𝓑efore

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Eu não gosto dessa meia-calça

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Eu não gosto dessa meia-calça. Ela faz minhas pernas coçarem. Eu também estou usando saias. Eu não gosto de usar saias. Mamãe não me deixava usar saias. Por que eu estou usando saias?

Eu olho de um lado para o outro ao redor da sala de estar da casa em que eu morava, está abarrotada de gente. Algumas pessoas eu conheço, outras não. Por que todas elas vestem preto? Por que eu estou vestindo preto?

— Leighton — papai? Eu giro em meus pés, virando meu corpo na direção de sua voz — Seu tio chegou. Ele ficará com você agora — atrás dele, eu enxergo os ombros de meu tio Vince. Ele está olhando para mim e parece triste. Por que você está triste, tio Vince?

Ergo meus braços para ele, pedindo um abraço. Eu estou aqui, tio. Vamos nos abraçar. As suas mãos se encaixam embaixo dos meus braços e me puxam para o seu colo. Eu escondo meu rosto em seu pescoço.

— Como você consegue ser um animal em um dia como esse, Owen? — meu tio resmungou. Ele parece bravo com o papai. Ele está sempre bravo com o papai.

— Apenas tire a garota daqui. Ted, o escroto da casa ao lado, ligou para o resgate porque a viu lá fora durante a madrugada. Ela ainda estava lá quando chegaram — papai disse.

— Eu estava esperando a mamãe, ela lia para mim todas as noites no jardim — eu conto, baixinho, só para o tio Vince. Eu o sinto suspirar e suas mãos começam a fazer carinho em minhas costas.

— Tudo bem, meu amor — ele me respondeu, em meu ouvido — Você, ao menos, a alimentou, seu idiota? — tio Vincent está falando com o papai de novo. Eu sei disso porque sua voz muda. Ele parece Dolphin, meu cachorrinho. Zangado demais.

Eu fecho meus olhos, tentando me concentrar no cheiro de seu perfume. Meu tio cheirava como as árvores do nosso jardim. Eu adorava o seu cheiro.

— Não, estive ocupado limpando a bagunça que sua irmã deixou — meu pai respondeu. Sua voz me fez me encolher. Estava chata, como nos dias em que ele brigava com a mamãe antes de ir embora — Não vou ficar com a garota, se vire com isso.

O corpo de meu tio estremeceu: "Isso" é sua filha, seu filho da mãe — eu acho que eles vão brigar. Eu não quero que eles briguem. Eu odeio brigas. Eu tenho medo de brigas.

Me alinhando em seu peito, eu conto meu segredo: Titio, estou com fome — ele respirou fundo, levando seu corpo para trás para olhar em meu rosto. Eu o mirei de volta.

— Você quer comer, Lucky? — esse era meu apelido. Ele me chamava assim porque eu gostava do time verde no basquete. Lucky era o nome de seu mascote, ele me disse.

Eu faço que sim com a cabeça e ele volta a falar: Está bem, vamos comer alguma coisa — me assegurou e eu concordei — Depois que ela dormir, volto para resolver as coisas de Jane. Quero você fora daqui o mais rápido possível — de novo, ele falava com o papai, mas eu não queria prestar atenção, então voltei a me esconder em seu corpo. Eu realmente gostava de como ele cheirava.

Ele começou a caminhar comigo, acho que estávamos indo para nossa cozinha. Mamãe não me deixava entrar muito ali, ela dizia que era lugar de adultos e que eu poderia me machucar, mas tio Vince me sentou sobre a ilha e me buscou uma tigela, porque lhe pedi cereal com leite quando ele me perguntou o que eu queria.

— Por que vocês liam no jardim? — ele me perguntou, depois de um tempo. Eu não sei quanto eu demorei para responder, porque estava mesmo concentrada em mastigar meus cereais. Tio Vincent estava com as costas apoiadas no balcão da ilha, ao meu lado.

