Capítulo 73

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Mariah

Desperto de repente, olho para janela e vejo que ainda está tudo escuro. Pego meu celular e são exatamente 03h14 da manhã, com muita cautela me desfaço do abraço de Benjamin que dormiu comigo hoje e vou até a minha cozinha. Pego um copo de água e me encosto na bancada para beber o líquido.

Minha mente me leva para longe, pensando em tudo o que eu vivi nas últimas horas. Meu coração se alegra na mesma intensidade que se enfurece. Não tenho raiva de Amélia, nem um pouco. Estou muito realizada pelos céus terem escolhido essa mulher tão iluminada e persistente para me dar a luz. Mas me enfureço por toda a situação em que fomos colocadas, eu não merecia isso, ela também não. A vida não tem dó de ninguém, e mesmo que eu a ache maravilhosa, também a acho cruel.

Sei que sou uma mulher privilegiada no quesito financeiro, filha de um médico multimilionário, dono de uma rede de hospitais mundialmente conhecida. Sempre tive dinheiro a rodo para gastar sem precisar me importar com as contas no fim do mês, tinha o celular do ano e assim que fiz 18 tinha o carro do ano também. Estudei nas melhores escolas da minha cidade, no meu tempo livre eu aprendia mais um idioma. Resumindo, com o dinheiro do meu pai, eu tinha o mundo aos meus pés.
Mas aquilo que eu não pagava com dinheiro, eu pagava com a alma.

Meu pai não estava presente em minhas apresentações escolares, nas minhas formaturas, nas reuniões de pais e mestres. Ele não tirava um tempo para estar comigo, para me dar atenção ou me levar ao shopping nem que por 10 minutos. Marcelo sempre me dizia que o seu tempo valia muito e que ele não poderia gastar com besteiras, ou seja, acho que eu nunca signifiquei muita coisa pra ele.
Em contra partida, do outro lado do mundo, estava a minha mãe que tentava de tudo para me ter perto dela novamente. Para me oferecer carinho, atenção, colo, afago. Tudo o que eu sempre sonhei em ter e o meu genitor não me deu oportunidade. Ele não me ofereceu isso e me tirou de perto de quem poderia o fazer.

Me lembro com clareza da minha tristeza ao ver os pais de todos os meus coleguinhas de classe se emocionando e orgulhosos na plateia enquanto eu nunca vi ninguém fazer isso por mim. Respeito e admiro muito a profissão do meu pai, ele gasta seus dias salvando vidas. Só que ele nunca percebeu que matava a sua filha com suas ações e palavras. Todas as coisas cruéis que ele direcionou a mim estarão sempre marcadas no meu ser, será eternamente uma ferida aberta. Mas nada se compara a dor da sua ausência. Implorar por atenção de um homem que já tinha o suficiente para nunca mais trabalhar ou só o fazer por uma vez na semana, doía muito. Dói até hoje. Meu pai tinha condições de dar toda atenção que uma criança precisava, que eu precisava e pedia para ter, mas nunca obtive por ele ser um homem egotista e ganancioso, sempre buscando por mais.

Queria que as coisas pudessem ter sido diferentes. Sou grata por tudo que vivi e passei para chegar até aqui, mas sou humana e sei que tudo poderia ter sido mais leve, mais cheio de amor.

Olho para janela e vejo que o dia já começa a clarear, no relógio da cozinha aponta que são 4h58. Deixo o copo na pia e volto para o meu quarto me deitando ao lado de Benjamin que de prontidão enrola seus braços ao meu redor me puxando para mais perto. Ele murmura um "eu te amo" e quando eu respondo, ele volta a dormir.

Esse cara sim merece o meu coração. Benjamin abraçou minhas guerras totalmente disposto a tomar a frente de minhas batalhas. Ele enxugou minhas lágrimas e me acolheu no seu abraço. Ele errou, mas se redimiu. Ele nunca mais botou uma gota de álcool em sua boca, e sei que faz esse sacrifício por ele e mim também. Benjamin vibra por todas as minhas, até mínimas, vitórias. Ele me aplaude de pé, grita por mim e apoia todas as minhas loucuras.
Benjamin é o cara certo pra mim! E é nos braços dele, totalmente em segurança, que eu adormeço.

Acordo, vejo que Benjamin já se levantou e tem alguém como ele na minha sala, imagino ser Manu ou Jordan já que hoje temos ensaio geral. Vou até meu banheiro tomo um banho rápido e visto uma roupa confortável. Quando termino de escovar meus dentes começo a escutar uma discussão, os gritos invadem os meus ouvidos. E de imediato, eu reconheço a voz que está junto a Benjamin.

É o meu pai. Ele está aqui, ele está na minha casa.

Antes de ir até o encontro deles, por um impulso, eu ligo para Amélia contando que meu pai está aqui e a mesma diz que está vindo para minha casa. Passo meu endereço por mensagens, respiro fundo e vou até o encontro deles dois.

