A besta

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As orbes negras se arregalaram em um tremor em sua porta.
Pelos céus, jamais se acostumaria a aquele lugar louco.

Desde o jantar, acreditava que todos seriam anormais, sabia que seriam.
As iris dilatadas eram sinais de perigo, os Alfas da mesa o olhavam de forma tão impura, como se seu Alfa não estivesse ao seu lado, como se seus Ômegas não estivessem os acompanhando, como se seu filhote sequer estivesse brincando em seu colo.

Isso era assustador, o tirando um tremor em seus pés, o calafrio arrastou em sua espinha em sintonia com o som de algo afiado deslizando pelas paredes dos corredores da mansão.

No dia que chegou, estranhou que as paredes pareciam em uma eterna obra, a tinta era fresca e seu cheiro era forte, agora, sua teoria banhava a ideia de que talvez fosse algum Alfa descontrolado madrugada a dentro.

Em um passo desajeitado, se levantou da cama, abraçando seu filhote em seu colo.

Estranhava o fato de que sequer poderia dormir junto ao seu Alfa, ao contrário de muitas coisas que diziam na vila Ômega.
Diziam que todas as noites seu Alfa iria desfrutar de seu corpo, porém não foi o que aconteceu, era sua terceira noite e não havia sido cortejado novamente.

O bebê sorriu para si, reconhecendo que o papai Ômega o pegava no colo, enquanto os grunidos assustadores soavam pelo lado de fora, um estrondo contra a porta soou, o fazendo se assustar imediatamente, um grito involuntário escapou de seus lábios, resultando em mais um estrondo.

Seja quem for o Alfa descontrolado no lado de fora, sabia que ele estava ali, uma presa suculenta e indefesa, com um bebê ainda mais indefeso ainda.
Se ao menos seu alfa estivesse ali...

Seus olhos percorreram o quarto, não teria o que fazer, aonde quer que se escondesse, o Alfa sentiria seu cheiro e iria o matar, isso se não fosse pior e ainda encontrasse seu bebê se o escondesse em um local diferente.

Um arrepio, um suspiro, foi o que conseguiu pensar, quando a porta se abriu em um estalo único, seu corpo foi como reflexo contra o vidro da janela, era o primeiro andar, não havia muito o que se preocupar além dos cacos estilhaçando sua pele dolorosamente.

Rapidamente, checou se seu bebê estava bem, sorrindo ao vê-lo apenas o encarando confuso, era incrível um bebê julga-lo com os olhos, sendo que possuí menos de um mês de vida.

Se levantando fraco, correu o quanto pôde, o quanto conseguia, sabia que sim, sua vida dependia disso, a sua vida e de seu filhote estavam em risco constante enquanto não saísse da mira deste alfa.

Enquanto corria, seu peito apertou, o ar faltou, óbvio que o vidro se quebrando faria uma barulheira insuportável, qualquer Alfa com a menor audição possível escutaria esse barulho de longe.
Em um choramingo, manteu o ritmo da corrida, ainda que o som da asma chiando em cada puxada de ar pela boca, fosse alto, continuou a correr, ignorando que agora não era apenas um som, mas sim vários, atrás de si.

Eram muitos.

Em tropeços, se aproximava da saída da vila Alfa, a mansão que o seu Alfa morava ficava na ponta extrema, aonde bastava correr na direção da floresta e já estaria se sentindo mais seguro do que no meio de tantos outros Alfas descontrolados.

Pelos céus, como aqueles Ômegas loucos tinham coragem de se manter lá?

- Aonde pensa que vai? - a voz grave soava em sua cabeça

Por um momento, havia esquecido de que estava vinculado a mordida do alfa, estava marcado, então ele saberia de sua fuga.
Como não pensou em pedir socorro? Óbvio que não pediria, mesmo que se lembrasse, era obrigação de um Alfa perceber o perigo vindo contra seu Ômega e correr o quanto fosse necessário para protegê-lo, independente do quanto correria naquele instante, ele deveria protegê-lo... Certo?

