. Entramos com tudo dentro da salinha, e eu já fui procurando um lugar pra sentar. Sequer olhei pra quem estava dentro da sala.

- Alguém pega uma água aí pra mim, na moral. - pedi, sem papas na língua. - Calor do cão.

- É assim que tu diz oi depois de tempos?

Revirei os olhos ao ouvir a voz de Iago. Procurei ele pela sala e fiz careta assim que meus olhos se encontraram com os dele.

- Oi, Iago. - cumprimentei com escárnio. - Quanto tempo, não é? Como você está?

Ele resmungou algo, provavelmente algum palavrão, mas não foi possível ouvi-lo.

Sinalizei para que Cobra sentasse ao meu lado, no entanto, ele negou. Ele estava muito bem posicionado enfrente a porta da sala. Parecia um segurança, observando tudo e todos.

- Me diz aí, Peregrina. - VS falou pela primeira vez desde que cheguei. - A que devo a honra da sua visita?

- Vim visitar meus velhos amigos. - abri um sorriso, mas no fundo era totalmente falso. - Já estava na hora não é?

- E precisava trazer um segurança com você?

Ouvi uma risada baixa, e todos nós olhamos em direção a mesma. Cobra balançava a cabeça minimamente, sorrindo divertido. Eu amava o fato dos caras de Juca se garantirem no deboche e na marra.

- Tá rindo de quê? - Iago questionou contrariado.

- Vocês são incomodados pra caralho, tomar no cu. - ele cospe as palavras com irritação. - Sou segurança de ninguém não.

- E tá aqui por quê então? - foi a vez de VS perguntar.

- Porque a Loira agora trabalha pra gente. - dá de ombros, como se fosse óbvio. - E nós não deixamos um dos nossos sozinho.

Eu queria rir. Ele estava claramente tentando provocar os demais. E pelo visto estava obtendo êxito.

- O que está querendo dizer com isso? - VS levantou exaltado. Estava soltando a franga. - Está dizendo que eu deixei alguém pra trás? Manda o papo.

- Eu não falei nada. - abre um sorriso ladino. - Só falei sobre como minha gestão age.

Decidi intervir antes que a situação piorasse. Pois a qualquer momento as pequenas afrontas poderiam evoluir para algo mais forte.

- Eu só vim aqui pra visitar minha coroa. - falo, levantando de onde estava sentada e indo pra perto de Cobra. - Faz tempo que não vejo ela.

- É, mas nós temos que trocar uma ideia. - apenas balancei a cabeça concordando.

- Mais tarde eu encosto aqui. Agora vou pra casa, tchauzinho pra vocês.

Aceno com a mão e mando beijo no ar, empurrando Cobra pra que ele saísse da sala. Fomos caminhando até minha casa em silêncio, mas eu ainda teria uma conversa bem séria com ele.

Já enfrente de casa era possível sentir o cheiro delicioso da comida da minha coroa. Era horário do almoço, e minha barriga roncava.

Abri o portão na maciota e entrei em casa na ponta dos pés. Fui até a cozinha no sapatinho e observei a mais velha de costas. A mesma lavava a louça na pia, enquanto cantarolava um louvor.

- Nunca vi mais gostosa! - exclamei alto.

- Puta que pariu!

Abri um berreiro quando a mais velha pulou de susto e acabou jogando um copo de vidro no chão. Eu dei tanta risada que senti minha barriga doer.

- Ana Rayssa, você quer me matar do coração? - ela fala chorosa vindo me abraçar.

- Bença, mãe. - aperto forte ela em meus braços. - Senti tanta saudades.

- Que Deus te abençoe, minha filha. - beija minhas mãos. - Por que veio sem avisar? Eu teria feito um almoço especial.

- Quis fazer uma surpresa. - dou de ombros. - Mãe, esse aqui é o Cobra.

- Cobra? - arqueia a sobrancelha. - Que nome feio é esse?

- Mãe! - repreendo ela.

- Satisfação, tia. - ele cumprimenta ela na maior educação, esticando a mão para ela.

- Que negócio de satisfação que nada. Aqui é prazer mesmo. - franze o cenho. - E vem logo me dar um abraço.

Cobra arregalou os olhos quando minha coroa puxou ele para um abraço. Gesticulei com as mãos para que ele abraçasse ela de volta.

- Ai, meus filhos. - ela põe a mão no rosto. - Deixa eu limpar esses cacos. Cuidado para não se machucarem.

Esperei que ela voltasse com uma pá e a vassoura, e tomei de suas mãos. Entreguei os objetos para Cobra, que me olhou confuso.

- Limpa aí. - aponto para os cacos. - Cuidado pra não machucar, lindo.

Abro um sorriso pra ele e incentivo ele a ir limpar. Cobra me olha indignado, mas me obedece. Vejo ele soltar a mochila encima de uma cadeira e ir juntar os cacos.

Aproveitei o momento pra agarrar minha coroa e encher ela de beijos. Logo menos ela já estava me enchendo de porrada.

- Dona Alzirene, dona Alzirene... - comento com a boca cheia de comida. - Que saudades que eu estava disso aqui.

- Fecha a boca, garota. - me repreende. - Essa menina não tem modos. Desculpa viu, meu filho.

Reviro os olhos ao notar ela sorrindo para o meu amigo, que já estava cheio de intimidade com minha mãe.

- Mãe, tenho uma notícia pra senhora.

- Ave Maria. - larga o talher no prato e me encara. - Lá vem você com suas coisas.

- É sério. - ela não botava fé em mim, incrível. - Vim buscar a senhora.

- Como assim, garota?

- Temos dois dias pra arrumar tudo aqui e meter o pé para o Complexo do Japão.

- Assim do nada? O que está acontecendo?

- Não vou mais voltar pra cá, mãe. Não estou mais trabalhando para o VS, e ele não é uma pessoa confiável. - falo baixo, pois aqui as paredes tinham ouvido.

- Aquele desgraçado fez alguma coisa?

Apenas nego com a cabeça e continuo a comer. Agora a velha não fechava a matraca e me enchia de perguntas.

- Está tudo bem, tia. - Cobra tranquiliza ela. - Mas nosso patrão quer que sua filha faça morada lá, então só queremos agilizar as coisas.

- Certo. - ela sorri pra ele, e eu fico boquiaberta olhando aquela falsidade. - Não vai me fazer falta, não gosto de ninguém daqui mesmo.

Bom, pelo visto tudo sairia melhor do que eu imaginava. Achei que seria mais difícil dela aceitar a mudança.



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