— Mamãe gosta do cheiro das folhas e eu gosto do cheiro das árvores — respondo, levando a colher até minha boca mais uma vez.

Ele balançou a cabeça, concordando — Sobre o que vocês liam?

— Depende, esse mês ela estava lendo O leão, a feiticeira e o Guarda-roupas – digo, engolindo um pouco de leite — Eu não gostei desse, eu acho — confesso, baixinho.

Titio riu, abafado. Sua risada também estava triste. Por que você está triste, tio Vince?

— Sua mãe adorava "As crônicas de Nárnia". Eu sempre odiei, mas ela insistia que aqueles livros eram interruptores que nos desligavam do mundo real.

Eu faço uma careta — Eu estou odiando — jogo meus ombros, — Edmund é um pé no saco — completo. Logo depois, me arrependo. Mamãe realmente gostava deles, então eu deveria falar com mais cuidado — Mas não conte para ela, não quero ela chateada comigo como o papai.

Meu tio fica em silêncio e eu aproveito para terminar minha refeição. Com cuidado, eu tomo todo o leite da tigela e, quando estou satisfeita, a deixo de lado. Tudo está quieto demais, a não ser pelo burburinho pela casa inteira. Ainda não sei por que estamos recebendo tantas pessoas.

— Por que estamos recebendo tantas pessoas? — eu pergunto, virando meu rosto para olhá-lo — Mamãe está dormindo na sala, ela não vai gostar de ver tanta gente quando acordar.

Ele não me respondeu, mas eu vi seu rosto ficar tenso, olhava para frente, para algum lugar depois da cozinha. Será que é por que eu não chamei a mamãe para o quarto?

— Eu não sabia que ela estava na sala, tio, quando passei para o jardim, ela não estava, eu juro — comento, querendo que ele acredite em mim — Eu procurei, mas não a encontrei em lugar nenhum. Seu quarto estava trancado e depois de muito tempo, uma tia vestida com um macacão legal ficou comigo até o papai chegar.

Meu tio Vincent não consegue olhar para mim. Papai também não consegue olhar para mim — Titio? — eu o chamo, quase sem voz. Eu sinto as primeiras lágrimas lotarem meus olhos. Eu quero chorar. Por favor, titio, não me odeie — Você está bravo comigo? Desculpa, titio — eu peço, baixinho.

— Lucky, o que eu vou falar agora vai mudar a sua vida — ele falou, depois de um tempo. Ele estava sério e isso me assustava um pouco. Tio Vince nunca estava tão sério. Ele era muito legal para isso —, e talvez você leve um tempo para entender, tudo bem?

Minha cabeça fazia que sim e eu tentava dar toda a minha atenção para ele. Eu nem piscava! Eu não queria que ele pensasse que eu não estava atenta ao que ele dizia. Mamãe diz que era muito feio não dar atenção para o que um adulto fala.

Ele estava olhando para mim, seus olhos não se moviam para nenhum lugar fora do meu rosto — A mamãe morreu, — ele falou e eu pisquei. Minha cabeça tentava conectar todas as suas palavras, eu tentava lembrar de quando li sobre morte na escola — ela não está mais aqui com a gente — explicou.

Minha garganta se fechou um pouco, parecia seca. De repente, eu estava com tanta sede — A mamãe morreu? — eu pergunto. Aos poucos, as palavras da minha professora, senhorita O'Malley, se repetem na minha cabeça: "Interrupção definitiva da vida". Espera, eu congelo — Isso significa que ela não vai voltar? — meus olhos estão cheios de água outra vez.

— Sim, querida — tio Vince confirmou, triste — Ela não vai voltar. A partir de agora, seremos eu e você — ele me abraçou pelos ombros, levando meu corpo até seu colo, onde eu adorava me esconder. Eu queria perguntar tanta coisa, mas eu não consigo falar. Por que eu não estou conseguindo respirar, tio Vince? Eu acho que meu peito está esmagado.

Lights of HomeOnde histórias criam vida. Descubra agora