A imagem do enorme Alfa de pelagem negra-acizentada surgiu a sua frente, as orbes eram rubras como duas pedras vibrantes de rubis, o fazendo se tornar ainda mais aterrorizante aos olhos apavorados do Ômega.
As garras agitadíssimas tocavam a árvore ao lado como se não fosse nada, a rasgando com um movimento.
O enorme estrondo no centro daquela floresta atraiu a atenção dos demais para aquele ponto específico.

Hyunjin engoliu seco, aquele Alfa não era um descontrolado, ele tinha noção perfeita do que fazia, do que falava, de como o fazia, por isso não o atacou, ele queria vê-lo sofrer.

Hyunjin não perdeu tempo, não daria meia volta, seria loucura, corajosamente, correu na direção do alfa, porém antes de sequer chegar próxima das garras perigosas, desviou, o contornando com extrema facilidade, tal facilidade que era estranha.

O Alfa deveria ser mais rápido, não deveria?

Suas sobrancelhas se franziram, conseguia ver perfeitamente bem a grade da vila Ômega, ele estaria seguro, faltava pouco, já já estaria seguro e em descanso, bastaria...

- Você está tentando fugir do quê, Ômega? - os olhos de Hyunjin se arregalaram, aquela voz não vinha de sua cabeça, vinha daquela criatura que a pouco havia contornado - Acha que seu Alfa vai vir salva-lo? Como pensa que ele viria? Um morto não pode andar.

As lágrimas escorriam lentamente dos olhos de Hyunjin, isso era mentira, certo?
Ele sentiria, certo?
Ele estava apenas delirando, eram vozes, vozes da sua cabeça, não era real, não podia ser.

- Ele morreu, seu imprestável... E vocês dois também vão, só assim o trono será unicamente do meu alfa. - aquela criatura enorme novamente surgiu em sua frente, antes de arrancar seu bebê de seu colo com um golpe.

O grito extridente soou, Hyunjin sangrava, seus braços arrancados ainda estava abraçado aos pedaços decepados do que a segundos atrás deveria ser o seu bebê.
Aquele enorme monstro -se negava a acreditar que se tratava de um Ômega- se aproximou de si, jurando ver um esboço de um sorriso no enorme fucinho ensanguentado da criatura.

As garras gigantes entraram em seu estômago, o atravessando completamente enquanto sangue jorrava de seus lábios.
Seus olhos se reviraram, sentindo com detalhes as garras afiadas e grossas subir até sua cabeça ser jogada para longe de seu corpo.

Sua vista se embaçou de imediato, seu cérebro por sete longos segundos ainda custava a funcionar, enquanto seu coração falhava as últimas batidas.

Seus olhos arregalados opacos, voltados ao corpo retalhado do pequeno e inocente bebê recém-nascido.



Quando piscou, gritou apavorado, se sentando às pressas na cama de casal, sentindo o peso em sua cintura.

O Alfa albino o encarava preocupado, as constantes noites de pesadelo de seu Ômega o assustava, chegando por vezes a acordar seus filhotes.

- Mais pesadelos, amor? - Yongbok questionou, sorrindo fraco quando o Ômega afirmou tímido, voltando a se deitar e aproveitar do calor do alfa.

Ele estava finalmente se acalmando, foi só um pesadelo ruim.
Aonde já se viu? Aonde alfas viravam monstros ruins? Alfas eram tão bons, tão... Submissos... Não é atoa que eles eram obrigados a trabalhar como escravos até madrugar em empresas enquanto os Ômegas apenas cuidavam de bebês e limpavam a casa... Isso é, se quiserem, caso contrário algum empregado faria.

Um sorriso soprado soou, antes de abraçar seu Alfa com carinho.

- Eu quero bolo de arroz com pistache e chocolate. - o Ômega pediu fraco, recebendo um olhar indignado do Alfa.

Pelos céus, sempre que estava prenho, Hyunjin tinha desejos horríveis para comida.

Era o oitavo filhote do casal, pareciam mais coelhos do que lobos, mas o que podia fazer? Eram apaixonados.
E tudo isso? Era apenas um pesadelo.

A obra, O Filho Da Besta ( Hwang Hyunjin Centric )Onde histórias criam vida. Descubra agora