Chego na sala e a cena é caótica. O meu pai se encontra com o maxilar vermelho e Benjamin, passível autor desse ato, está do outro lado do sofá com os braços cruzadas e com a expressão mais furiosa do mundo. Eu nunca o vi dessa forma.

Mariah: Parem de gritar, a cidade inteira deve estar escutando o escândalo. - eles me olham - Marcelo, o que faz aqui?

Marcelo: Marcelo? Deu para me chamar assim agora?

Mariah: Foi você quem disse que não era mais meu pai, estou apenas seguindo suas ordenes. - o desdém é óbvio em minha voz - Me responde, o que faz em minha casa e ainda por cima gritando com o meu namorado?

Marcelo: Você sempre teve péssimas escolhas, não me surpreende ter escolhido um babaca em formação, um qualquer, para ser seu namorado.

Mariah: Dobre sua língua para falar de Benjamin, ele já fez mais por mim do que você durante a minha vida inteira. De uma vez por todas, me responda! Antes que eu chame os meus seguranças - nem tenho um - para te tirar daqui a pontapés! - respiro fundo - O que veio fazer aqui?

Marcelo: Vim atrás de notícias suas, você me bloqueou em todas as suas redes, até o meu número de telefone. Só tenho notícias suas através de sites de fofocas e não gosto da maioria! E ontem, quando eu estava indo para casa, vi fotos suas com aquela mulher. Ela não pode se aproximar de você Mariah, ela é uma oportunista.

Mariah: Oportunista? Cale a sua boca!

Marcelo: Me respeite!

Mariah: Te respeitar uma porra - o linguajar que não costumo usar sai de meus lábios de tanta raiva - Você está dentro da minha casa, você só será respeitado se respeitar a mim e a minha família!

Marcelo: O que quer dizer Mariah? Eu sou sua família! - Ele diz como se eu tivesse o acertado com uma faca

Mariah: Não, você não é! - grito - Minha família sou eu mesma que passei por diversas coisas sozinhas para conquistar o meu espaço, conquistar os meus sonhos. Minha família é Benjamin que além de namorado é o meu melhor amigo e maior incentivador. Ele me aplaude de pé, mesmo com toda a correria de sua vida e compromissos inadiáveis, nunca deixou se estar ou se fazer presente em momentos bons e ruins da minha vida desde que nos conhecemos. Minha família é a família de Ben que me abraçou, me acolheu e me fizeram enxergar a vida de uma visão mais bonita. Pessoas que me colocaram para dentro de sua casa e de suas vidas sem me conhecer direito. Minha família é Miguel, sua esposa e sua filha que apoiaram o meu sonho de imediato, que se sentem felizes em me ver feliz. Minha família é Amélia, a minha mãe, que mesmo com tudo o que você aprontou para que ela nunca tivesse acesso a mim, nunca desistiu de lutar de me acompanhar e de me amar com todo o seu coração. Ela sente orgulho de mim desde dia que descobriu que me esperava, ela nunca pensaria em me forçar a seguir um caminho que eu seria totalmente infeliz só para realizar seus próprios caprichos. Se você não tivesse estragado tudo, ela nunca faltaria uma apresentação minha e nunca me deixaria a deriva em minhas formaturas. Amélia nunca iria priorizar o trabalho ao invés de mim, a profissão ao invés de mim, o dinheiro ao invés de mim. Amélia gastou sua vida para me ter de volta desde que você a afastou de mim. Amélia mesmo te odiando jamais faria isso com você, porque ela sempre pensaria em mim. Amélia, que eu descobri ontem que era minha mãe, já tem um lugar muito mais importante na minha vida do que você. Eu sei que você não me considera sua filha faz tempo, mas saiba que eu também não te considero meu pai - Corro para os braços de Ben que me acolhe acariciando meus cabelos e beija minha cabeça

Ben: Calma, meu amor! Estou aqui, tudo bem? - eu assinto - Quer um pouco de água? - eu assinto novamente e ele vai buscar, mas avisa meu pai antes - Não chegue perto dela se não eu te quebro e com muito prazer. - Meu pai não reage, parece assimilar tudo o que eu disse a pouco.

Ben traz minha água e vai atender a porta quando a campainha toca. Amélia chegou enfurecida
com algumas sacolas em mãos que entrega a Benjamin e logo se aproxima de mim me puxando para um abraço, onde eu desabo mais uma vez

Amélia: Marcelo, eu realmente espero que não tenha dito bobagens para minha filha. Porque você e a megera da sua mãe podem ter a afastado de mim por um tempo, mas agora eu estou aqui para a defender com unhas e dentes e se para isso é necessário matar você, pode ter certeza que eu o farei. E sem peso nenhum na consciência.

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